"Bafômetros" detectam uso de maconha e cocaína no Uruguai
No entanto, motorista que for pego com indícios de cocaína – droga não liberada no País – não será necessariamente preso; para maconha, a multa é R$ 1.150 e suspensão da habilitação
A partir do começo da implantação da lei que autoriza o cultivo de cannabis no Uruguai, as blitzes de trânsito estão iniciando a checagem do consumo de maconha e cocaína – além do álcool, tradicionalmente controlado – em motoristas do país. Mas, curiosamente, até dezembro, motoristas que forem pegos com indícios de cocaína – droga cuja posse e venda não está liberada no Uruguai – não serão necessariamente presos. Isso porque os meios de detecção ainda estão sendo aperfeiçoados e, na visão do Estado, não existem as devidas garantias para que um exame de cocaína positivo seja, de fato, positivo.
“Sempre depende do policial. Ele pode, sim, penalizar o motorista. Se a pessoa vinha dirigindo de forma temerária, e o exame de cocaína der positivo, há outras figuras legais que permitem a sanção. Será analisado se a pessoa possui antecedentes, se há cocaína no carro, e o caso passa a ser analisado por um juiz, coisa que não acontece com o álcool e a maconha. Mas, em qualquer dos casos – seja álcool, maconha, ou cocaína –, o motorista é impedido de continuar dirigindo, e o carro deve ser retirado por outra pessoa, ou será guinchado. Não é que não aconteça nada”, explica ao Terra Gerardo Barrios, presidente da Unidade Nacional de Segurança Vial (Unasev), órgão responsável pela regularização e pelo controle de leis e condutas de trânsito.
Da mesma forma que acontece com quem não passa no teste do bafômetro (o limite máximo de ingestão de álcool permitido no Uruguai é de 1,2 grama por litro), o motorista que apresentar consumo de maconha ou cocaína será multado em 11.436 pesos uruguaios (cerca de R$ 1.150) e terá a carteira de habilitação suspensa por seis meses. No caso de reincidência, a mesma multa voltará a ser aplicada, e a carteira será suspensa por até dois anos. Em uma nova reincidência, a multa será cobrada mais uma vez, e o motorista poderá perder definitivamente a carteira de habilitação.
“Os efeitos da maconha são semelhantes aos do álcool quanto aos problemas gerados quando você está no volante. A diferença é que o álcool tem efeito progressivo, ou seja, você pode chegar ao coma alcoólico, ao passo que isso não acontece com a maconha. Mas de todos os modos as consequências nocivas para o trânsito são iguais, e é isso o que tentamos evitar”, diz Barrios.
Como um teste de gravidez
O controle do uso de maconha é feito com um dispositivo de 10 cm, que sinaliza - por meio do contato da saliva do motorista com um reagente químico - se há indícios do princípio ativo da cannabis, THC (tetrahidrocanabinol), em um espectro de detecção que alcança até seis horas depois do consumo. O período é considerado o limite máximo, pós-consumo, em que a utilização de cannabis implica riscos para a condução de veículos. A verificação demora oito minutos, e o funcionamento do aparelho é semelhante ao de um teste de gravidez, por exemplo. “Quando há um indício positivo, o dispositivo mostra uma listra”, explica o presidente da Unasev.
Durante o primeiro controle de rotina da droga em Montevidéu, no fim de semana de 18 e 19 de outubro, em 700 abordagens foram detectados 51 casos de álcool no sangue e 10 medições de cannabis deram positivo. Os dados são do Departamento de Trânsito da capital uruguaia.
Apesar de os equipamentos contarem com grande credibilidade na Alemanha, onde foram adquiridos, o Estado vem realizando certificações nos medidores, um processo que já foi concluído para a detecção de maconha, mas que ainda não foi terminado para a indicação do consumo de cocaína. Aí está a razão, segundo explica Barrios, para não haver sanções diferentes, por enquanto, para os motoristas que aparecerem com a droga no teste.
“Os equipamentos são certificados pela Faculdade de Química da Universidade da República. Já fizemos a certificação para a detecção de maconha. Agora estamos fazendo processos de certificação para a constatação da presença de cocaína. Apesar de serem equipamentos respeitados na Europa, o que quisemos fazer foi dar uma certificação nacional adicional. Preferimos ir avançando aos poucos, e com todas as garantias”, afirma.
A implementação dos controles de maconha no trânsito é uma atividade coordenada em conjunto pela Unasev, a Presidência da República e a Junta Nacional de Drogas (órgão vinculado ao Executivo e que vem centralizando as atividades relacionadas à implantação da chamada Lei da Maconha, que estatiza todo o processo de produção da droga). O processo prático de produção e distribuição da maconha está a cargo do Ircca (Instituto de Regulação e Controle da Cannabis), que já começou o registro de autocultivadores e de clubes de membros para obtenção da droga.
Os equipamentos em uso atualmente no Uruguai permitem apenas a detecção de maconha e cocaína na saliva do motorista, mas aparelhos mais avançados mostram a existência de até seis substâncias, entre psicofármacos, metanfetaminas e opiáceos. Cada aparelho custou entre 12 e 15 euros, e o país conta atualmente com 3.000 unidades. A meta é chegar a um mínimo de 15 mil detectores até o próximo ano.
“A partir de 2015, devemos incorporar equipamentos que medem até seis substâncias. O objetivo principal é evitar acidentes, que pessoas sob o efeito dessas substâncias não estejam dirigindo”, diz Barrios. “No Uruguai, acontecem em média 28 mil acidentes de trânsito por ano, ou seja que seriam necessárias fazer pelo menos 28 mil detecções”, raciocina. O que ocorre é que, a cada acidente de trânsito, o novo protocolo estabelece a obrigatoriedade de realizar testes de consumo de álcool e de maconha. O novo teste também é usado quando há um positivo no bafômetro. Nesse caso, a checagem da presença de maconha e cocaína é um teste complementar a uma detecção já presente de álcool.
Drogas: da legalização à pena de morte
Também em datas com grande circulação de carros, como durante a temporada de verão, nas festas de fim de ano ou na chamada Noite da Nostalgia (24 de agosto), quando é tradição no Uruguai que as pessoas saiam para dançar ou jantar, serão realizadas blitzes especiais, com controles aleatórios.
Quando é detectado o consumo de álcool por parte de motoristas, parte da pena, além do pagamento da multa, é realizar tarefas comunitárias, obrigatoriedade que, por enquanto, não se aplica nem ao consumo de maconha nem ao de cocaína, pelo fato de as duas drogas ainda não terem sido inseridas na chamada “Lei de Faltas”, que estabelece reparações a infrações por meio desse tipo de atividade. É importante lembrar que o consumo de cocaína não é crime no Uruguai. O que não é permitido é sua venda e posse.
Ainda não há estudos que mostrem a prevalência do uso de maconha no trânsito uruguaio. A estimativa é que as primeiras investigações sobre o tema possam estar concluídas em meados do ano que vem. De acordo com Barrios, os índices europeus mostram um consumo de cannabis entre 4% e 15% dos motoristas daquele continente.