As quatro poderosas armas que a China tem para atacar os EUA na guerra comercial
Disputa entre as duas maiores economias do mundo tem sido, até agora, restrita às tarifas de importação, mas gigante asiático tem em seu arsenal econômico outras possibilidades de atingir os Estados Unidos. Quais táticas poderão ser usadas?
Até agora, a guerra comercial entre os Estados Unidos e a China foi restrita à disputa em tarifas entre as duas maiores economias do mundo. Há, no entanto, outras armas que podem prejudicar seriamente o inimigo.
Representantes de Washington e Pequim têm ameaçado continuar impondo encargos sobre seus produtos, em meio a uma escalada que não dá sinais de afrouxamento.
Os confrontos ocorrem em meio à incerteza sobre a negociação nuclear dos EUA com a Coreia do Norte e, nesse contexto, Donald Trump tem atribuído grande parte do impasse à China, principal aliada do regime norte-coreano.
Mas seriam as tarifas apenas a ponta do iceberg? Além delas, há outras "armas" que o presidente chinês Xi Jinping tem para enfrentar Trump?
Aqui, mostramos quatro delas:
1. Tornar a vida mais difícil para as empresas dos EUA
Se o objetivo é complicar a vida de uma empresa, é possível fazê-lo de várias maneiras. Algumas opções são dificultar procedimentos na alfândega, complicar a regulamentação ou aumentar os custos. Alguns pesquisadores alertam para a possibilidade de a China adotar uma dessas táticas, mas, até agora, não há registros de que algo esteja ocorrendo em grande escala.
"A China tem histórico com esse tipo de comportamento e é claramente uma preocupação para os negócios americanos", disse à BBC News Mundo Mary Lovely, professora de economia da Universidade de Syracuse, de Nova York, e pesquisadora do Instituto Peterson de Economia Internacional, dos EUA, especializado em estudos e discussões de política econômica internacional.
"Embora tenha havido relatos sobre esse tipo de barreira contra duas empresas americanas, não há razão para acreditar que isso esteja acontecendo em uma escala maior, ao menos não por enquanto", diz Lovely, que afirma que estratégias não tarifárias têm um grande custo para ambas as partes.
Esses tipos de medidas, segundo ela, "reduzem a probabilidade de os exportadores fazerem os investimentos necessários para os mercados dos EUA e da China", diz.
"Elas reduzem a concorrência, aumentam os preços e diminuem as opções dos consumidores".
Tais medidas, porém, não são as únicas nem as mais prováveis.
"A China está mais focada em tentar isolar os Estados Unidos do que em alterar o tipo de troca ou irritar os investidores estrangeiros", acrescentou ela.
2. Deixar os Estados Unidos de fora das alianças
Outra possibilidade é que a China poderia tentar ganhar tempo. Como Xi Jinping tem planos de permanecer no poder, ele não tem a pressão de outros líderes para conseguir resultados imediatos.
Assim, o país pode ir lentamente construindo alianças comerciais com outros parceiros, tentando isolar os EUA.
Isso explicaria, em parte, dizem os analistas, a aproximação de Pequim com a Europa, com outros países asiáticos e com a América Latina.
O país poderia, inclusive, aderir ao Acordo de Cooperação Econômica Transpacífico, do qual Washington se retirou, entre outras opções de associação comercial.
E, desde que Trump entrou em disputas comerciais com a União Europeia, Canadá e México, Pequim olha com interesse a possibilidade de abertura de novos acordos.
3. Desvalorizar o yuan
Se a China decidisse lançar um ataque frontal, poderia desvalorizar sua moeda, o yuan. Essa, no entanto, é uma decisão muito difícil de tomar.
Alguns analistas acreditam que uma guerra cambial tem efeitos mais rápidos e efetivos, embora outros alertem para o fato de que ela pode se tornar uma faca de dois gumes.
"A China pode injetar dinheiro em sua economia para apoiar suas empresas ou pode desvalorizar sua moeda", disse à BBC News Mundo Bryan Borzykowski, escritor especializado em investimentos, finanças pessoais e negócios.
"Acredito que as armas comerciais chinesas podem causar mais danos", acrescenta. "A questão é se eles realmente vão fazer isso".
Se o yuan cai, as tarifas têm um impacto menor. Nesse caso, os EUA teriam que aumentar o nível das taxas que impôs aos produtos chineses. E assim a disputa continua aumentando.
4. Deixar de comprar títulos do Tesouro
Embora os títulos do Tesouro sejam um investimento seguro, se o governo chinês se encontrar sob muita pressão poderá vender parte de seus títulos ou parar de comprar novos.
Isso teria um forte impacto na economia dos EUA, mas também teria efeitos em Pequim.
Isso porque se a China inundasse o mercado com esses títulos, o preço cairia. E, é claro, isso faria com que os próprios títulos que possui perdessem valor e não existe uma alternativa tão segura de investimento em outro lugar, dizem analistas.
Com todos os problemas que uma medida desse tipo teria, essa arma é uma das mais danosas.
"Isso levaria receitas públicas em um momento em que o governo tem um grande déficit", diz Kristina Hooper, estrategista de mercados globais da empresa norte-americana Invesco.
A China é "muito mais vulnerável"
Apesar das possibilidades, alguns especialistas não consideram muito provável que a China use outras armas para a guerra comercial além das tarifas.
"A China é muito mais vulnerável em uma guerra comercial do que os Estados Unidos. A economia americana é muito maior e está anos-luz em eficiência", disse à BBC News Mundo Scott Kennedy, diretor do Projeto sobre Negócios na China e Economia Política do Centro para Estudos Estratégicos e Internacionais em Washington.
"A China não pode criar uma crise financeira vendendo os títulos do Tesouro americano. Se Pequim fizesse algo assim, os Estados Unidos responderiam imediatamente com tarifas maiores para compensar", analisa Kennedy.
Por outro lado, Pequim poderia efetivamente tornar a vida das empresas americanas mais difícil, mas seriam "casos isolados", complementa ele. Opiniões divergentes se somam a um debate internacional, que acompanha de perto os efeitos globais do confronto, cujas consequências vão muito além de suas fronteiras e que põe em risco o equilíbrio dos mercados em âmbito global.
A partir de outra perspectiva, o vencedor do Nobel de Economia, Joseph Stiglitz, tem dito que a China se encontra em "uma melhor posição para resistir à tempestade".
"(A China) tem ferramentas e recursos para ajudar aos que são prejudicados pelas consequências de uma guerra comercial", diz ele.
"A China está sentada sobre US$ 3 trilhões (o equivalente a R$ 11,25 trilhões) de reservas para ajudar a esses afetados".