A fotógrafa e ativista bengalesa Taslima Akhter percorria os escombros do prédio em situação irregular que desabou em Savar, nos subúrbios de Daca, capital de Bangladesh, no dia 24 de abril, quando se deparou com o casal da foto acima. Desde então, essa foto a assombra. Não exatamente pelo que a imagem mostra à primeira vista, mas pelo que só é possível sentir quando se sabe o contexto que envolve a tragédia ocorrida em uma fábrica de roupas e cujo número de mortos já se aproxima de mil.
Em um texto publicado dia 8 no site da revista americana Time, Akhter afirmou que o que a aterroriza nessa imagem é, na verdade, sua capacidade de dizer o que muitas vezes é ignorado em acontecimentos dessa natureza em Bangladesh: o fato de que os operários que trabalham sob as péssimas condições oferecidas pela indústria têxtil do país não são apenas números. São seres humanos cujas vidas valem tanto quanto as de qualquer outra pessoa.
Não por acaso a Time classificou a foto tirada por Akhter como a "mais perturbadora" da tragédia em Bangladesh, a mais representativa de uma cobertura fotográfica marcada por imagens fortes, como é possível observar na galeria dispónível ao final desse texto.
O Terra entrou em contato com Akhter, que cedeu a imagem do "Abraço Final". Abaixo, a tradução do texto publicado na Time.
Eu venho fazendo muitas peguntas a respeito do casal que morreu abraçado após o colapso. Eu tentei desesperadamente, mas ainda não achei nenhuma pista a respeito deles. Eu não sei quem são ou qual a relação eles tinham.
Eu passei o dia inteiro do desabamento no local, assistindo aos trabalhadores serem retirados das ruínas. Eu lembro do olhar aterrorizado dos familiares - eu estava exausta mental e fisicamente. Por volta das 2h, encontrei um casal abraçado nos escombros. A parte inferior dos seus corpos estava enterrada sob o concreto. O sangue que saía dos olhos do homem corria como se fosse uma lágrima. Quando os vi, não pude acreditar. Era como se eu os conhecesse - eles pareciam ser muito próximos a mim. Eu vi quem eles foram em seus últimos momentos, quando, juntos, tentaram salvar um ao outro – salvar suas vidas amadas.
Cada vez que eu olho para essa foto, me sinto desconfortável - ela me assombra. É como se eles estivessem me dizendo, nós não somos um número - não somos apenas trabalho barato e vidas baratas. Nós somos humanos como você. Nossa vida é preciosa como a sua, e nossos sonhos são preciosos também.
Eles são testemunhas nessa história cruel. O número de mortos agora passa de 750 (nesta quinta-feira, já chega a quase 1000). Que situação desagradável nós estamos, onde humanos são tratados apenas como números.
Essa foto me assombra todo o tempo. Se as pessoas responsáveis não receberem a punição merecida, nós veremos esse tipo de tragédia de novo. Não haverá consolo para esses sentimentos horríveis. Cercada de corpos, eu senti uma imensa pressão e dor nas duas últimas semanas. Como testemunha dessa crueldade, tenho necessidade de compartilhar essa dor com todos. Por isso eu quero que essa foto seja vista.
Multidão acompanha operação de resgate em 25 de abril, uma dia após o desabamento. O prédio Rana Plaza desabou em Savar, no subúrbio da capital Daca, no dia 24 de abril. Milhares de pessoas que trabalhavam em empresas têxteis no momento da tragédia foram soterradas. Cerca de mil já foram declaradas mortas, mas o número de corpos retirados dos escombros cresce diariamente
Foto: AP
Crianças cobrem os narizes próximo a corpos em decomposição de pessoas não identificadas colocados em caminhão para serem levados para vala comum, no dia 1º de maio
Foto: AP
Mulher cobre o rosto ao exibir foto da irmã que prosseguia desaparecida no dia 3 de maio
Foto: AP
Parentes reagem após o corpo de um ente ser identificado no dia 3 de maio
Foto: AFP
Mulher chora em cemitério ao exibir a foto de filho desaparecido, no dia 3 de maio
Foto: AP
Equipe de resgate carrega trabalhador resgatado com vida dos destroços em 26 de abril, dois dias após o desabamento
Foto: Reuters
Bombeiro carrega mulher ferida no desabamento após ela ser retirada dos destroços no dia 24 de abril
Foto: AFP
Mulher dorme no chão ao lado de retrato de parente desaparecida enquanto aguarda por notícias no dia 4 de maio
Foto: AFP
Trabalhadora é retirada do prédio após ser resgatada dos destroços no dia 24 de abril
Foto: Reuters
Socorrista descansa em meio aos destroços durante intervalo nas buscas no dia 25 de abril
Foto: AP
Mulher chora por seu marido desaparecido nas proximidades do prédio desabado, em 27 de abril
Foto: AP
Soldados são fotografados em meio aos destroços enquanto buscas por sobreviventes prosseguem ao cair da noite do dia 26 de abril
Foto: AP
Socorrista usa furadeira para perfurar concreto e metal para abrir caminho para operação de resgate dentro do prédio, em 26 de abril
Foto: AP
Trabalhadora é retirada com vida dos escombros no dia 26 de abril
Foto: AP
Soldados participam da operação de resgate em meio aos escombros do Rana Plaza em 26 de abril
Foto: AP
Homem joga terra sobre túmulo de pessoa não identificada que morreu no desabamento, em 1º de maio
Foto: AP
Mulher chora ao lado de caixão de parente morto na tragédia, em 28 de abril
Foto: AP
Trabalhadores enterram corpos de pessoas não identificadas durante funeral no dia 1º de maio
Foto: AP
Mulheres cobrem os narizes ao procurarem por parente em meio a corpos enfileirados em escola transformada em necrotério, em 2 de maio
Foto: AP
Socorristas usam pedaço de tecido para retirar mulher do prédio durante operação de resgate no dia 24 de abril
Foto: AP
Socorristas ajudam colega ferido em incêndio durante operação de resgate em meio aos destroços do prédio no dia 28 de abril
Foto: Reuters
Homem deita no chão de escola enquanto aguarda por notícias sobre parente que trabalhava em fábrica no prédio desabado, no dia 5 de maio
Foto: Reuters
Sob os olhares de uma multidão, dezenas de trabalhadores participam de operação de resgate sob os escombros do prédio Rana Plaza horas após o desabamento, no dia 24 de abril
Foto: Reuters
Socorristas buscam por sobreviventes em meio aos destroços do prédio em 28 de abril
Foto: Reuters
Parentes exibem fotos de trabalhadores que desapareceram no desabamento do prédio e ainda não tinham sido encontrados no dia 28 de abril
Foto: Reuters
Do alto de prédio vizinho, homens acompanham operações de resgate no Rana Plaza no dia 25 de abril
Foto: Reuters
Mulher é puxada para fora dos escombros ao ser resgatada no dia 25 de abril
Foto: Reuters
Homem mostra foto de mulher desaparecida para socorristas em meio aos destroços do prédio, em 27 de abril
Foto: Reuters
Soldados e socorristas carregam trabalhadora retirada com vida dos escombros do Rana Plaza três dias após a tragédia, em 27 de abril
Foto: Reuters
Socorristas rezam em meio aos destroços do Rana Plaza em 27 de abril