Histeria da Coreia do Norte ajuda a promover filme polêmico
No longa "A Entrevista", grupo realiza uma operação da CIA para assassinar Kim Jong-un. Filme estreia nos cinemas do Brasil no dia 29 de janeiro
A pergunta inicial parece lógica: será que Kim Jong-un não tem humor? A opinião geral é de que o líder norte-coreano não se destaca pela espontaneidade, mas depois de assistir o filme "A Entrevista" fica difícil entender tantas queixas.
Os atores americanos Seth Rogen e James Franco protagonizam o filme, que conta a história de uma operação fictícia da CIA para assassinar Kim, repleta de piadas escatológicas e sexuais.
Em poucas palavras, o filme é uma mistura entre um James Bond de araque e um longa-metragem ao estilo "Se Beber Não Case", dirigido principalmente ao público masculino que vai ao cinema em busca de diversão.
Mas o regime da Coreia do Norte prometeu "represálias cruéis" para um filme que considera um "ato de terror sem sentido", apesar de ter negado estar por trás dos ataques cibernéticos que afetaram a Sony Pictures, estúdio que financiou o longa-metragem.
O que Pyongyang parece não entender é que a irritação do regime praticamente vai garantir o primeiro lugar na bilheteria para "A Entrevista", que estreia nos cinemas dos Estados Unidos em 25 de dezembro (e 29 de janeiro no Brasil).
"Sem dúvida, a Sony não fica incomodada que um paíse denuncie publicamente o filme", afirma à AFP Jeff Bock, da empresa especializada em bilheteria Exhibitor Relations.
"Os boatos e as especulações aumentarão definitivamente o interesse do público. As pessoas querem entender o alvoroço", completa.
O filme conta a história do apresentador de um programa de TV, Dave Skylark (Franco), e seu produtor (Rogen), que têm a possibilidade de entrevistar o ditador do país mais fechado do mundo, que no filme é um grande fã do programa sensacionalista do jornalista.
Mas a CIA, por meio de uma agente sexy, Lacy (interpretada por Lizzy Caplan), convence a dupla a assassinar Kim Kong-un com uma dose de ricina, aproveitando o acesso ao líder norte-coreano.
Tudo vai bem até que a dupla chega a Pyongyang e Skylark sai para uma noite de farra com Kim, durante a qual conversam sobre basquete e fazem piadas sobre gays e as canções de Katy Perry.
O personagem de Franco decide que não pode matar o novo amigo, o que provocará muitas dores de cabeça e terminará com Kim irritado.
A reação da Coreia do Norte antes da estreia lembra o que aconteceu com o governo do Cazaquistão em 2006 e o filme "Borat", no qual o humorista Sacha Baron Cohen faz piadas com o suposto atraso desta república da Ásia central.
Ao criticar o filme, as autoridades do Cazaquistão ajudaram o filme na bilheteria. Depois, perceberam o "erro" e "aceitaram" o resultado.
Mas nada leva a crer que a Coreia do Norte vai lidar de maneira leve com as críticas do filme.
O regime comunista se mostra implacável quando alguém ousa fazer piadas com qualquer integrante da dinastia Kim.
Em abril, dois funcionários da embaixada norte-coreana em Londres reclamaram com o dono de uma barbearia que usou um pôster de Kim Jong-un e a pergunta "Dia ruim com o cabelo?".
Em julho, Pyongyang pediu a Pequim a retirada de um vídeo, que se tornou viral, que satirizava o líder norte-coreano.
"A Coreia do Norte não se caracteriza por ter o melhor senso del humor do mundo. Assim, nunca aceitará este filme", afirma Peter Beck, especializado em Pyongyang que trabalha para o Instituto Novo Paradigma de Seul.
"A Entrevista" também aborda a estranha, mas verídica, amizade de Kim Jong-un com o ex-jogador da NBA Dennis Rodman, que visitou Pyongyang algumas vezes.
O longa-metragem conta ainda com participações de outras estrelas, como o rapper Eminem, que afirma no filme ser homossexual, o ator Rob Lowe usando uma peruca, além de Nicki Minaj, Joseph Gordon-Levitt, Seth Meyers e Bill Maher.
O grupo 'Guardians of Peace' (Guardiões da Paz), ou GOP, que afirma ter hackeado o sistema da Sony Pictures pediu na semana passada que o filme não estreie.
Mas a Sony, que adiou a estreia de outubro para dezembro, não parece ter planos neste sentido.
O presidente da Sony, Michael Lynton, realizou na segunda-feira uma reunião com seus funcionários da sede da Califórnia para abordar as consequências do ciberataque sofrido nas últimas semanas, que tornou públicos e-mails comprometedores entre os diretores da empresa.
A Sony foi vítima de um ataque a seus servidores no dia 24 de novembro, realizado pelo GOP, que gradualmente foi vazando mensagens dos diretores dos estúdios e outros dados confidenciais.
Os funcionários receberam no final de semana um e-mail do GOP anunciando que ganhariam "um presente de Natal", com a publicação de "um grande número de informações".
"Este presente os fará muito felizes e colocará a Sony em uma má situação", diz a mensagem.
A presidente da companhia, Amy Pascal, foi uma das mais prejudicadas pelo vazamento dos e-mails, tendo que pedir desculpas, na semana passada, ao presidente americano, Barack Obama.
Em uma troca de mensagens com o produtor Scott Rudin, Pascal escreve se deve perguntar a Obama sobre os filmes "Django Livre", "12 anos de escravidão" e "O mordomo da Casa Branca", todos eles sobre a questão racial nos Estados Unidos.
Rudin também fez ataques à atriz Angelina Jolie por sua possível participação na produção de "Cleópatra", chamando-a de uma "menina mal educada com talento mínimo", "infantil, irresponsável e caprichosa".
A imprensa americana informou que os hackers conseguiram roubar o roteiro do próximo filme de James Bond, protagonizado por Daniel Craig e dirigido por Sam Mendes, cuja filmagem terá início em breve.
De acordo com diversas fontes, todos os ataques estariam relacionados à estreia de "A Entrevista".