Massacre na China: 25 anos depois, tema ainda é censurado
Apesar de crescimento econômico, liberdade de expressão continua restrita no país; ações lembrando protesto contra Partido Comunista em 89 são coibidas
No 4 de junho de 1989, o governo chinês colocou fim aos dois meses de ocupação estudantil da praça central da capital, Pequim, graças a uma violenta intervenção militar, que provocou a morte de mais de 2 mil pessoas e deixou outros milhares de feridos, segundo dados da Cruz Vermelha chinesa.
Tida como um dos mais importantes episódios da história recente da China, a contestação contra o regime do Partido Comunista Chinês (PCC) continua banida dos livros escolares e é tema censurado no país.
Nesta quarta-feira, são esperadas manifestações em Hong Kong, Macau, Taiwan e comunidades chinesas ao redor do mundo, enquanto na China as autoridades intensificaram a campanha de "manutenção da estabilidade", para evitar ações em memória do massacre da Praça de Tiananmen, mais conhecida no Brasil como Praça da Paz Celestial.
A China vê o protesto em 89 como uma ação "contrarrevolucionária" e até hoje não divulgou um número oficial de mortos provocados pela repressão.
Em entrevista coletiva na terça-feira na capital chinesa, o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores Hong Lei, afirmou que, nas últimas três décadas de reforma e abertura, grandes realizações da China no desenvolvimento econômico e social têm recebido atenção mundial. "A construção da democracia e do Estado de direito continuam sendo aperfeiçoados".
Avanço econômico
Defensor da abertura econômica intensificada pelo atual governo do presidente Xi Jinping, Charles Kwong, professor de economia chinesa da Open University of Hong Kong, afirma que a China viveu nestes últimos anos um crescimento espetacular.
Para o economista, as duas principais mudanças na estratégia do país no plano econômico são: a passagem de uma economia central planificada para uma economia de mercado; e a consolidação da China como um ator central da globalização em termos de comércio, investimento e participação em organizações internacionais.
"Uma das principais contribuições da reforma na China é ter provocado uma grande redução na miséria. De acordo com as estatísticas chinesas, atualmente há no máximo 25 milhões de pessoas abaixo da linha de pobreza, em um país de 1,3 bilhões de habitantes. A China aumentou seu PIB, a renda familiar e o consumo", aponta.
Mas apesar da relativa melhoria nas condição de vida da população apontada pelo especialista, muitos problemas ainda persistem, como a poluição e a desigualdade social. Alex Chow, secretário da Federação de Estudantes de Hong Kong (HKFS na sigla em inglês), diz que a prosperidade econômica não foi suficiente para garantir a liberdade no país.
"Nada mudou nesses últimos anos, na verdade. O que nós enfrentamos agora é corrupção e pobreza, o mesmo que os estudantes de 89 enfrentaram", alega.
Para o representante desta instituição fundada em 1958 e que reúne atualmente cerca de 80 mil jovens, a reforma constitucional é a mais urgente. "Essa era uma das questões centrais reivindicadas há 25 anos atrás e ainda é necessária para consolidar um sistema democrático", se exalta.
Censura
Em entrevista à BBC Brasil, a diretora da Anistia Internacional Hong Kong, Mabel Au, também não vê muitos avanços por parte do PCC na proteção da liberdade de expressão. "A censura continua, o governo aperta o controle em determinadas épocas do ano, principalmente nos dias que antecedem o 4 de junho. Nesse ano, a abrangência da ação foi maior", observou.
Na última semana, a Anistia Internacional divulgou uma lista com o nome de cerca de 50 ativistas presos ou perseguidos pelas autoridades chineses nas semanas que antecederam a data.
Organizações em defesa dos direitos humanos avaliam que pouco mudou do ponto de vista democrático nas últimas décadas no país. "O governo chinês continua não reconhecendo que o 4 de junho foi um erro e uma violação dos direitos humanos. A imprensa continua extremamente controlada pelas autoridades, mesmo a imprensa internacional na China não tem liberdade para trabalhar. Mas é claro que o mundo mudou muito nesse período e agora temos internet", avalia.
Para Au, a internet é a grande arma dos jovens chineses para contornar o sistema. "Muitos estão usando internet para terem seu próprio espaço e fazer circular ideias, nas redes sociais ou grandes plataformas online na China", revela a ativista.
A internet, no entanto, segue vigiada de perto por Pequim. Ativistas pro-democráticos denunciam ações, como a que colocou fora do ar há pelo menos uma semana o site da Hong Kong Alliance in Support of Patriotic Democratic Movements of China, principal ONG responsável pela organização dos eventos para lembrar os 25 anos do massacre de Tiananmen, em Hong Kong.