Um ano do terremoto no Nepal: os atos que salvaram vidas
Renomado fotógrafo colhe retratos e relatos de gestos que marcaram comunidades isoladas após tragédia que matou quase 9 mil pessoas
Um ano após o terremoto que matou quase 9.000 pessoas no Nepal, o renomado fotógrafo Gideon Mendel produziu uma série de retratos e relatos pessoais mostrando como pequenos 'atos de gentileza' ajudaram famílias que ficaram isoladas a sobreviver.
Laxmi Gurung tem 30 anos e é dona de um pequeno hotel em Baluwa, Gorkha. Ela usou os alimentos de seu empreendimento para cozinhar para os vizinhos. "Quando houve o terremoto, todas as casas foram destruídas. Graças a Deus escapamos da morte. Todo mundo estava com fome. Com todos sofrendo tanto, não pensei duas vezes antes de dar comida a eles. Eu distribuía tudo que eu cozinhava, em pequenas quantidades, para todo mundo."
Indra Kumari teve uma experiência parecida. Ela estava servindo um cliente na loja de sua família quando o tremor começou. "Depois do terremoto estava chovendo e as pessoas sentaram embaixo de uma lona”, diz.
“Éramos um grupo de mais ou menos 35 pessoas naquele dia. A situação era horrível. Minha família decidiu usar a comida da loja para alimentar todo mundo - macarrão, arroz, óleo, batatas, cebolas, ovos e grãos. Não houve escassez de comida. Por dia, alimentávamos cerca de 72 pessoas."
Já Chandra Ghale, empregado da construção civil de 32 anos de Baluwa, Gorkha, participou de uma pequena equipe de buscas formada logo após o terremoto. Ele ajudou a organizar a comunidade e distribuir donativos quando eles chegaram.
"Estava em casa com meus filhos quando houve um barulho de explosão e o chão começou a tremer. A casa não durou muito. Com uma ou duas sacudidas ela veio abaixo. Não conseguíamos enxergar direito por causa da poeira das casas destruídas."
A casa de Lokbahadur Magar, em Gorkha, também desabou. Doze pessoas morreram em seu vilarejo.
"Todo mundo estava apavorado. Estava chovendo e estávamos confusos. Só havia duas ou três lonas para abrigar cerca de 40 famílias e elas foram reservadas para mulheres, crianças e idosos. Depois disso a comunidade começou a se organizar”, afirma.
“Algumas pessoas começaram a limpar os corpos e prepará-los para o enterro; outros limparam os escombros em busca de alimentos. Eu ajudei a cuidar dos feridos. Todos cozinhávamos, comíamos e morávamos juntos. Foram cerca de três dias até a ajuda externa chegar."
O desafio da professora de escola primária Dhan Kumari Magar, de 44 anos, foi ajudar a resgatar Krishna Thapa, de 28, e seu bebê. "A maioria das casas do vilarejo desabou e muitas pessoas ficaram presas sob os escombros", disse Dhan.
"Ajudei a resgatar uma mulher e seu bebê de 6 meses em uma casa próxima. Eles estavam presos sob os escombros e a mulher estava inconsciente. Limpamos os destroços e os retiramos de forma segura, mas quando a mulher acordou ela estava com muita dor. Foi terrível vê-las embaixo da casa destruída."
Rakesh Lamicchane, de 17 anos, também ajudou em resgates. Ele era parte de um grupo de treinamento para emergências e reagiu rapidamente quando o segundo terremoto ocorreu, em 12 de maio. O grupo de Rakesh levou apenas 40 minutos para limpar os escombros e resgatou Ranjit Bishokarma, de 11 anos, que estava sob os destroços.
Manoj Rana, de 20 anos, estava em Katmandu na hora do terremoto. Ela voltou para casa, no pequeno vilarejo rural onde cresceu. "As barracas improvisadas estavam lotadas e bagunçadas. Parecia a Idade da Pedra. Muitos animais estavam mortos e o cheiro era terrível”, relata.
“Eu instruí os jovens a limpar as carcaças sujas pelos destroços e enterrá-los. Então ajudei a montar uma cozinha comunitária. Todo mundo estava com fome àquela altura. Nos primeiros dias, só tínhamos comida para uma refeição por dia. Ficamos muito felizes quando os donativos começaram a chegar."
O vilarejo de Sagar Tamang também foi completamente destruído. Ele era parte de um pequeno grupo que que ajudou a montar um acampamento temporário para sua comunidade, na periferia de Dhading.
"No início fizemos banheiros, importantes para higiene. Então pedimos água potável para as autoridades. Virei o líder do nosso grupo e pedimos ajuda a organizações por cartas. Pessoas do local nos deram lonas e roupas de cama. Um visitante nos deu sete barracas. Depois disso conseguimos dormir melhor."
Bal e Phul Sunar, por sua vez, foram ajudados por uma pessoa de outras “casta”, apesar de pertenceram àquela considerada a dos “intocáveis”.
"Somos dalits (uma casta baixa), então não ficamos com o resto da comunidade. Em vez disso, fizemos abrigos temporários em um campo próximo, usando materiais das casas destruídas”, relatam.
“Depois, recebemos telhados de zinco de um homem de uma casta mais alta. Ele deu quatro telhas para cada família dalit daqui. Ele sabe que somos muito pobres e não temos renda. Outro homem de casta alta da vizinhança nos deu arroz, olho e sal - isso foi uma grande ajuda à época."