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Ataque da Ucrânia à Rússia com mísseis dos EUA: como a decisão de Biden pode ampliar guerra

A Ucrânia será autorizada pelos Estados Unidos a disparar mísseis de fabricação americana contra o território russo — uma decisão que pode fazer a guerra ganhar uma escala muito maior do que os limites atuais.

19 nov 2024 - 11h07
(atualizado às 11h16)
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Mísseis americanos ATACMS poderão ser usados por ucranianos contra a Rússia
Mísseis americanos ATACMS poderão ser usados por ucranianos contra a Rússia
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

A Ucrânia foi autorizada pelos Estados Unidos a disparar mísseis de fabricação americana contra o território russo — uma decisão que pode fazer a guerra ganhar uma escala muito maior do que os limites atuais.

O presidente dos EUA, Joe Biden — que está nos meses finais de seu mandato, antes da posse de Donald Trump —, permitiu que o líder ucraniano, Volodymir Zelensky, use esses armamentos não só para defender seu próprio território, como vinha acontecendo até agora, mas para atacar a Rússia.

A Rússia reagiu dizendo que a decisão é uma provocação e que pode ser catastrófica — argumentando que isso equivaleria a uma participação direta dos EUA na guerra da Ucrânia.

E nesta terça-feira (19/11), a Rússia disse que a Ucrânia já disparou mísseis americanos de longo alcance contra o país.

O ataque com mísseis americanos ATACMS (Army Tactical Missile System, ou sistema de mísseis táticos do exército) foi realizado pela Ucrânia na região de Bryansk nesta manhã, segundo Moscou.

Cinco mísseis foram derrubados e um deles foi danificado, com seus fragmentos provocando um incêndio em uma instalação militar na região, segundo dados do governo russo. A nota afirma que o ataque provocou um incêndio, mas não houve fatalidades.

Há mais de um ano, a Ucrânia vem usando mísseis ATACMS em territórios ucranianos ocupados pela Rússia. Mas essa é a primeira vez que os mísseis são usados contra a Rússia.

Eles têm alcance de até 300km e são difíceis de serem interceptados.

Com isso, Kiev ganhou a capacidade de atingir a Rússia em grandes distâncias dentro de seu território. A Ucrânia está ocupando mais de mil quilômetros quadrados do território russo. Autoridades americanas e ucranianas aguardam agora um contra-ataque russo.

Na terça-feira, o presidente russo Vladimir Putin aprovou mudanças à doutrina nuclear russa, estabelecendo novas condições para que seu país considere usar seu arsenal.

Qualquer ataque de um país não-nuclear apoiado por uma potência nuclear será considerado um ataque conjunto pela Rússia.

A decisão de Biden

A decisão dos EUA de aprovarem o uso de seus mísseis de longo alcance contra a Rússia vinha sendo debatida há meses.

O presidente americano vinha sendo pressionado pela Ucrânia para permitir que mísseis ocidentais fossem usados para atacar a Rússia.

Esses mísseis já são usados na guerra — mas, só para atacar posições russas dentro da Ucrânia ou na zona de fronteira.

Os países ocidentais fornecedores desse tipo de armamento faziam essa restrição justamente para impedir que isso fosse visto como uma provocação direta ao presidente russo, Vladimir Putin.

Só que Zelensky argumenta que, para continuar a se defender, é preciso atingir bases russas de onde são lançados ataques aéreos contra a Ucrânia.

A imprensa americana noticiou que Biden resolveu acatar o pedido da Ucrânia e dar o aval para o uso de mísseis em alvos dentro da Rússia.

Isso seria uma resposta ao fato de que a Rússia está recebendo batalhões de soldados norte-coreanos para fazer uma contraofensiva em Kursk, território russo que a Ucrânia conseguiu invadir em agosto.

Ou seja: autorizar o uso desses mísseis seria uma forma de ajudar a Ucrânia a manter o controle desse pequeno território russo.

Como funcionam os mísseis?

Mísseis do tipo ATACMS estão entre as armas mais potentes que o Ocidente pode fornecer à Ucrânia — com a capacidade de atingir alvos difíceis, como bunkers e depósitos de munição, a cerca de 300 quilômetros de distância.

Os mísseis custam caro: cada um vale cerca de US$ 1 milhão (R$ 5,5 milhões). Por isso, cada lançamento é feito após muito planejamento. Também por causa do alto custo, eles não são fornecidos em grande quantidade.

O correspondente da BBC na Ucrânia, Paul Adams, diz que mísseis de longo alcance podem dar poder de reação a Kiev em um momento em que a Rússia amplia seus ataques.

"Nenhum desses mísseis, isoladamente, pode ser capaz de mudar os rumos do conflito", diz Adams.

"Embora eles não necessariamente vão mudar o curso da guerra de um jeito enfático, eu acho que oficiais ucranianos acreditam que seja um passo necessário para de alguma forma reequilibrar o poder militar, num momento em que eles sentem que estão sendo alvo de um avanço russo lento, intenso e permanente no Leste. Existe o sentimento de que a Ucrânia está muito na defensiva nos últimos meses."

E o aval dos Estados Unidos pode levar outros países, como Reino Unido e França, a também autorizar o uso de mísseis de longo alcance, os Storm Shadows, dentro da Rússia.

O Storm Shadow, de fabricação franco-britânica, tem capacidade parecida com a dos mísseis americanos.

Mas as consequências do uso desses mísseis podem ser grandes.

As possíveis respostas da Rússia

Mesmo antes de qualquer anúncio formal da Casa Branca, um porta-voz do Kremlin afirmou: "se essa decisão for de fato formulada e implementada pelo regime de Kiev, será uma nova rodada de tensões e uma nova situação do ponto de vista do envolvimento dos EUA no conflito".

O governo russo já havia dito em ocasiões anteriores que a permissão para que mísseis ocidentais fossem disparados no território russo colocaria Moscou em rota direta de confronto com a Otan, a aliança militar ocidental liderada pelos EUA.

O estatuto da Otan determina que a agressão contra um Estado-membro da aliança equivale a uma agressão contra todos os membros da aliança.

Ou seja, qualquer retaliação da Rússia contra um país da Otan seria uma escalada grande da guerra, envolvendo países que têm arsenal nuclear.

Um senador russo chegou a descrever a medida americana como "um passo sem precedentes em direção à Terceira Guerra Mundial".

Vladimir Putin ainda não se pronunciou sobre a decisão de Biden. Em setembro, ele havia dito: "Se essa decisão for tomada, significará nada menos que a participação direta de países da Otan - os EUA e a Europa - na guerra da Ucrânia".

"Isso seria a participação direta deles e, é claro, muda significativamente a essência, a natureza do conflito", afirmou Putin na ocasião.

Analistas não sabem dizer, no entanto, se a decisão de Biden será mantida depois que Donald Trump assumir o governo americano em janeiro.

Trump tem sido crítico da política de Biden na Ucrânia e disse que acabaria com a guerra em apenas um dia - dando indícios de que ele talvez não queira ampliar o arsenal militar da Ucrânia, mas sim pressionar o país a sentar na mesa de negociações e ceder parte do seu território pra Rússia.

Zelensky pede mais ajuda militar do ocidente contra a Rússia
Zelensky pede mais ajuda militar do ocidente contra a Rússia
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Até agora, Zelensky tem resistido a essa ideia.

"É claro que Vladimir Putin sabe que Donald Trump tem sido muito mais cético publicamente a oferecer assistência militar à Ucrânia", diz o editor da BBC em Moscou, Steve Rosenberg.

"Então a que ponto isso vai afetar o cálculo dele a respeito? É uma questão interessante. Um dos jornais russos, ultra-alinhado ao Kremlin, sugere que, quando assumir o poder, Donald Trump pode 'revisar' essa decisão de Joe Biden. Teremos de esperar para ver."

E no caso de uma retaliação russa?

Não é fácil prever os próximos passos de Vladimir Putin, mas ele deu alguns sinais recentemente, dizendo que aumentaria os sistemas de defesa da Rússia pra destruir os mísseis ocidentais.

E disse que forneceria armas russas para grupos e países adversários do Ocidente - potencialmente, ampliando as chances de alvos ocidentais pelo mundo serem atacados.

Um dos grupos que poderia, em tese, ter acesso a armas russas são os houthis - grupo iemenita que atacou navios mercantes de bandeiras ocidentais em retaliação à ofensiva de Israel na Faixa de Gaza.

É mais um sinal de como o conflito ganha contornos globais, para além das fronteiras de Rússia e Ucrânia.

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