Cinco perguntas sobre o veto migratório de Trump que foi liberado pela Justiça dos EUA
Segunda tentativa do presidente de vetar a entrada de refugiados e imigrantes de vários de países mulçumanos será analisada pela Suprema Corte: entenda quais podem ser os efeitos da medida e quem será afetado.
Depois de meses de idas e vindas jurídicas, a segunda tentativa do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de vetar a entrada de refugiados e imigrantes de diversos países de maioria muçulmana será avaliada pela Suprema Corte do país.
O mais alto tribunal do país afirmou que o veto de Trump poderá ser temporariamente implementado, até que uma decisão final seja tomada pela corte em outubro. Com isso, haverá 90 dias de restrições à entrada nos EUA de viajantes de seis países de maioria muçulmana (Irã, Síria, Iêmen, Somália, Sudão e Líbia) e a suspensão do programa de recebimento de refugiados por 120 dias. A medida foi comemorada por Trump e criticada por ativistas, que alegam discriminação religiosa.
A primeira ordem executiva, que gerou protestos em massa e confusões nos aeroportos, havia sido rejeitada pela Justiça em fevereiro.
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O mesmo aconteceu com a versão revisada, que horas antes de ser efetivada, no dia 16 de março, foi suspensa por um juiz do Havaí.
A proposta encontrou ainda outros obstáculos nos Estados de Maryland, Virgínia e Califórnia - mas agora a Suprema Corte dos EUA autorizou que parte do veto temporário seja posto em prática.
Mas que veto é esse - e o que acontece daqui para frente? A BBC Brasil responde algumas dúvidas sobre a nova medida.
1-Quem é afetado pelo veto migratório?
A ordem original barrava por 90 dias a entrada nos EUA de pessoas de sete nações de maioria muçulmana: Iraque, Irã, Síria, Iêmen, Somália, Sudão e Líbia. Além disso, também suspendia a entrada de refugiados por 120 dias e bania os refugiados sírios indefinidamente.
A ordem revisada removeu o Iraque da lista, depois de o país firmar um acordo para impulsionar a cooperação com os EUA, e também retirou a restrição permanente aos sírios.
O documento original não deixava claro o que aconteceria com cidadãos desses sete países que fossem residentes legais nos Estados Unidos, que já tivessem vistos americanos ou dupla nacionalidade. A nova versão deixa claro que cidadãos que já possuem o green card ou o visto e que sejam de uma das - agora seis - nações poderão entrar no país, assim como os cidadãos com dupla nacionalidade viajando com passaporte de um país que não esteja entre as restrições.
As permissões podem ser analisadas individualmente, caso a recusa da entrada cause algum tipo de dificuldade, por exemplo:
- Pessoas empregadas pelo governo americano
- Pessoas com necessidade urgente de cuidado médico
- Pessoas que já tinham permissão para estudar e trabalhar nos EUA e cuja atividade seria prejudicada
- Pessoas que queiram morar ou visitar parentes que são cidadãos americanos ou residentes permanentes
A entrada de refugiados neste ano até o mês de outubro será limitada para 50 mil - cerca de 35 mil a menos do que nos últimos 12 meses.
2 - O que acontece agora - e quem será afetado?
Nesta segunda-feira, a Suprema Corte do país declarou que avaliará a partir de outubro argumentos sobre a legalidade do veto.
Enquanto isso, uma liminar sobre o veto foi suspensa e alguns pontos foram permitidos, o que fará com que as restrições entrem em vigor 72 horas depois da decisão da Corte.
Isso quer dizer que as pessoas dos seis países afetados podem viajar para os Estados Unidos apenas "se tiverem uma relação confiável e de boa fé com uma pessoa ou entidade nos EUA".
E a Suprema Corte deixa claro o conceito de relacionamento de boa fé:
- Para indivíduos, uma relação parental próxima é obrigatória
- Para entidades, a relação deve ser formal, documentada, e formada em curso normal e não com a proposta de evadir a ordem
Isso significa que um estudante registrado em uma universidade americana, um trabalhador com uma oferta de emprego no país ou alguém convidado, por exemplo, para dar uma palestra poderá entrar nos EUA.
Apesar disso, o conceito também prevê que qualquer um tentando uma conexão com uma organização dos EUA será banido. Por exemplo, "um grupo sem fins lucrativos dedicado a assuntos de imigração não poderá contatar cidadãos dos países com restrições, e adicioná-los à lista de clientes e depois tentar garantir a entrada dessas pessoas alegando prejuízo ou dano pela restrição".
O próximo mandato da Suprema Corte será de 2 de outubro até 21 de dezembro, portanto os argumentos sobre o veto serão discutidos entre essas datas.
Mas o que a Corte deve decidir? A composição da Suprema Corte atualmente é de quatro juízes liberais e cinco conservadores, entre eles o novo nomeado de Donald Trump, Neil Gorsuch. Mas isso não significa, no entanto, que o veto será aprovado na íntegra.
3 - Por que esses países foram escolhidos?
A segunda ordem executiva afirma que cada um dos seis países é considerado, pelos Estados Unidos, como uma nação patrocinadora do terrorismo ou "foi altamente comprometida por organizações terroristas e possui zonas de conflito ativas".
Segundo a ordem, "isso reduz a disposição do governo estrangeiro de compartilhar ou validar informações importantes sobre indivíduos que querem viajar para os Estados Unidos".
Mas críticos da medida lembram que ataques como os de 11 de Setembro, o perpetrado na Maratona de Boston e o atentado contra uma boate em Orlando foram realizados por cidadãos de países que não integram a lista, como Arábia Saudita, Egito e Quirguistão, ou mesmo nascidos dentro dos Estados Unidos.
4 - Por que a ordem foi inicialmente suspensa?
Os juízes que primeiro suspenderam -e depois retiraram a suspensão - da primeira ordem executiva citaram algumas preocupações:
- A velocidade da decisão: os juízes em São Francisco disseram que o Departamento de Justiça "fracassou em demonstrar que a ordem executiva deu aviso prévio e audiência antes de restringir a capacidade de viajar de um indivíduo"
- Eles alegaram ainda que "não havia provas de que qualquer cidadão de qualquer um dos países citados na ordem" havia cometido atentados contra os EUA
- A exclusão dos sírios da ordem emitida em janeiro também foi problemática. A Lei de Imigração e Nacionalidade prevê que nenhuma pessoa pode ser "discriminada na emissão de um visto de imigração por causa de raça, sexo, nacionalidade, local de nascimento ou residência".
A segunda ordem permitia um prazo de dez dias antes de entrar em vigor - uma tentativa de evitar a confusão e a incerteza causada pela adoção imediata da primeira, quando uma multidão foi detida em aeroportos ou em trânsito.
Mas, apesar disso, um juiz no Havaí ainda suspendeu a ordem revisada. Ele concluiu que, caso o veto fosse adiante, ainda haveria uma grande probabilidade de danos irreparáveis ao violar as proteções garantidas na Primeira Emenda sobre discriminação religiosa.
A justificativa focou nos comentários feitos por Trump e seus conselheiros que sugeriram que a intenção das restrições eram baseadas na religião, apesar de o governo negar isso.
A corte do Havaí também citou "escassez de evidências que indicam um propósito de segurança nacional".
O Departamento de Justiça afirmou que a decisão "fracassou tanto no raciocínio quanto no escopo".
Um juiz de Maryland também bloqueou a ordem, alegando que o veto poderia ser considerado uma restrição aos muçulmanos e, portanto, inconstitucional.
Outros questionamentos legais à segunda ordem:
No Oregon: Justiça disse que a ordem fere residentes, empregadores, universidades, o sistema de saúde e a economia
Em Washington: Justiça alegou que a ordem continha "as mesmas motivações ilegais da original" e fere residentes, apesar de em menor grau que a primeira
Em Minnesota: Justiça questionou a legalidade da ação, sugerindo que o governo Trump não poderia substituir a proibição inicial por uma nova ordem executiva
Em Nova York: trata-se de "um veto aos muçulmanos" com outro nome", disse um juiz
Em Massachusetts: Justiça disse que o novo veto "permanece como uma tentativa discriminatória e inconstitucional para manter uma promessa de campanha de adotar a restrição aos muçulmanos"
Na Califórnia: Justiça alega que a ordem é um ataque baseado na religião ou no país de nascimento de algumas pessoas
Na Virgínia: "Ainda não fomos convencidos de que o veto tem mais relação com a segurança nacional do que com a promessa (de campanha) do presidente de restrições aos muçulmanos", disse a Justiça do Estado.
5- É, de fato, um veto aos muçulmanos?
Essa pergunta está no cerne da batalha legal.
Em 14 de fevereiro, um juiz distrital da Virgínia disse que a primeira ordem era inconstitucional por causa da questão religiosa - uma decisão que foi mantida também com relação a segunda ordem.
Ao julgar a segunda versão, a Corte do Havaí também rejeitou o argumento do governo de que o veto não seria anti-muçulmano porque teria como alvo indivíduos de seis países, independentemente de religião, e essas nações representariam apenas uma pequena fração da população global de muçulmanos.
"A falta de lógica das afirmações do governo é notável. A noção de que se pode demonstrar animosidade em relação a qualquer grupo de pessoas se você estiver visando todas elas ao mesmo tempo é fundamentalmente falha", afirmou a decisão do tribunal, ressaltando que a população dos países escolhidos é composta por 90% a 99% de muçulmanos.
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O tribunal também citou declarações feitas por Trump, como um comunicado de imprensa de 2015 no qual o empresário exigia "o encerramento total e completo da entrada de muçulmanos nos Estados Unidos".
Mas o Departamento de Justiça diz é preciso distinguir as coisas ditas por um candidato e por um presidente.
Com o objetivo de abordar questões de discriminação religiosa, a segunda ordem remove uma parte específica segundo a qual as reivindicações dos refugiados devem ser priorizadas "com base em perseguições religiosas, desde que a religião do indivíduo seja uma religião minoritária no país de nacionalidade do indivíduo".
Trump havia afirmado anteriormente que a prioridade deveria ser dada aos cristãos perseguidos.