Como diplomacia brasileira reagiu a pedido de prisão de Putin pelo Tribunal Penal Internacional
Diplomatas brasileiros ouvidos pela BBC News Brasil afirmam que decisão do tribunal não deverá afetar relação do país com a Rússia; governo russo negou acusações que levaram a corte a emitir mandado de prisão contra o líder do Kremlin e uma assessora.
O mandado de prisão contra o presidente russo, Vladimir Putin, expedido pelo Tribunal Penal Internacional (TPI) nesta sexta-feira (17/03) foi recebido com cautela pela diplomacia brasileira e, segundo diplomatas do país ouvidos pela BBC News Brasil em condição de anonimato, não deverá afetar as relações entre o Brasil e Rússia.
Segundo eles, o Brasil não deverá criticar oficialmente a decisão do tribunal, do qual o Brasil é signatário. Nos bastidores, no entanto, a intenção é de que o país continue evitando medidas que, segundo eles, tentam isolar a Rússia no cenário internacional.
O mandado de prisão contra Putin foi anunciado no início da tarde desta sexta-feira em comunicado divulgado pelo tribunal, com sede em Haia, na Holanda.
Segundo a Corte, o pedido foi uma resposta a pedidos feitos pela promotoria do tribunal que acusa Putin e a comissária russa para os direitos da criança, Maria Lvova-Belova, de terem participação direta na deportação de milhares de crianças da Ucrânia para a Rússia após o início da guerra, em fevereiro de 2022.
A decisão foi anunciada em um momento de intensificação dos combates entre russos e ucranianos e também em meio aos esforços do governo brasileiro, sob a liderança do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), de mediar um acordo de paz entre os dois países.
Lula, que já disse que o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky seria tão responsável pelo conflito quanto a Rússia, tem defendido a criação de uma espécie de "clube de países" que ficaria responsável por negociar a paz entre Rússia e Ucrânia.
A premissa do governo brasileiro é de que este "clube" deveria envolver países não diretamente ligados ao conflito na medida em que nações como os Estados Unidos e outros membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) não teriam interesse no fim rápido da guerra.
Um dos diplomatas ouvidos pela BBC News Brasil sob a condição de anonimato afirmou que a diplomacia brasileira ainda estaria analisando o teor da decisão do tribunal e das acusações imputadas a Putin, mas que o Brasil continuaria evitando posições que, nas palavras dele, levassem ao "cancelamento" da Rússia no cenário internacional.
Outro diplomata afirmou que a expectativa é de que o mandado não afete as relações entre o Brasil e a Rússia no curto e médio-prazos.
Em abril, está prevista a visita do ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergey Lavrov, ao Brasil. Segundo esse diplomata, não haveria nenhuma indicação de que a visita poderia ser adiada por conta da decisão do tribunal.
A reportagem também ouviu que o Itamaraty estava tratando o assunto com "cautela" e que dificilmente o Brasil se manifestaria frontalmente a favor ou contra a decisão do tribunal. A ideia é manter os canais de diálogo abertos com a Rússia.
A BBC News Brasil pediu um posicionamento oficial do Itamaraty sobre a decisão do tribunal, mas até o momento, nenhuma resposta foi enviada. Assim que uma resposta for enviada, esta reportagem será atualizada.
A posição brasileira
A guerra na Ucrânia tem sido um dos principais assuntos debatidos por Lula e outros chefes de Estado desde que assumiu a Presidência, no início deste ano.
A ideia de criar o "clube" de países para mediar o conflito é vista como uma das iniciativas da sua nova gestão para projetar o Brasil na arena internacional, a exemplo do acordo que o Brasil e a Turquia mediaram com o Irã, em 2010, sobre o seu programa nuclear.
O acordo, posteriormente, foi rejeitado pelos Estados Unidos.
Desde o início do conflito na Ucrânia, a posição brasileira em relação à Rússia tem sido a de condenar a invasão, mas de não isolar a Rússia.
Em fevereiro deste ano, o Brasil votou a favor de uma resolução da Organização das Nações Unidas (ONU) pedindo a retirada das tropas russas da Ucrânia.
Apesar disso, o presidente Lula rejeitou um pedido feito pelo chanceler da Alemanha, Olaf Scholz, para que o Brasil enviasse munição para o lado ucraniano do conflito.
"Eu falei (para Scholz): se eu mandar as munições que você está pedindo, eu entrei na guerra. E eu não quero entrar na guerra. Eu quero acabar com a guerra", disse Lula em fevereiro à rede de TV americana CNN.
Internacionalmente, o plano brasileiro de mediar o conflito entre russos e ucranianos tem sido visto com ceticismo, especialmente pelo governo americano.
Em resposta à BBC News Brasil em fevereiro, o governo dos Estados Unidos, um dos principais envolvidos no conflito e que já injetou pelo menos US$ 46 bilhões em armas, munições e outros tipos de suporte.
A expectativa é de que Lula volte a defender uma estratégia de mediação do conflito durante sua viagem para a China, onde irá encontrar o presidente do país, Xi Jinping. Lula estará na China entre os dias 26 e 31 de março.
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