Eleições nos EUA: como um vídeo de campanha abriu nova crise entre Trump e o cientista-chefe da Casa Branca
Na propaganda Anthony Fauci parece estar elogiando Donald Trump, mas ele está falando sobre seu próprio trabalho.
O cientista-chefe do governo dos Estados Unidos, Anthony Fauci, disse que um clipe seu foi usado em uma propaganda da campanha eleitoral do presidente Donald Trump de modo "enganoso".
Fauci é citado por dizer que "não imagina que alguém pudesse fazer mais" na luta contra a covid-19. No anúncio, ele parece estar se referindo especificamente ao presidente Trump.
Mas Fauci, que entrou em conflito com Trump ainda antes da pandemia, estava na verdade falando sobre si próprio e outros funcionários do governo.
O especialista em doenças infecciosas disse que nunca endossou publicamente nenhum candidato político.
A polêmica surge no momento em que o presidente Trump retorna à campanha esta semana, apenas dois dias depois que seus médicos lhe deram permissão para retomar os eventos públicos. Trump teve covid-19 e passou os últimos dias em tratamento.
Ele enfrenta o democrata Joe Biden na eleição de 3 de novembro.
O que aconteceu agora?
O anúncio da campanha de 30 segundos declara que "o presidente Trump está se recuperando do coronavírus, e a América também", antes de reproduzir um clipe de Fauci.
O vídeo de Fauci vem de uma entrevista que o epidemiologista deu ao canal Fox News em março.
A citação completa de Fauci nessa entrevista é: "Tenho me dedicado quase todo o tempo a isso. Estou na Casa Branca praticamente todos os dias com a força-tarefa. É todo santo dia. Então, não consigo imaginar isso sob quaisquer circunstâncias em que alguém poderia estar fazendo mais".
O cientista-chefe disse em um comunicado no domingo: "Os comentários atribuídos a mim sem minha permissão no anúncio da campanha do GOP [como é conhecido o Partido Republicano] foram tirados do contexto de uma declaração mais ampla que dei meses atrás sobre os esforços de funcionários federais de saúde pública".
"Em minhas quase cinco décadas de serviço público, nunca apoiei publicamente nenhum candidato político."
A campanha de Trump defendeu o anúncio.
O porta-voz Tim Murtaugh disse: "Estas são as próprias palavras do Dr. Fauci. O vídeo é de uma entrevista transmitida nacionalmente pela televisão na qual o Dr. Fauci elogiava o trabalho da administração Trump. As palavras ditas são precisas e diretamente da boca do Dr. Fauci".
Fauci e Trump já se desentenderam antes?
O médico tem sido um membro-chave da força-tarefa da Casa Branca contra o coronavírus, mas este ano ele já precisou esclarecer ou questionar algumas das afirmações feitas pelo presidente sobre a pandemia.
Em abril, Trump retuitou uma hashtag #FireFauci, que pedia a demissão do médico, mas depois insistiu que Fauci estava fazendo um ótimo trabalho.
O médico disse que os Estados Unidos deveriam ter tomado atitudes mais rápidas e abrangentes no início da pandemia, e esteve em lados opostos de Trump em questões como a reabertura de escolas.
Fauci também criticou a Casa Branca por sediar uma reunião no mês passado que teria provocado um surto de covid-19.
Ele disse que o evento no Rose Garden da Casa Branca em 26 de setembro, realizado para revelar o nomeado do presidente Trump para a Suprema Corte, foi um evento "superdisseminador" do vírus. Pelo menos 11 pessoas que compareceram posteriormente testaram positivo para coronavírus.
Pelo menos 34 assessores da Casa Branca e outros contatos testaram positivo para covid-19 recentemente, de acordo com a imprensa americana, muitos deles ligados ao evento de 26 de setembro.
O que Trump disse?
O presidente Trump defendeu o uso do clipe de Fauci, tuitando: "São de fato as próprias palavras do Dr. Fauci. Fizemos um trabalho 'fenomenal', de acordo com alguns governadores".
Em geral, Trump expressou ceticismo sobre medidas como máscaras e bloqueios para combater a disseminação da covid-19, que já matou mais de 213 mil pessoas nos Estados Unidos.
O presidente, que testou positivo no dia 1º de outubro e ficou hospitalizado por três dias com o vírus, disse no domingo que seu diagnóstico atual para covid-19 é "totalmente negativo", embora nem ele nem os médicos da Casa Branca tenham apresentado confirmação.
Trump diz estar imune agora. Ele disse em entrevista que a duração de sua alegada imunidade "pode ser muito tempo ou pode ser um tempo curto". E também tuitou que "isso significa que não posso passar nem receber" o vírus.
Mas essa declaração gerou críticas. O Twitter alertou que a mensagem de Trump pode estar "espalhando informações enganosas e potencialmente prejudiciais".
Os médicos ainda não sabem ao certo o nível de imunidade que um ex-paciente de covid-19 possui.
Trump retoma sua campanha com força total na segunda-feira com um grande comício em Sanford, Flórida, antes de seguir para a Pensilvânia e Iowa.
Esses são os principais Estados na sua campanha, porque podem decidir a eleição.
Pesquisas sugerem que Biden tem uma vantagem de apenas um dígito sobre Trump, e uma pesquisa da ABC News / Ipsos descobriu que apenas 35% dos americanos aprovam como Trump lidou com a crise.
No entanto, as corridas nesses Estados decisivos costumam ser muito mais disputadas
Outro fator este ano é o voto por correspondência. Deve haver muito mais gente votando por correio por causa da covid-19, e Trump tem regularmente citado a possibilidade de fraude eleitoral, embora a Comissão Eleitoral diga que não há base para se temer isso.
O que a campanha Biden tem feito?
Os democratas estão se concentrado muito na covid-19.
Em um tweet no domingo, Biden disse: "Em janeiro, eu disse que o presidente Trump era o pior líder possível para lidar com uma crise de saúde pública. E tudo o que passamos nos meses desde então provou que isso é verdade".
A equipe de Biden também publicou regularmente resultados de testes de coronavírus do candidato, em uma tentativa de destacar a falta de informações sobre Trump na Casa Branca.
Biden segue para Ohio na segunda-feira, com eventos em Toledo e Cincinnati. Trump venceu o Estado por oito pontos em 2016, mas as pesquisas de opinião sugerem a disputa será acirrada desta vez.
A campanha democrata também está gastando bem mais do que os republicanos em publicidade eleitoral — praticamente o dobro.