Especial/Guia para entender a crise na Líbia
País será tema de conferência internacional em 19 de janeiro
A cidade de Berlim, na Alemanha, receberá no próximo domingo (19) mais uma conferência internacional para tentar pacificar a Líbia, que, na prática, não existe hoje enquanto Estado unitário. Veja abaixo alguns tópicos para entender a crise em um dos maiores países da África.
A crise - A Líbia se fragmentou politicamente após a queda de Muammar Kadafi, em 2011, e desde então é palco de conflitos entre milícias. De um lado está um "governo de união nacional" guiado pelo primeiro-ministro Fayez al-Sarraj e apoiado pelos grupos armados de Trípoli e Misurata. O premier é reconhecido como legítimo pelas Nações Unidas (ONU) e pela União Europeia e conta com suporte militar da Turquia.
Do outro lado está o marechal Khalifa Haftar, que chefia o Exército Nacional Líbio, um conjunto de milícias fiel a um parlamento paralelo estabelecido em Tobruk, no leste do país.
Haftar tem apoio declarado do Egito e dos Emirados Árabes Unidos, além da simpatia de França e Rússia.
O marechal se considera inimigo do Islã político e não reconhece a legitimidade do governo Sarraj - instituído por uma conferência de paz no Marrocos, em 2015. Suas forças controlam a maior parte da Líbia, principalmente o leste e o desértico sul.
Apelidado no país de "senhor da guerra", Haftar foi aliado de Kadafi e o ajudou a derrubar o rei Idris, em 1969, mas rompeu com o coronel em 1987. O marechal se exilou nos Estados Unidos, onde ganhou cidadania, e liderou tentativas de golpe contra Kadafi.
Ofensiva - Haftar iniciou, em abril passado, uma ofensiva para conquistar Trípoli e reunificar a Líbia sob seu poder. O marechal alega que a capital está tomada por "terroristas", mas avançou pouco em nove meses de conflitos.
A ofensiva teve início 10 dias antes de uma conferência internacional de paz convocada pela ONU em Gadamés, na tríplice fronteira com Tunísia e Argélia. A cúpula acabou cancelada.
Trégua - Ao menos oficialmente, o conflito na Líbia está paralisado por uma trégua provisória em vigor desde a meia-noite de 12 de janeiro, mas há inúmeras denúncias de violações do cessar-fogo de ambos os lados.
Conferências precedentes - A cúpula de Berlim não será a primeira tentativa de pacificar a Líbia. Em julho de 2017, Sarraj e Haftar se reuniram na França com o presidente Emmanuel Macron e prometeram realizar eleições no primeiro semestre do ano seguinte, plano que nunca saiu do papel.
Já em 12 de novembro de 2018, a Itália fez uma conferência de paz em Palermo, mas o evento não alcançou resultados concretos e foi parcialmente boicotado por Haftar, que participou apenas de encontros informais na cidade siciliana.
Participantes - Além da anfitriã, a chanceler Angela Merkel, a cúpula de Berlim terá os dois protagonistas dos conflitos, Sarraj e Haftar, e líderes do primeiro escalão internacional.
Os presidentes da Turquia, Tayyip Erdogan, e da Rússia, Vladimir Putin, artífices do cessar-fogo em vigor atualmente, estarão presentes, assim como os mandatários da França, Emmanuel Macron, e do Egito, Abdel Fattah al-Sisi.
A Itália será representada pelo primeiro-ministro Giuseppe Conte e pelo chanceler Luigi Di Maio, enquanto o secretário de Estado Mike Pompeo irá a Berlim em nome dos EUA.
Efeitos do conflito - A fragmentação da Líbia provocou dois efeitos com repercussão no contexto internacional. O primeiro é o avanço de grupos terroristas, incluindo o Estado Islâmico, e o segundo é o domínio do litoral por traficantes de seres humanos.
Com isso, a Líbia se tornou um dos principais vetores da crise migratória no Mediterrâneo. Centenas de milhares de deslocados internacionais saíram de sua costa em barcos superlotados com destino à Itália nos últimos anos, o que faz Roma colocar sua ex-colônia como prioridade na política externa.
A Guarda Costeira subordinada a Sarraj é treinada e equipada pelo governo italiano desde 2017, o que ajudou a reduzir o número de migrantes nessa rota do pico de 181 mil em 2016 para 11,47 mil em 2019.