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As pessoas que tentam o sucesso em Hollywood, mas acabam engrossando população sem-teto

Los Angeles vê número de moradores de rua crescer 23% desde o ano passado, chegando a 58 mil; jovens estão entre os mais afetados.

21 jul 2017 - 17h09
(atualizado às 17h43)
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A indústria do entretenimento dá à californiana Los Angeles sua famosa imagem de "cidade dos sonhos". Mas por trás do aparente glamour de Hollywood e suas grandes estrelas, há uma dura realidade: o crescente aumento no número de pessoas vivendo em suas ruas.

Moradores de rua em Los Angeles
Moradores de rua em Los Angeles
Foto: BBC News Brasil

Somente no ano passado, a alta foi deu 23%. Um problema se tornou visível com as filas de barracas que se formaram em vários lugares da metrópole.

Os turistas ficam surpresos ao desviarem de pessoas enroladas em cobertores pedindo esmolas em locais famosos como a Calçada da Fama. Já os comerciantes afirmam que precisam limpar as calçadas em frente aos estabelecimentos todos os dias para lavar a urina e, consequentemente, eliminar o odor.

"Em 31 anos de trabalho com moradores de rua, nunca vi uma situação tão ruim como a de agora", conta o ativista Ted Hayes.

Segundo ele, a gentrificação de Hollywood e do centro histórico da cidade fez a população de rua que estava concentrada nessas regiões se espalhar por outros cantos da cidade.

Os jovens

O número de sem-teto em Los Angeles subiu de 46,8 mil em 2016 para 58 mil neste ano. Áreas próximas, como Orange County, também registraram aumento.

E de acordo com dados recentes, o grupo demográfico de maior crescimento é o de jovens entre 18 e 24 anos - o uma alta de 64% em relação ao ano passado. Entre os mais velhos, o avanço foi de 41%.

Os dados foram compilados por uma equipe de 7,7 mil voluntários durante três dias e noites, em janeiro.

"Essas cifras assustam", disse Kerry Morrison, diretora-executiva da Aliança dos Proprietários de Imóveis de Hollywood, uma corporação sem fins lucrativos que administra as melhorias nos prédios da região.

Los Angeles
Los Angeles
Foto: BBC News Brasil

Morrison diz que os comerciantes, ao lado de funcionários da prefeitura e de uma série de organizações de caridade, vêm trabalhando com esse problema durante anos. Mas, na sua visão, eles parecem estar perdendo a batalha.

Para ela, a piora na situação se deve a uma combinação de fatores, principalmente o alto custo de vida na cidade. "Os preços das moradias estão superando, em muito, os aumentos salariais."

Outro fator é a meta do governo da Califórnia de reduzir a população carcerária. O Estado adotou novas medidas que colocou cerca de 9,5 mil detentos em liberdade. Morrison diz que, em alguns casos, muitos ex-presidiários também acabam nas ruas.

Ela cita ainda a "atração" exercida pelo chamado Golden State ("Estado dourado") sobre os americanos que atravessam dificuldades econômicas.

"A Califórnia parece exercer essa fascinação. Algo como 'vá para o oeste e conquiste o que é seu. Faça seu futuro aqui."

Começar do zero

Kitty e sua filha de 34 anos, Sura, vieram à Califórnia buscando um respiro em tempos difíceis. Elas são do Nevada, e de lá foram para Idaho e, depois, Arizona. Finalmente acabaram em Los Angeles, onde esperam "recomeçar do zero".

Sura é transexual e explica que escolheu ficar em Hollywood porque o centro local LGBT é "realmente bom".

Com a pele curtida pelo intenso sol californiano, elas dormem debaixo de uma lona durante a noite e, de dia, passam o tempo nas bibliotecas públicas, principalmente para poder carregar seus celulares.

Mas a vida nas ruas nunca fez parte dos planos das duas.

"Não encontramos trabalho e não tínhamos dinheiro para pagar um aluguel. Ficamos sem lugar para morar", diz Kitty.

Elas não são as únicas, destaca Tom Waldman, da Autoridade de Serviços aos Sem Teto de Los Angeles.

"As pessoas se sentem atraídas pelo condado de Los Angeles por causa do clima e da fama mundial. Mas elas chegam aqui e descobrem que é muito caro viver."

Waldman também culpa "as condições econômicas que neste momento prevalecem na cidade, influenciando os preços dos alugueis e a alta taxa de pobreza".

Kay, um jovem de 20 anos de aparência vulnerável, vive com amigos em uma barraca em Hollywood.

Ele sonha em ser uma estrela.

"Quero ser famoso, fazer música e dançar."

A vida nas ruas, conta, é "estressante".

"Há muitas coisas que não me servem por aí, como as drogas. E é muito difícil se manter longe delas."

Como muitos jovens sem moradia, Kay diz que por questões de higiene prefere dormir nas ruas a ir para um albergue. Ele explica que a Skid Row, o maior e mais conhecido enclave de sem teto de Los Angeles, é um lugar de "dar medo".

Paradoxo

Los Angeles
Los Angeles
Foto: BBC News Brasil

O fenômeno dos sem teto no condado de Los Angeles é um "paradoxo", diz Waldman.

Segundo ele, mais de 14 mil pessoas foram transferidas para moradias permanentes ou transitórias no ano passado - um aumento de 30% em relação a 2015.

"Em um sentido, estamos fazendo melhor nosso trabalho", diz - mas é fato que o problema como um todo está piorando.

Não há escassez de voluntários para ajudar. Além disso, os legisladores estatais estudam novas medidas para reiniciar a construção de moradias populares.

Em março, foi aprovado um aumento de impostos para pagar por subsídios e serviços para os sem teto. Isso significa US$ 355 milhões (R$ 1,1 bilhão) adicionais de investimento anual, durante os próximos dez anos, em refúgios, centros de habilitação e serviços. No ano passado, outra iniciativa assegurou US$ 1,2 milhão (R$ 3,75 milhões) em financiamento para residências permanentes.

"Ao mesmo tempo em que temos essa população que está crescendo tão dramaticamente, as autoridades nos deram recursos para enfrentar essa situação", diz Waldman.

Deterioração

Esse otimismo, porém, não é de todo compartilhado.

"O que vi ao longo dos anos é uma deterioração do modo como se enfrenta o problema dos sem teto", afirma o ativista Ted Hayes, que é cético sobre a ajuda que a bonança de recursos pode trazer.

"Quanto mais dinheiro eles levantam, mais o problema aumenta. Portanto, é evidente que o dinheiro não está chegando às pessoas nas ruas", diz.

Christin, de 26 anos, vive em condições precárias nas margens de uma rodovia. Ela conhece bem a dicotomia de Los Angeles.

"Você vem para cá pensando em morar em um lugar caro, limpo. Você não espera ver pessoas em todas as esquinas, roupas por todo lugar, lixo. As pessoas vêm para cá esperando realizar seus sonhos, mas não acredito que muitas consigam isso."

A reportagem então pergunta sobre os sonhos dela.

"Eu quero cantar. Mas, na verdade, não sei se isso vai acontecer aqui."

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