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Buscando ganho político, Bloomberg "relaxa" lei de NY para maconha

Em seu último ano de governo, prefeito anuncia que pessoas flagradas com pequenas quantidades não terão mais de passar a noite na cadeia

21 fev 2013 - 10h33
(atualizado em 9/9/2013 às 13h54)
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Durante seu último discurso anual sobre o estado da cidade de Nova York, o prefeito Michael Bloomberg anunciou que usuários de maconha flagrados com pequenas quantidades não terão mais de passar a noite na cadeia. O comunicado surgiu após meses de polêmica entre o prefeito e críticos da tática policial de revistar suspeitos em bairros pobres e não representa uma mudança ampla na legislação, que já descriminalizou o porte de pequenas quantidades no Estado desde 1977. Assim, a medida pode ser interpretada mais como uma ação politicamente estratégica para suavizar a imagem de Bloomberg do que uma verdadeira mudança na celebrada política de tolerância zero ao crime, responsável por tornar Nova York novamente segura e até o centro do movimento de renascença dos centros urbanos dos EUA.

Bloomberg discursa durante o Estado de Nova York, no Barclays Center, no dia 14 de fevereiro
Bloomberg discursa durante o Estado de Nova York, no Barclays Center, no dia 14 de fevereiro
Foto: AFP

O prefeito escolheu para seu pronunciamento da última quinta-feira o Barclays Center, a nova arena de basquete e espetáculos encravada no centro do Brooklyn, por si só uma vitória política de Bloomberg em seus esforços para reurbanizar partes da cidade. O discurso também marcou o começo de seus derradeiros 11 meses comandando a cidade de Nova York, após três mandatos de quatro anos. O prefeito já conseguiu mudar a lei para ser eleito pela terceira vez, mas a quarta vez continua proibida.

No mesmo dia em que fez 71 anos, Bloomberg comemorou o declínio histórico no número homicídios da cidade (419 no ano passado, o menor da história) e também o recorde de turistas de 2012, de 52 milhões. Ele também defendeu vigorosamente a tática policial de revistar suspeitos aleatoriamente, conhecida como “stop and frisk”, alvo de vários processos na Justiça sob acusação de racismo e inconstitucionalidade. “Entendo que pessoas inocentes não querem ser revistadas, mas esses inocentes também não querem ser assassinados a tiros”, disse.

Em seu programa de rádio semanal na sexta-feira, Bloomberg defendeu também a mudança na abordagem para os usuários de maconha, com o argumento de que ela ajudará a descongestionar os tribunais da cidade, mas se declarou contra a legalização da droga, afirmando que a oferta atual é muito mais potente e os traficantes simplesmente passariam a vender outras drogas se ela fosse legalizada.

A medida de Bloomberg também surge na sequência do discurso do governador Andrew Cuomo em janeiro. Durante seu próprio pronunciamento sobre a situação do Estado, uma tradição americana para cargos eletivos no poder executivo, Cuomo prometeu tentar mais uma vez legalizar a maconha em Nova York. Uma tentativa parecida no ano passado foi derrotada por políticos republicanos na Assembleia Estadual.

O clima nacional nos Estados Unidos indica uma certa liberalização na atitude sobre a droga, considerada ilegal na legislação federal. Os Estados de Colorado e Washington legalizaram nas eleições de novembro o uso recreativo da maconha (mas proibiram que seja fumada em público).

Em meio ao debate instilado na sociedade americana pela legalização em dois Estados, o Presidente Barack Obama disse numa entrevista à rede ABC em dezembro que “não faz sentido para nós, do ponto de vista da prioridade, nos concentrar em usuários recreativos em um Estado que já determinou que isso é legal pela lei estadual.”

Bloomberg está completando seu terceiro mandato à frente da prefeitura de NY
Bloomberg está completando seu terceiro mandato à frente da prefeitura de NY
Foto: AFP

A mudança anunciada pelo prefeito foi aplaudida com ressalvas por grupos que defendem os direitos de minorias em Nova York. Alfredo Carasquillo, líder comunitário responsável pela área de direitos civis na ONG Vocal-NY, que representa presidiários, disse que o apoio de Bloomberg à reforma da legislação sobre maconha é um passo na direção certa mas não soluciona a questão das táticas policiais consideradas abusivas, como o “stop and frisk”.

Gabriel Sayegh, diretor estadual da Drug Policy Alliance, um grupo nacional que defende reformas na questão das drogas, disse que a mudança foi um resultado direto da campanha de grupos comunitários de Nova York para acabar com essas prisões, que o grupo considera racistas. "A Assembleia Estadual precisa agir agora para aprovar a proposta do Governador Cuomo para descriminalizar a maconha."

Pouca mudança

Um nova-iorquino de 53 anos que fuma maconha e também a vende há 17 anos numa discreta “boca de fumo” em meio à gentrificação generalizada de Williamsburg, no Brooklyn, disse ao Terra que a mudança anunciada por Bloomberg não fará muita diferença em seus hábitos. Ele prefere não fumar na rua e diz que já existe uma certa tolerância sobre o uso em espaços privados hoje em dia.

“A gente sabe as regras do jogo e não fuma na rua. Fumar continua sendo crime. Eles estão apenas suavizando as próprias leis deles para economizar dinheiro com os tribunais,” disse. “Cada policial tem flexibilidade para acusar o crime que achar cabível. Eles podem usar aquilo como algo a mais contra você, ou classificar aquilo como algo menor”, acrescentou ele, que pediu anonimato.

A Legal Aid Society, uma ONG que oferece representação legal para nova-iorquinos de baixa renda, abriu um processo contra a polícia de Nova York no meio do ano passado em que acusa as autoridades de ignorarem a lei estadual de 1977 e uma ordem emitida pelo próprio chefe de polícia Raymond Kelly em setembro de 2011, orientando policiais a não prenderem suspeitos revistados de acordo com a política do “stop and frisk” e que fossem flagrados com pequenas quantidades de maconha. A Legal Aid Society alega que a prisão dessas pessoas viola o direito à privacidade delas e é usada como uma maneira de implicar suspeitos em crimes.

Mais de 39 mil pessoas foram detidas em Nova York ano passado por porte de pequenas quantidades de maconha, segundo dados oficiais. É 22% menos que em 2011, mas ainda um número vultuoso em comparação à média de 2,2 mil por ano que ocorreu nas duas décadas anteriores ao início dos anos 1990, quando a política de “tolerância zero” no combate ao crime na cidade aumentou esse total para um recorde de 50 mil em 2011. A mudança anunciada pelo prefeito também não significa que os maconheiros escaparão ilesos do flagrante: agora eles serão conduzidos a uma delegacia, terão a identidade checada para verificar se não há mandatos de prisão pendentes e terão de se apresentar posteriormente perante um juiz.

A lei estadual de 1977 afirma que portar até 25 gramas de maconha é proibido, mas passível apenas de uma multa de US$ 100. Se o indivíduo for pego pela terceira vez com a droga, pode ser acusado de contravenção (ou delito leve) e receber multa de R$ 250. É só a partir de 450 gramas que o flagrante se torna mais sério, passível de enquadramento como crime, pena de até um ano de prisão e multa de US$ 5.000. O objetivo da lei de 77, sancionada em meio a uma crise fiscal no estado, era parecido com o alegado por Bloomberg semana passada: Concentrar o trabalho da polícia em crimes mais graves, mas também de um certo modo moralizar o espaço urbano, à exemplo da onipresente legislação americana proibindo consumo aberto de álcool.

Fonte: Especial para Terra
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