Torturas da CIA incluíam isolamento e privação de sono
Relatório do Senado diz que CIA realizou métodos "brutais" de interrogatório
Pouco depois dos ataques de 11 de setembro de 2001, a CIA, agência de inteligência americana, elaborou uma lista de novas técnicas de interrogatório que incluíam privação do sono, tapas no rosto, sujeição de prisioneiros a baixas temperaturas e a notória simulação de afogamento - conhecida como waterboarding em inglês.
Os interrogatórios de suspeitos de fazer parte da rede Al-Qaeda eram "brutais", segundo o crítico relatório do senado americano divulgado na terça-feira.
A divulgação do relatório revelou pontos sombrios da "guerra contra o terror" do ex-presidente dos Estados Unidos George W. Bush. As práticas eram brutais e produziram poucos detalhes de inteligência valiosos, segundo relatório da Casa Branca vazado em julho de 2014.
A CIA defende suas ações, dizendo que elas salvaram vidas.
O relator da ONU para direitos humanos Ben Emmerson disse que as autoridades do governo do ex-presidente George W. Bush que planejaram e aprovaram crimes devem ser processadas, assim como oficiais da CIA e do governo responsáveis por tortura.
O diretor-executivo da ONG Human Rights Watch disse que as ações da CIA eram crimes "que nunca poderão ser justificados".
As técnicas de tortura
No waterboarding, um prisioneiro é mantido com os pés num nível acima da cabeça ou mantido de cabeça para baixo. Um pano é colocado sobre o rosto ou empurrado pela boca. Em algumas vezes, um filme de plástico era usado.
A água era, em seguida, despejada no rosto, no nariz e na boca. O prisioneiro engasga quase imediatamente, já que a água entrava nos pulmões.
Quando eles começavam a sentir que estavam se afogando, os detentos normalmente entravam em pânico. O corpo entrava em convulsão. A técnica poderia resultar em danos ao cérebro, quebras de ossos e danos psicológicos.
Os métodos controversos foram usados por interrogadores da CIA em locais secretos em todo o mundo, conhecidos como "locais negros".
Outras técnicas incluíam tapas no rosto, privação a sono e colocação em posições desconfortáveis. Alguns detentos foram impedidos de dormir por até 180 horas em posições dolorosas, com as mãos algemadas sobre a cabeça.
Detentos foram mantidos em celas isoladas completamente escuras, com música ou barulho alto.
O líbio Abdul Hakim Belhaj disse à BBC há dois anos que havia sido torturado. "Eu fui sequestrado no aeroporto de Bangcoc (Tailândia) e eu e minha família fomos torturados pela CIA e, claro, isso continuou quando fui entregue às autoridades líbias".
"Eu fui torturado, mas o mais angustiante é o que aconteceu com a minha esposa doente e grávida na época".
"Quando fomos detidos no aeroporto de Bangcoc, ficamos por dias em uma pequena cela muito lotada. Minha esposa foi brutalmente torturada. Eu fui espancado, estrangulado contra uma parede. Fui colocado sob muita pressão psicológica durante a meu interrogatório".
Qual foi a justificativa?
Em abril de 2009, o presidente dos EUA, Barack Obama, liberou ao público uma série de memorandos legais escritos entre 2002 e 2005 por advogados do governo Bush que procuraram justificar o uso do waterboarding e outros métodos.
Os advogados argumentaram que os métodos não eram "cruéis, desumanos ou degradantes" sob a lei internacional e destacou salvaguardas, como a realização de interrogatórios sob a supervisão de um médico ou psicólogo com a autoridade de interrompê-los.
Um memorando disse que a simulação de afogamento só seria usada quando a CIA tivesse "inteligência confiável" de que um ataque terrorista era iminente e que houvesse "indicadores confiáveis" de que os suspeitos possuíam "inteligência acionável".
O ex-advogado da CIA John Rizzo autorizou o programa. Falando à BBC no início deste ano, Rizzo disse que capturar e interrogar suspeitos de terrorismo era melhor do que matar pessoas em ataques de aviões não tripulados - drones.
'183 simulações de afogamento'
Descrito pela inteligência dos EUA como "um dos terroristas mais abomináveis da história", Khalid Sheikh Mohammed confessou ter planejado os ataques de 11 de setembro.
Ele diz ter decapitado pessoalmente o jornalista americano Daniel Pearl no Paquistão.
Nascido no Kuweit de pais paquistaneses, ele se formou em uma universidade americana, antes de ir para o Afeganistão para lutar contra os soviéticos. Acredita-se que foi neste período que ele se encontrou pela primeira vez com Osama Bin Laden.
Ele confessou - ou esteve ligado a - diversos planos de atentados, inclusive o de explodir um avião americano sobre o Atlântico em 2001.
Após sua captura no Paquistão, em 2003, ele foi levado a centros de detenção, cuja localização seria na Europa. Segundo o relatório do Senado, ele foi submetido a pelo menos 183 simulações de afogamento.
Mas o relatório disse que várias das informações dadas por Mohammed eram falsas.
Ele é mantido na prisão de Guantánamo.
'Mantido no frio e nu'
Descrito por oficiais americanos como principal recrutador da Al-Qaeda nos anos 1990, Abu Zubaydah foi capturado no Paquistão e enviado a uma unidade secreta na Tailândia.
A cela dele foi descrita como branca, sem luz natural ou janelas, mas com quatro luzes permanentemente ligadas.
Entre 4 e 23 de agosto de 2002, após 47 dias de isolamento completo, Abu Zubaydah foi submetido a sessões de interrogatório quase 24 horas por dia.
Ele era algemado e encapuzado, e deixado completamente nu. "Abu Zubaydah era mantido nu e sem dormir", diz o relatório.
Um memorando do Departamento de Justiça dos EUA tinha revelado em 2009 que Zubaydah foi submetido a 83 sessões de afogamento. Ele disse depois ter inventado revelações falsas para satisfazer os interrogadores.
Segundo o memorando, ele foi mantido por 29 horas em uma caixa, de 53 cm de largura e profundidade e altura de 76cm.
Ele é mantido na prisão de Guantánamo.
'Simulações de execução'
Abd al-Rahim al-Nashiri é o suspeito de ter orquestrado o ataque ao destroyer americano USS Cole, atingido por ataques suicidas enquanto estava atracado no porto de Aden, no Iêmen. O atentado deixou 17 mortos.
Segundo a inteligência americana, o islamista saudita era o líder das operações da Al-Qaeda na região do Golfo Pérsico. Ele estaria envolvido em planos contra alvos ocidentais nos Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita, Estreito de Gilbratar, Marrocos e Catar.
Após ser preso em Dubai em 2002, ele foi mantido por quatro anos em diversas unidades secretas da CIA em todo o mundo, incluindo na Polônia e na Tailândia. Neste período, ele enfrentou simulações de execução e afogamento, segundo o relatório.
Em 2006, ele foi transferido para Guantánamo, onde permanece preso.