25 anos depois, ação quer salvar restos do Muro de Berlim
East Side Gallery, uma das últimas partes remanescentes do Muro, está ameaçada por empreendimentos imobiliários, apesar de ter sido tombada pelo patrimônio histórico
Um mal entendido durante uma coletiva de imprensa internacional transmitida ao vivo pela televisão e rádio no início da noite de 9 de novembro de 1989 foi o estopim para a queda do muro de Berlim. No evento, Günter Schabowski, funcionário do partido comunista da República Democrática Alemã, anunciou a mudança na lei que restringia viagens ao exterior a cidadãos da Alemanha Oriental.
A medida, no entanto, deveria começar a valer somente nos próximos dias. Mas pressionado por jornalistas e confuso, Schabowski declarou “isso entra em vigor, segundo meu conhecimento, imediatamente”.
A afirmação levou milhares de alemães às ruas de Berlim, o que ocasionou a abertura das fronteiras internas e o início da destruição do muro que dividiu famílias e a cidade por 28 anos.
Hoje, 25 anos após a sua queda, quase não há mais resquícios do muro na capital alemã. Sua lembrança e presença se resumem basicamente a um sinal no chão, que marca seu traçado. E uma de suas últimas partes remanescentes, a East Side Gallery, com 1,3 quilômetro de extensão, está ameaçada por empreendimentos imobiliários, apesar de sua importância histórica.
“A East Side Gallery é um símbolo da superação da divisão e da revolução pacífica que tomou conta do leste alemão. Por isso, ela não é monumento do terror e suas imagens refletem a alegria inacreditável dessa superação”, afirmou Sascha Disselkampf, integrante da comissão de clubes noturnos que faz parte da iniciativa Salve a East Side Gallery.
Para evitar a destruição do maior pedaço do muro que ainda resta em Berlim, a iniciativa foi criada após o anúncio de empreendimentos imobiliários na região. Apesar da East Side Gallery ter sido tombada pelo patrimônio histórico, no terreno que fica entre o muro e o rio foi programada a construção de apartamentos de luxo e um hotel.
Herança para outras gerações
A obra exige, no entanto, a retirada de algumas partes do muro e, consequentemente, imagens da galeria, que foi pintada em 1990 por 118 artistas de 21 países. Em 2013, a iniciativa, que é composta também por um grupo de artistas e outras organizações, promoveu uma série de manifestações para tentar evitar o início das obras no local.
Para Disselkampf, evitar a destruição da East Side Gallery é fundamental para preservar a história de Berlim. “Nas últimas décadas a presença do muro foi perdida. Ele deveria ter sido preservado em alguns cruzamentos, mostrando que ele passava no meio da rua, para que gerações futuras pudessem imaginar e sentir como uma cidade pode ser dividida e como pessoas que moram na mesma cidade são separadas”, acrescentou.
Os novos prédios na região não irão somente contribuir para encolher a extensão do muro restante, mas também vão modificar sua característica e o seu significado. “Ele vai se tornar quase como um muro colorido de uma casa. Essa construção massiva vai ser degradada a um muro qualquer”, afirmou Disselkampf.
Desde o início das obras, essa perda de significado já é uma realidade. “Havia um ponto em uma curva, onde justamente está o prédio, no qual era possível olhar para ambos os lados e ter a sensação de estar na cidade antiga, ainda separada pelo muro. Mas agora essa visão foi destruída”, contou Jordi Pérez que também faz parte da iniciativa Salve a East Side Galley.
Apesar dos protestos, a iniciativa não conseguiu impedir a retirada de pouco mais de seis metros do muro para a construção dos apartamentos de luxo que devem ser entregues no próximo ano. Com relação ao hotel, o proprietário do imóvel ainda espera autorização para iniciar as obras e, provavelmente, mais partes do muro deverão ser removidas. A iniciativa estima que a destruição possa chegar a mais de 50 metros.
Preservação do que resta
Enquanto uma parte do muro corre perigo, outra foi preservada e transformada em memorial. Ao longo da rua Bernauer, os 220 metros de muro original foram integrados em um museu a céu aberto sobre a divisão da cidade.
“O memorial é importante, pois em Berlim não temos mais muitos lugares onde ainda há resquícios do muro. Aqui a ideia não é só mostrar um pedaço no muro, mas sua dimensão e profundidade para que as pessoas consigam imaginar que ele não era somente um muro, mas um sistema de fronteira”, afirma Hannah Berger, porta-voz da Fundação Muro de Berlim que administra o memorial.
Para transmitir essa dimensão, foram colocadas barras de ferro ao longo do percurso onde a rua foi dividida e uma torre de observação que existia no local foi reconstruída. A ideia para transformar o local em um memorial surgiu em 1991. Desde então, o projeto vem sido debatido e em 1998 sua primeira parte foi inaugurada.
“O memorial pretende transmitir que a história do muro e da divisão da cidade deixou claro que democracia e liberdade por um lado não são evidentes, mas por outro são possíveis e podem vir de forma pacífica”, completou Berger.
A iniciativa para salvar a East Side Gallery sugeriu que ela fosse incorporada pela Fundação Muro de Berlim, garantido, assim, a preservação da galeria como aconteceu na rua Bernauer. Mas segundo a iniciativa, devido à falta de recursos, a fundação descartou essa hipótese. A fundação, no entanto, não quis comentar o assunto.