Controles de fronteira da Alemanha repercutem na Europa
Iniciativa de Berlim tem potencial de reforçar os Estados europeus que se opõem ao acolhimento dos refugiados.
Apenas alguns dias após ter se apresentado como paladina da solidariedade aos refugiados, a Alemanha está ameaçada de se tornar figura de proa para os governos que rechaçam o acolhimento e asilo aos milhares de migrantes que chegam ao continente, vindos sobretudo da Síria e do Iraque.
A reviravolta se deu com o anúncio do ministro alemão do Interior, Thomas de Maizière, neste domingo, de que o país estava reinstituindo em caráter provisório os controles de fronteira, a fim de ganhar "mais tempo e uma certa dose de ordem" diante da crise migratória.
Antes, o afluxo de milhares de refugiados, vindos da vizinha Áustria, suscitara protestos de Munique de que a municipalidade batera no limite de suas capacidades de acolhimento.
UE não vê conflito com Schengen
O secretário do Interior da Baviera, Joachim Herrmann, confirmou que inicialmente a restrição só se aplica à fronteira austro-alemã e que "no momento os controles são por tempo indeterminado". Caso se percebam "movimentos de desvio" na onda de migrantes, se considerará monitorar também outras fronteiras.
A Comissão Europeia declarou em princípio não ver motivo para críticas à iniciativa de Berlim. Sua primeira impressão é de que a situação na Alemanha está em conformidade com as regras do código de fronteiras de Schengen.
Na tarde desta segunda-feira, os ministros do Interior da União Europeia realizam uma reunião extraordinária para discutir a crise migratória. O chefe da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, pleiteia a redistribuição, pelos demais Estados da UE, dos 120 mil refugiados atualmente na Grécia, Itália e Hungria.
Aplausos dos países do Leste
Seguindo o "exemplo" da Alemanha, a República Tcheca anunciou que também pretende endurecer a segurança em sua fronteira com a Áustria. Segundo o ministro do Interior Milan Chovanec, depois que Berlim reinstituiu os controles, seu país, é "agora a única passagem" para os refugiados.
O primeiro-ministro tcheco, Bohuslav Sobotka, declarou em comunicado que a decisão alemã "podia ser esperada [...] como uma reação às tensões dentro da zona de Schengen, causadas pela crise migratória". Assim como outros ex-Estados comunistas europeus, a República Tcheca se opõe com veemência a aplicação de quotas compulsórias para acolhimento de refugiados.
Seu homólogo húngaro, Viktor Orbán, disse ao tabloide Bild: "Temos grande compreensão pela decisão da Alemanha e declaramos nossa solidariedade integral." Percebe-se que "essa decisão foi necessária, a fim de defender os elevados valores do país e da Europa", prosseguiu o direitista. "Naturalmente estamos prontos a toda forma de cooperação."
País situado nos limites externos da União Europeia, a Hungria tem sido acusada de tratamento desumano para com os refugiados, além de ter adotado medidas jurídicas severas para coibir a onda migratória, como a punição com até três anos de prisão para os imigrantes ilegais.
A Polônia, em contrapartida, declarou-se disposta a aceitar mais imigrantes se a UE reforçar suas fronteiras externas; separar os que precisam de ajuda dos migrantes por motivos econômicos; e permitir que Varsóvia opine no processo de triagem, do ponto de vista de segurança.
"Se certas condições forem cumpridas, estamos prontos a mostrar mais solidariedade do que agora", assegurou o vice-ministro do Exterior Rafal Trzaskowski no site de notícias TVN24.pl. O parlamento polonês debaterá a crise em sessão extraordinária na próxima quarta-feira.
O Alto Comissariado da ONU para Refugiados (Acnur) alertou que a União Europeia deve evitar se fragmentar numa colcha de retalhos com distintas regras de imigração, pois isso precipitaria milhares de refugiados num "limbo legal".
Na Alemanha, parte da oposição condenou duramente a retomada dos controles de fronteira. Para o chefe da bancada do A Esquerda no Parlamento, Gregor Gysi: "Fronteiras podem ser fechadas, mas não é assim que se resolvem problemas. É mais do que hora de combater as causas do êxodo com a maior rapidez e eficácia possíveis." O líder dos esquerdistas, Bernd Riexinger, atestou "egoísmo inconcebível" ao governo alemão.
Em entrevista ao jornal Huffington Post, Simone Peter, copresidente do Partido Verde, apontou o fracasso de Berlim na política de asilo. "Novos controles de fronteira e um curso nacional de haraquiri são o exato oposto de uma urgentemente necessária, nova, humanitária política para refugiados na União Europeia."
AV/afp/rtr/dpa