O chocante relato de uma década de abusos em um orfanato de freiras na Escócia
Depoimento de ex-interna relata agressões sexuais, físicas e psicológicas em instituição no centro de um escândalo envolvendo vala comum com centenas de corpos de crianças.
Uma ex-interna de um orfanato pertencente a uma ordem de freiras, a Daughters of Charity, descreveu os abusos sexuais, físicos e mentais que sofreu no estabelecimento, na Escócia.
Theresa Tolmie-McGrane disse à BBC que foi violentada desde os oito anos de idade no Smyllum Park Orphanage, durante a década de 1970. O orfanato foi fechado em 1981.
Por meio de um porta-voz, a ordem diz ter "ficado chocada e entristecida" com as acusações. "Pedimos que qualquer pessoa que se sinta vítima de um crime que entre em contato com a polícia, que a partir dali vai trabalhar com nossa equipe", disse o porta-voz.
"Temos participado de investigações oficiais sobre abuso infantil e continuaremos colaborando com qualquer investigação pelo tempo que for necessário", acrescentou.
"Nós oferecemos nossas sinceras desculpas a qualquer pessoa que tenha sofrido qualquer forma de abuso em nossas instalações."
Tolmie-McGrane, que atualmente vive na Noruega e trabalha com psicóloga, chegou ao orfanato do sul da Escócia em 1968, quando tinha apenas seis anos.
"As crianças apanhavam, eram trancadas em quartos escuros e até forçadas a comer o próprio vômito. A maioria de nós teve as bocas lavadas com sabão", contou ao programa BBC Stories.
Abusos
Ela relata que, aos oito anos, foi vítima de abusos sexuais por um padre.
"Eu trabalhava limpando o bancos na igreja e esse padre chegava cedo e me pedia para ir para uma sala com ele. Lá, me sentava em seu colo e pedia que eu o acariciasse. Ele tentou me acariciar, mas eu me afastei."
Ela diz que, em determinada ocasião, uma das freiras flagrou a situação.
"Mas em vez de ficar zangada com ele, ela me puxou violentamente pelo braço e me atirou no chão. E me chamou de prostituta."
"Eu nem percebi, mas ela quebrou meu braço. De certa forma, isso foi pior que o abuso sexual, porque fui punida com uma fratura por causa de algo que um padre me forçou a fazer."
Segundo Tolmie-McGrane, os abusos foram desde castigos físicos - pancadas na cabeça com um crucifixo de madeira - a ataques psicológicos.
"Uma das freiras fez de tudo para sabotar minha vida acadêmica. Nunca conheci alguém que tentou destruir uma pessoa de forma tão sistemática. Mas, graças a Deus, ela não teve sucesso."
Ela deixou o orfanato apenas aos 17 anos, quando foi estudar na Universidade de Glasgow.
Investigação
O depoimento de Tolmie-McGrane é parte de uma investigação da BBC e do jornal escocês Sunday Post, que descobriu a existência de uma vala comum no terreno do orfanato. É possível que lá estejam os restos mortais de pelo menos 400 crianças.
Na última terça-feira, o Ministério Público disse não haver evidência de uma correlação entre a vala e possíveis crimes cometidos no orfanato. Isso porque as crianças foram enterradas entre 1864 e 1981.
O orfanato recebeu 11 mil crianças nos 117 anos em que permaneceu aberto. Segundo os atestados de óbito, a maioria das crianças morreu de causas naturais, incluindo doenças comuns nessa época, como tuberculose, pneumonia e pleurisia.