O que aconteceu na Suécia? A resposta do país escandinavo aos comentários de Trump
"Mas afinal, o que aconteceu na Suécia?" é uma pergunta que muitos ouviram ou leram - ou ainda estão lendo e ouvindo - nas mídias sociais de vários cantos do mundo, graças ao presidente americano, Donald Trump.
Durante um comício na noite de sábado, em um momento em que falava sobre supostos riscos de se abrir as fronteiras de um país, Trump citou um suposto incidente no país escandinavo, causando surpresa e confusão - em especial na própria Suécia.
"Olhem o que está acontecendo na Alemanha, olhem o que aconteceu ontem à noite na Suécia. Suécia, quem iria acreditar nisso (...) Eles estão tendo problemas como nunca antes pensaram que seria possível", disse o presidente americano a uma multidão de partidários na Flórida, nos Estados Unidos.
De início, não ficou muito claro a qual incidente ele se referia, como muitos destacaram no Twitter, entre eles um ex-primeiro ministro sueco, Carl Bildt.
"Suécia? Ataque terrorista? O que ele tem fumado? As perguntas são muitas", disse Bildt.
Muitos contactaram a conta oficial da Suécia no Twitter, @Sweden, coordenada por um cidadão sueco diferente a cada semana, e perguntaram: "O que aconteceu na Suécia ontem à noite?". E coube a Emma, bibliotecária de uma escola, acalmar os ânimos de pessoas do mundo inteiro.
"Não. Não aconteceu nada aqui na Suécia. Não ocorreu nenhum ataque terrorista aqui. A principal notícia agora é sobre Melfest", escreveu Emma.
Melfest é uma competição musical que seleciona o representante sueco para o Eurovision Song Contest, uma tradicional e conhecida competição musical de países europeus que sempre ocorre em maio.
"Fui dormir por volta das 4h da madrugada. Quando minha filha me acordou, às 7h, nestas três horas, já havia mais de 800 menções... Normalmente, seriam cem", disse Emma à BBC no domingo, referindo-se ao número de comentários no Twitter após o discurso do presidente Trump.
Pedido de esclarecimento
O hashtag #lastnightinSweden (ontem à noite na Suécia) se tornou viral no Twitter, e a Embaixada sueca em Washington pediu um esclarecimento ao Departamento de Estado americano.
Os comentários de Donald Trump ocorreram apenas semanas após uma de suas principais assessoras, Kellyanne Conway, citar "o massacre de Bowling Green", outro evento que não existiu.
Mas voltando à pergunta inicial: afinal, o que aconteceu na Suécia na sexta-feira?
Pelo visto, não houve ataque extremista algum. O site de notícias sueco Aftonbladet resumiu os acontecimentos do dia, que incluíram:
- Um homem ateou fogo em si mesmo numa praça no centro de Estocolmo.
- O famoso cantor Owe Thornqvist teve problemas técnicos nos ensaios para o Melfest.
- Um homem morreu em um acidente de trabalho.
- Estradas foram fechadas no norte da Suécia devido às condições climáticas.
- Um carro de polícia perseguiu um suspeito bêbado no centro de Estocolmo.
Será que Trump se referia a outra coisa?
No domingo, Trump escreveu um tuíte para esclarecer que seu comentário se referia a uma reportagem, veiculada em um programa do canal americano Fox News na sexta-feira à noite, sobre o suposto aumento da violência na Suécia por causa da entrada maciça de imigrantes no país desde 2013.
Na reportagem, há uma entrevista com a produtora do documentário, Ami Horowitz, que diz: "Houve um aumento da violência armada e do número de estupros na Suécia desde que começou a política de portas abertas".
É sabido que a Fox News é um dos canais de TV a cabo favoritos de Trump.
Qual é a política de refugiados na Suécia?
A Suécia, com uma população de 9,5 milhões de habitantes, recebeu quase 200 mil refugiados e imigrantes nos últimos anos, maior número per capita que qualque outro país europeu.
O país observou um substancial aumento nas solicitações de asilo em 2015, e mais de 160 mil pessoas entraram no país esse ano. Com isso, houve sinais de tensão no país, como ataques isolados contra imigrantes e manifestações pró e contra a entrada de refugiados.
Em janeiro de 2016, o assassinato de uma mulher de 22 anos por um solicitante de asilo no centro em que ela trabalhava pressionou ainda mais o governo para reavaliar o tratamento dado a refugiados.
Houve uma queda no número da entrada de imigrantes no ano passado depois que o país endureceu a concessão de asilo e passou a oferecer incentivos financeiros a imigrantes que voltassem voluntariamente a seu país de origem.
A Suécia é considerada um país seguro. As estatísticas preliminares da pesquisa nacional sobre criminalidade mostram apenas um aumento marginal na taxas de violência em 2016 com relação ao ano anterior.
Fraudes e crimes menores contra indivíduos aumentaram, mas delitos envolvendo drogas e roubos diminuíram.
As denúncias de estupro aumentaram 13%, ainda que este índice ainda seja inferior ao registrado em 2014 (6.700), segundo informações do site The Local.
E os ataques terroristas?
Oficialmente, não há ataques terroristas na Suécia desde a introdução, em 2013, da política de portas abertas do país.
"A verdadeira mensagem sueca: 200 mil refugiados, sem ataques terroristas", disse o historiador britânico Simon Schama.
Em 2010, duas bombas foram detonadas no centro de Estocolmo, matando o responsável pelo ataque, um homem sueco nascido no Iraque, e ferindo outros dois, no que a polícia descreveu como ataque terrorista.
Em outubro de 2015, um homem mascarado, supostamente simpatizante da extrema-direita, matou um professor e um aluno com uma espada.
Por outro lado, acredita-se que a Suécia tenha o maior número de combatentes do Estado Islâmico per capita da Europa. Cerca de 140 dos 300 que foram à Síria e Iraque retornaram, e o país estuda e melhor forma de reintegrá-los à sociedade.