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Papa Francisco

Aliado de sindicalistas na ditadura, D. Cláudio participa de seu 2º conclave

Hoje com 78 anos, arcebispo emérito de São Paulo chegou a ser apontado como um dos possíveis substitutos de João Paulo II em 2005

1 mar 2013 - 16h59
(atualizado às 16h59)
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Dom Cláudio atualmente é vigário-geral da Arquidiocese de São Paulo
Dom Cláudio atualmente é vigário-geral da Arquidiocese de São Paulo
Foto: AFP

Em 2005, após a morte de João Paulo II, o brasileiro Dom Cláudio Hummes era apontado como um dos principais candidatos a substituí-lo no comando da Igreja Católica. Credenciado por seu trabalho à frente da Arquidiocese de São Paulo, considerada uma das maiores do mundo, o cardeal acabou preterido pelo alemão Joseph Ratzinger, que, ao tornar-se papa, recebeu o nome de Bento XVI. Oito anos depois, diante da renúncia do agora Papa emérito, Dom Cláudio vê a idade avançada reduzir suas chances de se tornar o Sumo Pontífice.

Nascido em 8 de agosto de 1934 em Salvador do Sul, município gaúcho que, à época, ainda pertencia a Montenegro, Auri Afonso Hummes (nome de batismo de Dom Cláudio) é o terceiro filho de uma família de 13 irmãos, de origem alemã. Após estudar em seminários e concluir a graduação em Filosofia em Garibaldi (RS), Hummes decidiu seguir a vocação religiosa. Em 1952, ingressou na Ordem Franciscana dos Frades Menores, em Divinópolis (MG), adotando o nome Cláudio quatro anos depois. Em 1958, concluiu a graduação em Teologia e foi, enfim, ordenado padre.

Contemporâneo de Dom Cláudio na diocese de Divinópolis, Frei Ronaldo Zwinkels lembra-se da aplicação do colega nos estudos. "Era muito inteligente. Ele era muito consciente também de sua inteligência, um dos mais novos da turma e gostava de fazer intervenções na sala de aula", afirma o padre. Segundo Frei Ronaldo, o cardeal tinha um temperamento retraído, e dedicava boa parte das poucas horas vagas à música. "Era muito zeloso, focado nos estudos. Não tão recreativo, digamos assim. Era consciente de suas obrigações. Ele era músico, tocava muito bem violão. Ele tinha um conjunto musical, formado com outros colegas", relembra Frei Ronaldo.

Após lecionar no seminário de Garibaldi e na Faculdade de Filosofia de Viamão (RS), Dom Cláudio foi professor nos cursos de Ciências da Religião e Filosofia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), no início da década de 70. Então diretor do departamento de Teologia da universidade, o monsenhor Urbano Zilles corrobora a opinião de Frei Ronaldo. "Ele era, de fato, muito estudioso. As aulas dele agradavam aos alunos, nunca tinha queixa. Era um franciscano de fácil convivência, sempre bem disposto, sem grandes problemas", relatou. Segundo o monsenhor, Dom Cláudio sempre se destacou por "falar de problemas contemporâneos". "Era um homem atualizado."

Defesa dos trabalhadores e resistência à ditadura

Dom Cláudio começou a ganhar destaque nacional a partir de 1975, ao tornar-se bispo de Santo André, no ABC paulista, onde crescia o movimento sindicalista liderado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Após os metalúrgicos do ABC declararem greve em 1979, o regime militar considerou a mobilização ilegal e determinou a intervenção no sindicato. Mesmo que o governo proibisse as assembleias sindicais, Dom Cláudio abriu as portas da igreja matriz de São Bernardo do Campo para que os trabalhadores pudessem se reunir.

"Alguns fiéis se escandalizaram: 'estão profanando o templo'. Padre Adelino De Carli, o vigário, retrucou: 'de que vale prestar culto a Deus e dar as costas a quem luta pelo pão da vida?'", relembra o escritor Carlos Alberto Libânio Christo, o Frei Betto, um dos articuladores da Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) e amigo pessoal de Lula, em artigo publicado em 2002 no jornal O Globo.

Em foto de 2006, Dom Cláudio (dir.), então Arcebispo de São Paulo, recebe a visita do Dalai Lama, líder espiritual tibetano
Em foto de 2006, Dom Cláudio (dir.), então Arcebispo de São Paulo, recebe a visita do Dalai Lama, líder espiritual tibetano
Foto: AFP

Ao interceder em defesa dos trabalhadores, Dom Cláudio ganhou a admiração de setores da esquerda e a simpatia de Lula, de quem desfruta a amizade até os dias de hoje. Em 2005, após o então arcebispo do Rio de Janeiro, Dom Eusébio Scheid, declarar que o petista era mais "caótico" do que "católico", Dom Cláudio saiu em defesa de Lula. "Para mim, ele é católico, um católico como todos os outros católicos do Brasil. Aliás, não todos, porque os católicos são diferenciados nas suas práticas. Eu o considero como católico mesmo", garantiu. "Lula é cristão a seu modo, católico a seu modo. (...) Ele tem comungado mais vezes comigo; eu tenho dado a comunhão para ele", afirmou, em outra oportunidade.

Para Frei Betto, Dom Cláudio teve relação "exemplar" com o movimento sindicalista da década de 70. "(Dom Cláudio) apoiou o movimento sindical, recusou o pedido da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) de servir de intermediário entre o capital e o trabalho, abriu as igrejas do ABC às assembleias operárias depois que o sindicato foi ocupado pela polícia", lembra o escritor, em entrevista ao Terra. "Foi sempre um bispo sensível às questões operárias, ao mundo do trabalho, dentro da linha de opção pelos pobres."

A confiança dos sindicalistas em Dom Cláudio era tamanha que foi ele a primeira pessoa para quem Frei Betto ligou quando Lula foi preso pelo regime militar, em 1980. "Eu estava na casa do Lula, como amigo e segurança improvisado, na manhã em que ele foi preso. Liguei para Dom Cláudio, que, imediatamente, agiu em defesa de Lula e dos sindicalistas presos", afirmou Frei Betto.

O desafio na arquidiocese

Dom Cláudio permaneceu à frente da Diocese de Santo André até julho de 1996, quando foi nomeado arcebispo de Fortaleza (CE). Em menos de dois anos, assumiu seu maior desafio até então, ao tomar posse como arcebispo de São Paulo em maio de 1998.

Dom Cláudio enfrentou sérios problemas estruturais que ameaçavam a Catedral da Sé, que teve de ser fechada para restauração logo em seu segundo ano à frente da arquidiocese. Antes da reforma, as aberturas de acesso à catedral deixavam que a água das chuvas entrasse em sua estrutura, acelerando o processo de deterioração do prédio inaugurado na década de 50. Em 2002, a igreja foi finalmente reaberta, em uma missa celebrada por Dom Cláudio, diante de 5 mil pessoas.

Classificando a reforma da catedral como um momento delicado para Dom Cláudio, o diretor da Faculdade de Teologia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), padre Valeriano dos Santos Costa, faz um balanço positivo de sua passagem pela Sé. "É uma pessoa muito competente, muito respeitada e séria. Aqui em São Paulo ele teve uma atividade muito boa, muito positiva. Ele teve um momento difícil. Por exemplo, ele conseguiu reformar a Catedral da Sé, que estava à beira da interdição", analisou.

Destaque no Vaticano

Nomeado cardeal em 2001, Dom Cláudio teve direito a voto na escolha do sucessor de João Paulo II e chegou a ser apontado como um dos favoritos no conclave após a morte do Papa, em 2005. Apesar de progressista nas questões sociais, o cardeal é conservador quanto aos dogmas católicos, tendo livre trânsito em diferentes setores da Igreja. Assim como hoje, discutia-se na época a possibilidade de escolha de um papa não europeu, especialmente um latino-americano, região que concentra boa parte dos católicos no mundo. Os prognósticos favoráveis, porém, não se confirmaram e o escolhido foi Bento XVI, um alemão de perfil conservador.

O próprio Bento XVI reconheceu a importância de Dom Cláudio na Igreja, ao nomeá-lo em 2006 prefeito da Congregação para o Clero, um dos principais postos do Vaticano, responsável por supervisionar a atividade de padres em todo o mundo. Em 2010, porém, teve de renunciar, ao atingir a idade limite de 75 anos. De volta ao Brasil, tornou-se vigário-geral da Arquidiocese de São Paulo e membro da Pontifícia Comissão para a América Latina.

Hoje, aos 78 anos, Dom Cláudio tem teoricamente poucas chances concretas de se tornar papa, em um momento em que o Sumo Pontífice deixa o posto justamente por não conseguir superar os problemas de saúde provenientes da idade avançada. "Acredito que ele não seja mais candidato, pelo seguinte: ele está com seus 78, 79 anos. E se o Papa agora vai abdicar por causa da idade, a tendência vai ser de um cardeal de mais vigor", afirma o ex-colega Frei Ronaldo.

Fonte: Terra
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