França aprova lei que dificulta imigração; entenda o que muda
Grupos de direitos humanos denunciaram legislação como a mais retrógrada em décadas.
O Parlamento francês aprovou uma nova legislação que endurece a política de imigração do país, após meses de disputas políticas.
Um elemento-chave da lei é que os benefícios sociais para estrangeiros estarão agora condicionados a cinco anos de presença em França, ou 30 meses para aqueles que têm emprego.
As cotas de migração também podem agora ser acordadas e existem medidas para que condenados com dupla nacionalidade também sejam privados da nacionalidade francesa.
Estrangeiros que moram na França e querem trazer familiares para viver com eles também serão afetados pelas novas regras — isso só será possível se viverem há pelo menos 24 meses em território francês, em comparação com os 18 anteriores, e terem pelo menos 21 anos.
Além disso, a lei ratifica o fim do chamado direito de solo (jus solis). Até agora, as pessoas nascidas em França de pais estrangeiros obtinham automaticamente a nacionalidade francesa ao atingirem a maioridade.
A partir de agora, terão que "manifestar a vontade" entre os 16 e os 18 anos.
A legislação foi apoiada pelo partido de centro Renascimento, do presidente Emmanuel Macron, e pelo de direita radical Reagrupamento Nacional, de Marine Le Pen.
A votação dividiu o partido de Macron e o ministro da Saúde, Aurélien Rousseau, anunciou que iria renunciar diante da posição do governo.
Já os partidos de esquerda acusaram Macron de fazer concessões à direita radical.
Um projeto anterior havia sido rejeitado pelo Parlamento na semana passada, rechaçado tanto pelo Reagrupamento Nacional, como pela esquerda.
Em resposta, o governo reformulou o projeto de lei, tornando algumas das suas disposições mais rigorosas.
A versão mais dura apelou aos partidos de direita, que apoiaram a proposta na votação desta segunda-feira (20/12).
Le Pen saudou o projeto de lei alterado, e o classificou como "vitória ideológica" para a direita radical.
"Este é o nosso projeto de lei", disse Eric Ciotti, líder do Partido Republicano, de direita. Ele classificou a medida como "firme e corajosa".
Mas membros da esquerda acusaram Macron de ajudar a direita radical.
"A história se lembrará daqueles que traíram as suas convicções", disse o líder do Partido Socialista, Olivier Faure.
Os líderes de pelo menos duas regiões do país controladas pela esquerda, Seine-Saint-Denis e Lot, disseram que se recusariam a implementar as determinações da lei sobre benefícios sociais para não-cidadãos.
Racha interno
A nova legislação francesa expôs divisões dentro da aliança governamental.
Ao todo, 27 deputados votaram contra e 32 se abstiveram — ou quase um quarto dos deputados pró-Macron.
O ministro da Saúde, Aurélien Rousseau, que foi membro do Partido Comunista na sua juventude, renunciou ao cargo em protesto contra a lei de imigração.
Vários outros ministros também parecem estar prestes a renunciar.
"Algumas medidas do projeto de lei me deixam muito desconfortável", disse Yaël Braun-Pivet, presidente da Câmara Baixa do Parlamento e membro do partido de Macron.
O projeto de lei teria sido aprovado se o partido de Le Pen tivesse escolhido se abster, mas não se tivesse votado contra.
O governo usou a sua ampla maioria no Parlamento para argumentar que não dependia dos votos do Reagrupamento Nacional.
Após a votação, a primeiro-ministra Élisabeth Borne aceitou que algumas medidas da lei podem não ser constitucionais.
"Vamos perguntar ao Conselho Constitucional", disse ela à rádio francesa, se referindo ao tribunal superior que defende os princípios da Constituição.
Grupos de direitos humanos denunciaram a nova reforma como a lei de imigração mais retrógrada em décadas.
O partido de Macron perdeu a maioria no Parlamento nas eleições de junho de 2022.
Desde então, o governo se viu frequentemente incapaz de ganhar votos no Parlamento.
Acordo da UE sobre asilo
A votação francesa ocorreu horas antes de um acordo da União Europeia (UE) para reformar o sistema de asilo nos 27 Estados-membros do bloco.
O novo pacto, acordado pelos governos da UE e pelos membros do Parlamento Europeu, inclui a criação de centros de detenção fronteiriços e a possibilidade de uma deportação mais rápida de requerentes de asilo rejeitados.
Aclamado como um acordo histórico pela presidente do Parlamento, a maltesa Roberta Metsola, o novo sistema permite que os requerentes de asilo sejam transferidos dos Estados-Membros do Sul, que registram o maior número de chegadas, para outros países.
O texto final ainda precisa ser formalmente aprovado pelo Parlamento e pelos Estados-membros.