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Haile Selassie: imperador que virou 'deus' Rastafari ganha estátua na Etiópia

A União Africana exibe estátua de Haile Selassie, o último imperador da Etiópia e um deus para Bob Marley e milhares de outros jamaicanos.

11 fev 2019 - 18h33
(atualizado às 18h49)
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Estátua foi exibida na abertura anual da conferência da União Africana
Estátua foi exibida na abertura anual da conferência da União Africana
Foto: BBC News Brasil

Uma estátua do último imperador da Etiópia foi inaugurada do lado de fora da sede da União Africana em Adis Abeba, capital etíope, no domingo.

A imagem de Haile Selassie ganhou um lugar de destaque ao lado do prédio de US$ 200 milhões em reconhecimento ao seu papel no estabelecimento da instituição antecessora, a Organização da Unidade Africana (OAU, na sigla em inglês). Ambas tinham como objetivo promover a integração entre os países do continente africano.

Isso, no entanto, pode não ser a primeira coisa que vem à mente ao ouvir o nome de Haile. Ele é mais facilmente identificado por sua ligação com o cantor jamaicano Bob Marley e os rastafaris.

Selassie é adorado como um deus por pessoas que moram a milhares de quilômetros de distância. Mas por quê?

A estátua

Comecemos pela homenagem ao imperador. Selassie estava há mais de 30 anos no poder quando ajudou a estabelecer a OUA. A primeira reunião da organização, em maio de 1963, aconteceu em Adis Abeba.

A Etiópia - que nunca foi colonizada, embora tenha sido submetida a uma ocupação militar de cinco anos pela Itália de Mussolini - serviu como símbolo da independência africana durante todo o período colonial.

Nos anos 1960, outros países estavam finalmente ganhando independência, e essa era uma chance de unir as nações para lutar contra a colonização e o domínio da minoria branca, enquanto também coordenavam esforços para elevar seus padrões de vida e defender sua soberania.

"Que esta convenção de união dure 1.000 anos", disse Haile Selassie, que passou um ano preparando a cidade para a reunião.

Haile Selassie foi o último imperador da Etiópia e seu reinado dividiu opiniões
Haile Selassie foi o último imperador da Etiópia e seu reinado dividiu opiniões
Foto: BBC News Brasil

A OUA deixou de existir em sua forma original em 2002, substituída pela União Africana (UA).

No entanto, o papel do imperador na união das nações africanas não foi esquecido.

De imperador a deus

Tudo se resume a sua coroação em 1930 e a uma "profecia" feita por Marcus Garvey, um ativista jamaicano dos direitos dos negros, uma década antes.

Garvey disse a seus seguidores em 1920 que eles deveriam "olhar para a África, quando um rei negro seria coroado, pois o dia da libertação está próximo".

Rastafaris acreditavam que Haile Selassie era o messias, uma encarnação de Jah
Rastafaris acreditavam que Haile Selassie era o messias, uma encarnação de Jah
Foto: AFP / BBC News Brasil

Então, quando um negro chamado Ras Tafari foi coroado na Etiópia, muitos viram isso como um sinal, como a profecia se tornando realidade.

Na África Oriental, Ras Tafari ("chefe" Tafari) tornou-se Haile Selassie. A quase 13.000 quilômetros de distância, Haile Selassie tornou-se deus (ou Jah) encarnado - o messias redentor - e a Etiópia, a terra prometida.

Em suma, o movimento Rastafari nasceu.

Haile Selassie acreditava nesse mito? Ele certamente não tentou dissipar a crença quando visitou a Jamaica em 1966. O imperador foi recebido por milhares de pessoas, que estavam desesperadas para ver seu deus. Entre os devotos estava a esposa de um jovem músico de reggae, Bob Marley, que na época estava nos Estados Unidos.

Rita Marley descreveria mais tarde como ela viu marcas de unhas na palma da mão de Haile Selassie enquanto ele acenava para ela. Foi um momento de despertar religioso e, quando o marido voltou, ambos abraçaram a crença.

Três anos antes, os rastafaris começaram a se mudar para a Etiópia e para um pedaço de terra que Haile Selassie havia reservado para os negros do Ocidente em 1948. Após a visita do imperador à Jamaica, os números cresceram. Hoje, a comunidade conta com cerca de 300 pessoas.

Mas seus seguidores foram presenteados com um enigma depois que Haile Selassie morreu em 1975, um ano depois de ter sido deposto em uma revolução marxista. Afinal de contas, os deuses não podem morrer.

Isso foi resolvido depois que se argumentou que o corpo de Haile Selassie era apenas seu corpo terreno.

Além disso, é importante ressaltar que Garvey, o autor da profecia, nunca foi um fiel do etíope. Na verdade, ele era um crítico de Haile Selassie.

Como ele era realmente?

Não há uma opinião única sobre se Haile Selassie foi bom ou ruim para a Etiópia.

Um relatório da Human Rights Watch o acusa de agir com "indiferença oficial" à fome em várias regiões do país e de tentar esconder a crise alimentar de 1972, na qual cerca de 200 mil pessoas morreram.

Ele também é conhecido por ter reprimido violentamente pessoas que se opunham a seu império.

Haile Selassie ao lado do ex-presidente de Gana Kwame Nkrumah, outro fundador da União Africana
Haile Selassie ao lado do ex-presidente de Gana Kwame Nkrumah, outro fundador da União Africana
Foto: AFP / BBC News Brasil

Marcus Garvey não ficou impressionado com o imperador quando fugiu da Etiópia em 1936, após a invasão das tropas de Mussolini. Ele descreveu Selassie como um "covarde", criticando-o pelos "horrores da escravidão". A prática não foi proibida na Etiópia até 1942.

A acadêmica Yohannes Woldemariam chegou a argumentar que Selassie deveria ser lembrado como um ditador. De fato, ele criou uma constituição que colocou todo o poder em suas mãos e nas de seus descendentes.

Muitos eritreus também o detestam, apontando que seu país foi anexado pela Etiópia sob o governo de Selassie em 1962, dando impulso a uma luta pela independência que terminou em 1993.

Mas os defensores de Seleassie argumentam que ele era um grande líder e um modernizador, que foi um dos primeiros líderes africanos a se tornar uma referência no cenário global.

Seu apelo à Liga das Nações depois que seu país foi invadido por Mussolini ainda é lembrado - até porque é a base de uma música de Bob Marley de 1976, War.

E - como a estátua da UA lembra - ele foi um grande defensor da cooperação pan-africana, deixando um legado que continua a afetar a vida de milhões de pessoas em todo o continente.

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