Israel e Líbano trocam acusações de violações do cessar-fogo
Incidentes expõem vulnerabilidade da trégua arduamente negociada que visa pôr fim aos combates no sul libanês
Forças israelenses e o grupo islamista Hezbollah se acusaram mutuamente nesta quinta-feira (28/11) de violações do cessar-fogo iniciado no dia anterior, após 14 meses de violentos confrontos ao longo da fronteira entre Israel e Líbano.
Autoridades libanesas relataram incidentes esparsos no sul do país com ataques de morteiros e bombardeios. Tiros disparados por soldados israelenses feriram duas pessoas que tentavam retornar ao sul do Líbano.
A imprensa estatal libanesa disse que os feridos eram civis, enquanto o Exército de Israel os descreveu como pessoas suspeitas de violar os termos do cessar-fogo. A mídia local relatou que disparos realizados por tanques israelenses atingiram vilarejos e fazendas no sul do país, sem causar vítimas.
Os episódios de violência refletem a fragilidade do cessar-fogo que, ainda assim, pareceu se manter durante esta quinta-feira, enquanto tropas libanesas começavam a se posicionar em partes do sul do país, no leste do Vale do Bekaa e nos subúrbios ao sul de Beirute.
Obstáculos ao retorno dos civis
O Exército libanês informou a montagem de postos de controle temporários e ações para explodir munições não detonadas na esperança de ajudar os civis desabrigados a retornarem para suas casas.
Cerca de 1,2 milhão de pessoas deixaram seus locais de residência no Líbano desde o início do conflito. Após a implementação do cessar-fogo, milhares de pessoas começaram retornar para suas casas nas regiões devastadas pela guerra.
Ainda assim, essa movimentação enfrenta algumas limitações. Os militares libaneses e israelenses ordenaram que os civis de comunidades próximas à fronteira entre os dois países se mantivessem afastados das áreas onde tropas israelenses ainda estão posicionadas.
O Exército libanês acusou Israel de romper o cessar-fogo diversas vezes nesta quinta-feira ao conduzir ataques e patrulhar o espaço aéreo do país com drones e caças. Os militares libaneses disseram que acompanharam as violações "em coordenação com as autoridades relevantes", sem fornecer maiores informações.
O Hezbollah não mencionou diretamente o cessar-fogo, mas destacou em nota divulgada na noite de quarta-feira que seus combatentes "permanecem totalmente equipados para lidar com as aspirações e ataques do inimigo israelense".
O parlamentar do grupo xiita Hassan Fadlallah reconheceu os incidentes desta quinta-feira."O inimigo israelense está atacando os que retornam às comunidades da fronteira", disse Fadlallah. "Há violações de Israel hoje por toda parte."
Ao ser perguntado sobre como o Hezbollah reagiria, ele demonstrou cautela e lembrou que o grupo tem direito à autodefesa, mas, ao mesmo tempo, não deseja "apressar as coisas".
Israel bombardeia depósito de mísseis
Ao mesmo tempo, as forças israelenses também acusaram o Hezbollah de violar diversas vezes a trégua. Soldados israelenses teriam sido mobilizados nas últimas horas para impedir que membros da milícia avançassem para o sul do Líbano.
Israel confirmou a realização de seu primeiro ataque aéreo desde o início da trégua. Seus aviões bombardearam uma instalação do Hezbollah no sul do Líbano onde teriam sido identificadas "atividades terroristas para armazenar mísseis de médio alcance", em violação ao acordo.
O Exército israelense relatou que suas tropas abriram fogo contra "vários suspeitos" que chegaram em veículos a determinadas áreas no sul do Líbano em supostas violações à trégua.
Os israelenses impuseram um toque de recolher noturno para moradores libaneses ao sul do rio Litani, proibindo qualquer movimentação entre as 17h desta quinta-feira até as 7h de sexta-feira, no horário local.
Anunciada na terça-feira à noite, o acordo entre Israel e o Hezbollah, apoiado pelo Irã e intermediado pelos Estados Unidos e França, estabelece um cessar-fogo inicial de dois meses segundo o qual os militantes devem se retirar para o norte do Rio Litani - a cerca de 30 quilômetros da fronteira - e as forças israelenses devem retornar ao seu território.
A zona neutra próxima à fronteira no sul do Líbano é patrulhada por tropas libanesas e forças de paz da ONU. As autoridades em Beirute alertaram os moradores da região a não retornarem a suas casas antes da retirada total dos soldados israelenses da região.
14 meses de conflito
Desde o início das hostilidades entre Israel e o Hezbollah em 8 de outubro de 2023 - dia seguinte aos ataques mortais do Hamas contra Israel, que desencadearam a guerra na Faixa de Gaza -, o saldo no Líbano é de mais de 3.800 mortos e 15,8 mil feridos por ofensivas israelenses.
Cerca de 3.100 dessas mortes ocorreram após 23 de setembro, com o início da campanha de bombardeios em ampla escala por Israel, que atingiu sobretudo comunidades no sul e leste libaneses, bem como o subúrbio muçulmano de Dahieh, no sul de Beirute.
A violência obrigou mais de 1,2 milhão de cidadãos a abandonarem suas casas, dos quais mais da metade migrou para a Síria, segundo o governo libanês. Em Israel, por outro lado, as hostilidades dos últimos 14 meses matou 78, entre os quais 47 civis, e forçou 60 mil a abandonarem seus lares.