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Macri: impeachment não foi golpe e Mercosul estaria melhor sem a Venezuela

29 set 2016 - 07h50
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O presidente da Argentina, Mauricio Macri -
O presidente da Argentina, Mauricio Macri -
Foto: Agência Brasil

O presidente da Argentina, Mauricio Macri, considera que o Mercosul estaria melhor sem a Venezuela, que o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff não foi um golpe e que a parceria com o Brasil está acima das "políticas conjunturais" do momento. Ele manifestou essas opiniões nessa quarta-feira (28), em entrevista a um pequeno grupo de jornais brasileiros -  cinco dias antes de receber o presidente Michel Temer, que viajará para Buenos Aires na próxima segunda-feira (3).

A viagem a Argentina será a primeira visita bilateral de Temer, que como presidente já fez duas viagens ao exterior - à China, para a reunião do G-20 (grupo dos 20 países mais desenvolvidos) e aos Estados Unidos (para a Assembleia Geral das Nações Unidas). Ele chegará a Buenos Aires no fim da manhã, acompanhado de um grupo de ministros, para se reunir com Macri. Depois do almoço, Temer viajará a Assunção, para um encontro com o presidente do Paraguai, Horácio Cartes.

Da agenda, que ainda não foi definida, estão temas que preocupam os três governos: o combate ao narcotráfico e ao contrabando na Tríplice Fronteira, a recuperação econômica regional (depois da queda dos preços das commodities) e o futuro do Mercosul, que hoje vive uma crise institucional.

Mercosul

Três dos quatro fundadores do Mercosul (Argentina, Brasil e Paraguai) questionam a permanência da Venezuela no bloco regional, alegando que o país não cumpriu os requisitos necessários no prazo estipulado (meados de agosto) para ser considerado membro pleno. Entre os vários acordos a serem incorporados, está um  protocolo de defesa da democracia.

O Uruguai (por questões políticas internas) manteve-se neutro, mas assinou o documento, impedindo o governo venezuelano de assumir a presidência pro-tempore do Mercosul no final de junho (que é rotativa e muda a cada seis meses , de acordo com ordem alfabética).  Ate dezembro, o bloco será administrado por um colegiado dos quatro membros fundadores. Se a Venezuela não cumprir suas obrigações até lá, corre o risco de ser suspensa.

"Estou muito preocupado (com a Venezuela)", disse Macri, na entrevista aos jornais brasileiros. Desde a campanha para as eleições presidenciais argentinas e depois de sua posse em dezembro, ele tem criticado o presidente venezuelano Nicolás Maduro, por considerar que estava violando os direitos humanos ao prender líderes opositores, acusados de conspirar contra o governo ou de estimular a violência. "Sinto que o governo de Maduro radicaliza a sua posição, em vez de gerar uma abertura para o diálogo", disse.

Em relação à permanência da Venezuela no Mercosul, ele foi mais enfático que a ministra das Relações Exteriores da Argentina, Susana Malcorra - candidata a ocupar a Secretaria Geral das Nações Unidas. "Na minha opinião, a entrada da Venezuela não foi um acréscimo positivo ao Mercosul", disse Macri. Segundo ele, o bloco regional teria avançado mais "sem a Venezuela de hoje".

Além de citar o "colapso econômico"  venezuelano (marcado por uma inflação anual de três dígitos e desabastecimento), Macri considera que o país "não respeita as normas democráticas" . Ele afirmou que, se o país não se adequar às normas do Mercosul até o dia 1º de dezembro, "deverá deixar de fazer parte" do bloco regional. 

Dezembro é um mês crucial para o presidente venezuelano, em termos de política interna: a oposição, que há nove meses conquistou maioria parlamentar pela primeira vez em 17 anos, está reunindo assinaturas para um referendo revogatório - mecanismo constitucional que permite destituir Maduro antes do fim de seu mandato, em 2019. Os oposicionistas acusam a Justiça Eleitoral de tomar partido do governo e fazer tudo para atrasar o processo. Se Maduro for destituído nas urnas este ano, os venezuelanos terão direito a novas eleições presidenciais. Mas se ele for derrotado em 2017, seu vice assumirá a presidência.

Impeachment

Em relação ao impeachment no Brasil, Macri disse que a "continuidade política" foi respeitada, assim como os procedimentos jurídicos e constitucionais.  "Hoje, (o Brasil) é governado pelo vice-presidente da chapa do PT, que ganhou as últimas eleições (presidenciais)", lembrou. Mas, segundo ele, "Argentina e Brasil" estão acima das conjunturas políticas do momento.

Macri lembrou ainda que mal assumiu a presidência argentina, viajou ao Brasil  para manifestar sua vontade de "trabalhar em conjunto" com o seu maior parceiro comercial - mesmo tendo menos "afinidades políticas" com a então presidente Dilma Rousseff, que apoiou "de forma explícita" Daniel Scioli, candidato da ex-presidente Cristina Kirchner e seu principal rival nas eleições argentinas. 

O presidente argentino afirmou que não considera o impeachment de Dilma um golpe - apesar de saber que tanto no Brasil, quanto no exterior, existem interpretações divergentes. Segundo ele, todo os passos constitucionais foram cumpridos, pelos poderes Judicário e Legislativo.

Crise

Temer e Macri vão se encontrar NO momento em que os dois países - principais sócios do Mercosul - atravessam uma crise econômica. Nessa quarta-feira, Macri anunciou que "um em cada três argentinos vive abaixo da linha de pobreza", de acordo com pesquisa do órgão governamental Indec (Instituto Nacional de Estatísticas e Censo da Argentina) - o equivalente ao IBGE brasileiro.

Durante os dois mandatos da ex-presidente Cristina Kirchner (2007-2015), o Indec sofreu uma intervenção, que reduziu o índice inflacionário. Oficialmente, o custo de vida subia cerca de 10% ao ano, enquanto que as consultoras privadas anunciavam um aumento três vezes maior - equivalente ao aumento salarial acordado entre o governo e os poderosos sindicatos argentinos.

Ao assumir em dezembro, Macri prometeu reestruturar o Indec, para tornar suas estatísticas mais transparentes. Ao mesmo tempo, se comprometeu a reduzir a pobreza a zero. As primeiras estatísticas de seu governo mostram que 32% dos argentinos vivem na pobreza e 6,3% na indigência. Apesar de ter acabado com controles cambiais e reduzidos impostos, para incentivar o crescimento da economia, o Produto Interno Bruto (PIB) argentino encolheu 5,9% em julho - em comparação com o mesmo mês do ano anterior. Foi a maior retração em 14 anos.

Mauricio Macri reconheceu que as estatísticas mostram uma realidade "dolorosa", difícil de aceitar. Mas disse que, pelo menos agora, é possível ter uma verdadeira dimensão do problema que o país enfrenta - o que facilitaria encontrar soluções. A economia argentina depende em grande parte do desempenho do Brasil, seu principal sócio comercial. Em 2011, no auge do crescimento econômico dos dois países, o intercâmbio bilateral foi de US$ 39 bilhões. Hoje, gira em torno de US$ 26 bilhões - mas os dois países mantêm o compromisso de superar juntos a crise.

Preferência

Apesar de manter cautela em relação às divisões políticas no Brasil e de manifestar seu respeito em relação às escolhas do eleitorado brasileiro, Macri afirmou, na entrevista aos jornais brasileiros,  que - se fosse perguntado - diria que o político que mais admira é o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Os dois se reuniram há pouco, em Buenos Aires.

Agência Brasil Agência Brasil
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