'Mais difícil do que parece': a reação da imprensa internacional à compra do Twitter por Elon Musk
Economist, Wall Street Journal e Financial Times destacaram desafios de moderar conteúdo na plataforma diante do cenário polarizado e repleto de desinformações do mundo atual.
Os principais veículos de imprensa focados em economia repercutiram nesta terça-feira (26/4) a compra do Twitter pelo bilionário Elon Musk, da Tesla, por mais de US$ 44 bilhões. A principal preocupação nos artigos é sobre o futuro da empresa que hoje é vista como uma espécie de "praça pública mundial".
Até recentemente, o Twitter tinha políticas editoriais pouco rígidas, que favoreciam o que alguns consideram liberdade plena de expressão. Mas nos últimos dois anos, diante da polarização das eleições nos Estados Unidos e a difusão em massa de notícias falsas sobre o coronavírus, o Twitter passou a moderar conteúdo, rotular tuítes com informações consideradas falsas e excluir contas de pessoas. O caso mais notório foi o de Donald Trump, que teve sua conta na plataforma suspensa.
A revista britânica The Economist escreve em seu site que Elon Musk "promete tornar a expressão mais livre na internet", mas que "isso é mais difícil do que parece". Em um artigo, The Economist lembra que, no primeiro semestre de 2021, o Twitter removeu 5,9 milhões de tuítes, mais que o dobro dos 1,9 milhão de dois anos antes. No mesmo período, 1,2 milhão de contas foram suspensas, um aumento de 700 mil.
Trump voltará?
"Como Musk pode mudar as coisas? Ele disse que publicará o código do Twitter, incluindo seu algoritmo de recomendação, em uma tentativa de ser mais transparente. Ele propõe autenticar todos os usuários e 'derrotar bots de spam'", escreve a Economist. Musk também disse em uma palestra que prefere suspensões temporárias de contas a banimentos permanentes — o que potencialmente abriria caminho para a volta de Trump.
A revista indica que o bilionário costuma ignorar o senso comum e repercussões negativas de suas ideias — e que ele sequer tem ambições econômicas com o Twitter, que é uma empresa que já enfrenta desafios financeiros antes da aquisição. A ideia que se tem é que o objetivo principal de Musk é implementar suas ideias de liberdade de expressão na plataforma — mudando regras de moderação e banimento.
"Mesmo assim, ele pode descobrir que será mais difícil do que espera acabar com a moderação", escreve o Economist. "Boicotes de anunciantes, que fornecem quase toda a receita do Twitter, podem até não incomodá-lo. Mas o aplicativo do Twitter depende da distribuição pelas lojas de aplicativos da Apple e do Google; ambos suspenderam o aplicativo Parler após a invasão do Capitólio."
Além disso, governos europeus estão aprovando legislações que obrigam empresas de conteúdo online a monitorar mais de perto o que está sendo publicado em suas plataformas.
Moderar ou não moderar?
Em editorial, o Wall Street Journal destacou o tamanho do risco assumido por Musk na compra da empresa.
"A proposta de financiamento que ele anunciou na semana passada inclui US$ 21 bilhões em patrimônio pessoal. Isso equivale a cerca de 10% de seu patrimônio líquido, segundo a estimativa da Forbes. Como garantia da dívida, Musk também colocaria cerca de um terço de sua participação na Tesla. Não é todo dia que o homem mais rico do mundo faz uma aposta assim."
Para ser bem-sucedido com o Twitter, o Wall Street Journal ressalta que é vital para Musk acertar a política de moderação da plataforma.
"Se Musk conseguir um equilíbrio mais satisfatório na moderação de conteúdo, talvez ele esteja certo sobre o valor oculto que existe no Twitter. A gestão atual está correta em identificar que a maioria dos usuários regulares de mídia social não quer um banho diário de bots russos, propaganda jihadista, assédio tóxico e assim por diante. O mesmo vale para os anunciantes, que representam cerca de 90% do faturamento da empresa. No entanto, os todo-poderosos donos da tecnologia do Vale do Silício decidiram que querem ser árbitros do discurso em tópicos políticos como as mudanças climáticas e as origens da covid."
Mas mudanças assim poderiam desagradar os mais progressistas — incluindo os funcionários da empresa, que é sediada em São Francisco, na Califórnia. O jornal especula se Musk faria como fez com a Tesla e levaria o Twitter para o Texas, Estado americano mais conservador.
"O que significa tudo isso na prática? Musk percebe que está entrando em um ninho de marimbondos? A visão dele vai prevalecer? Quem sabe dizer ao certo. Mas será fascinante ver Musk tentar quebrar a cultura de conformidade progressiva do Vale do Silício", conclui o editorial.
Democratas preocupados; republicanos felizes
O Financial Times destacou que a compra do Twitter por Musk desencadeou uma batalha partidária entre democratas e republicanos.
O personagem principal dessa batalha é Donald Trump, segundo o jornal. Trump teria dito que não pretende voltar ao Twitter. Mas analistas democratas acreditam que ele pode mudar de opinião na medida em que o próximo ciclo eleitoral se aproxima nos EUA.
O jornal cita a estrategista democrata Mary Anne Marsh: "Todo mundo deveria se preocupar com isso. Vimos o impacto que Trump conseguiu ter com sua conta no Twitter antes, seja questionando o local de nascimento de Barack Obama ou rejeitando os resultados da última eleição. Imagine o que ele fará para recuperar o poder em 2022 ou 2024, quando não houver ninguém para detê-lo?"
Entre os republicanos, a notícia da compra foi bem recebida, segundo o Financial Times.
Marjorie Taylor Greene, uma parlamentar republicana cuja conta pessoal foi banida após várias violações das regras de desinformação do Twitter, escreveu na sua conta oficial: "Minha conta pessoal do Twitter deve ser restaurada."
"Os conservadores estão entusiasmados com a perspectiva do que Musk apresentou como um Twitter 'amplamente inclusivo', que eles entendem significar menos contas conservadoras sendo fechadas e uma possível oportunidade para o restabelecimento de usuários banidos, como Trump", escreveu o jornal britânico.
"Os republicanos reclamam há anos de censura por grandes plataformas de tecnologia, apontando em particular para a exclusão de Trump do Twitter e do Facebook após o ataque de 6 de janeiro de 2021 ao Capitólio dos EUA."