O que se sabe sobre soldado americano detido após cruzar fronteira da Coreia do Norte
Autoridades dos EUA dizem que militar estava sendo escoltado para fora do país por motivos disciplinares, mas conseguiu sair do aeroporto e se juntar a uma patrulha pela fronteira.
Um soldado dos Estados Unidos está detido na Coreia do Norte depois de cruzar a fronteira sem autorização. A informação foi confirmada por um porta-voz do Pentágono.
"Um membro em serviço dos Estados Unidos em uma viagem de orientação à Área de Segurança Conjunta cruzou a Linha de Demarcação Militar para a República Popular Democrática da Coreia (RPDC) intencionalmente e sem autorização. Acreditamos que ele esteja atualmente sob custódia da RPDC e estamos trabalhando com nossos colegas do Exército Popular da Coreia para resolver este incidente."
O militar americano foi identificado como o soldado raso de 2ª classe Travis King, segundo disseram autoridades à CBS News, parceira da BBC nos Estados Unidos.
Um oficial disse à CBS que o soldado estava sendo escoltado para fora do país por motivos disciplinares e havia passado pela segurança do aeroporto, mas conseguiu sair do terminal e se juntar a uma patrulha pela fronteira.
Uma terceira fonte, um oficial de defesa, disse mais tarde à CBS que o soldado havia atravessado a fronteira "voluntariamente". Sua motivação ainda não está clara.
Uma testemunha que fazia parte do mesmo grupo de excursão disse à CBS que o soldado riu antes de correr para a Coreia do Norte.
"A princípio pensei que era uma piada de mau gosto, mas, quando ele não voltou, percebi que não era uma piada", disse a testemunha.
Ainda não estão claras quais seriam as motivações do soldado.
Ele cruzou a fronteira "voluntariamente"
O porta-voz do Departamento de Estado americano, Matthew Miller, disse que estava claro que o soldado cruzou a fronteira "voluntariamente por sua própria vontade" e sem autorização, mas não disse se isso foi uma deserção.
Ele também disse que, embora o Departamento de Estado não tenha mantido contato com a Coreia do Norte, entendeu que o Pentágono havia feito contato.
Miller disse que não estava ciente de nenhum contato do governo dos EUA com a China "neste momento".
Segundo ele, o Departamento de Defesa está assumindo a dianteira no assunto.
Muller acrescentou que, se houver alguma medida que possa ser tomada pelo Departamento de Estado, não hesitarão em tomá-la.
Ao ser questionado por um repórter se o soldado americano havia desertado para a Coreia do Norte, Miller respondeu: "Tudo o que direi, como disse no início, é que está claro que ele voluntariamente, por sua própria vontade, cruzou a fronteira".
As autoridades americanas afirmaram que o assunto continua sendo investigado.
Zona desmilitarizada
A Zona Desmilitarizada, local em que o soldado americano estava anteriormente, separa as duas Coreias e é uma das áreas mais fortificadas do mundo.
O local está repleto de minas terrestres, e também é rodeado por cercas elétricas e de arame farpado, além de câmeras de vigilância. Guardas armados estão em alerta 24 horas por dia.
A Zona Desmilitarizada separou os dois países desde a Guerra da Coreia na década de 1950, na qual os Estados Unidos apoiaram o governo do sul.
A guerra terminou com um armistício, o que significa que os dois lados ainda estão tecnicamente em guerra.
Dezenas de pessoas tentam escapar da Coreia do Norte todos os anos, fugindo da pobreza e da fome, mas as deserções nesta área são extremamente perigosas e raras.
A Coreia do Norte fechou as suas fronteiras em 2020, no início da pandemia de covid, e ainda não as reabriu.
A última vez que um militar desertou da Área de Segurança Conjunta foi em 2017, quando um soldado norte-coreano dirigiu um veículo e atravessou a linha de demarcação militar a pé, informou a Coreia do Sul na época.
O soldado foi baleado 40 vezes, mas sobreviveu.
Antes da pandemia, mais de mil pessoas fugiam da Coreia do Norte para a China todos os anos, segundo dados divulgados pelo governo sul-coreano.
Acredita-se que o soldado americano, que ocupa o posto de soldado raso, seja o único cidadão americano atualmente sob custódia norte-coreana.
Seis sul-coreanos permanecem detidos lá.
Um problema para Biden
Este incidente complica as relações do governo do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, com o governo norte-coreano.
"A possibilidade de que o indivíduo seja um soldado dos EUA só tornará mais difícil uma libertação negociada", disse Anthony Zurcher, correspondente da BBC na América do Norte.
"Se Biden não conseguir uma resolução rápida, seus adversários políticos citarão esse caso como exemplo do poder limitado do atual presidente no cenário internacional", acrescenta.
No entanto, uma reação mais contundente de Biden ao incidente "poderia levar a uma escalada de uma situação já tensa na península coreana em um momento em que os recursos militares dos EUA estão no limite", alerta Zurcher.
A prisão do soldado ocorreu no mesmo dia em que um submarino americano com capacidade nuclear atracou na Coreia do Sul pela primeira vez desde 1981, para ajudar o país a lidar com a ameaça nuclear representada pela Coreia do Norte.
Antes de sua implantação, houve ameaças de retaliação por parte das autoridades de Pyongyang, que alertaram os Estados Unidos de que o envio de armas nucleares para a Península Coreana poderia desencadear uma crise nuclear.
As relações entre os Estados Unidos e a Coreia do Norte ficaram mais complicadas a partir de 2017, depois que um estudante americano que havia sido preso no país asiático um ano antes por roubar um cartaz de propaganda foi enviado de volta ao seu país em coma e depois morreu.
A família dele culpa as autoridades norte-coreanas por sua morte.
Três cidadãos americanos foram posteriormente libertados durante a presidência de Donald Trump nos EUA em 2018. No entanto, as conversas de Trump com o líder norte-coreano, Kim Jong-un, fizeram pouco para melhorar as relações entre os dois países.
Desde então, a Coreia do Norte testou dezenas de mísseis cada vez mais poderosos que podem carregar ogivas nucleares, levando à adoção de novas sanções pelos Estados Unidos e seus aliados.
As tropas americanas na Coreia
Os Estados Unidos mantêm uma grande presença na área das Coreias, mesmo sete décadas após o Acordo de Armistício Coreano de 1953, que pôs fim à Guerra da Coreia.
Há supostamente 28 mil soldados americanos estacionados na Coreia do Sul - o que representa a terceira maior presença militar estrangeira dos EUA, de acordo com um relatório da Reuters de 2021.
A Coreia do Sul também abriga a maior base militar ultramarina dos EUA.
O Exército dos Estados Unidos trabalha em estreita colaboração com os militares sul-coreanos, parte de uma aliança de segurança iniciada desde que os EUA entraram na Guerra da Coreia em 1950.
Mais de 70 anos depois, os EUA e a Coreia do Sul continuam sua parceria - isso porque a Guerra da Coreia nunca terminou.
O armistício interrompeu os combates, mas nunca houve um tratado para encerrar o conflito entre a Coreia do Norte e a Coreia do Sul e seus aliados.
E a Coreia do Norte continua a ser motivo de preocupação tanto para os EUA quanto para a Coreia do Sul, já que frequentemente testa suas capacidades de mísseis e está trabalhando para desenvolver seu programa de armas nucleares.