Fuga de britânicas aquece polêmica sobre "noivas jihadistas"
Três estudantes muçulmanas de uma escola secundária de Londres podem ter trocado o Reino Unido para viver com o grupo extremista Estado Islâmico
Até o último dia 17, Shamima Begum, Amira Abase e Kadiza Sultana eram apenas três estudantes muçulmanas exemplares da Bethnal Green Academy, uma escola secundária do leste de Londres.
Para o horror de seus pais e das autoridades britânicas, as meninas podem ter se tornado as mais recentes recrutas do grupo extremista Estado Islâmico (EI) na Síria.
Mais precisamente engrossado a fileira de "noivas jihadistas" - um contingente de jovens que se juntou aos radicais muçulmanos operando na Síria e no Iraque para servir de companheiras para os militantes.
As três adolecentes, com idades variando entre 15 e 16 anos, disseram aos pais na semana passada que aproveitariam o recesso escolar na Grã-Bretanha para fazer um passeio. Mas tomaram o rumo do aeroporto de Gatwick, nos arredores de Londres, e de lá pegaram um voo para Istambul, na Turquia.
Falha
Segundo informou neste domingo o jornal britânico Daily Telegraph, citando fontes no serviço de inteligência turco, as meninas já teriam cruzado a fronteira com a Síria.
A fuga das londrinas causou polêmica e consternação na Grã-Bretanha. E gerou críticas para as autoridades de segurança.
Isso porque Shamima, Amira e Kadiza teriam sido alvo do "recrutamento eletrônico" do EI. De acordo com informações obtidas pela BBC, as meninas foram recrutadas com a influência de Aqsa Mahmood, uma jovem de 20 anos que, em 2013, juntou-se ao EI na Síria. Ela teria contactado frequentemente as jovens londrinas através de mídias sociais para convencê-las a se juntar à causa.
A família de Aqsa disse ter sido informada que há pelo menos um ano a conta da jovem no Twitter tem sido monitorada pelos serviços de inteligência britânicos. Os parentes, por meio de um comunicado, disseram estar chocados que consideram uma falha das autoridades em prevenir que mais meninas viajem.
Outro ponto de embaraço é o fato de que Shamima, Amira e Kadiza não são as primeiras meninas da Bethnal Green Academy a se juntar ao Estado Islâmico. Em dezembro, uma outra menina da escola, cujo nome não foi revelado pela polícia, tomou o rumo da Síria. Mas um porta-voz da polícia disse à BBC que as três meninas não foram consideradas casos de risco, embora tivessem sido questionadas na ocasião.
Não há números precisos sobre quantas jovens se tornaram "noivas jihadistas", mas a ONG britânica Inspire, especializada em lidar com questões de gênero entre mulheres muçulmanas britânicas, estima que mais de 50 tenham saído apenas da Grã-Bretanha nos últimos dois anos. Um número bem menor que as centenas de jovens muçulmanos que partiram para lutar nas regiões controladas pelo EI na Síria e no Iraque. Mas não tão menos preocupante.
Além do fato de o grupo estar envolvido em combate, há também preocupação com o bem-estar das meninas porque a orientação religiosa do EI prega um comportamento submisso para as mulheres, algo referendado pela divulgação, recentemente, de uma "cartilha" indicando "atitudes adequadas" para mulheres.
“Obrigações”
"Não podemos subestimar o fator religioso. Muita dessas meninas vêem como uma obrigação religiosa (a participação nas atividades do EI), quando na verdade são exploradas", afirma Zara Khan, uma das diretoras da Inspire.
"Pais e familiares podem evitar que outras meninas viajem se prestarem atenção em mudanças de comportamento por parte dessas jovens".
Mas para a Quilliam Foundation, que investe em campanhas educacionais contra a radicalizacão de muçulmanos britânicos, a prevenção precisa vir também de pessoas envolvidas diretamente com a rotina diárias dessas jovens, como professores.
Especialistas dizem que as "noivas jihadistas" são usadas para funções que variam de atividades domésticas à pura e simples reprodução - algo em linha com a declaração dos líderes do EI de que as regiões dominadas pelo grupo são "autônomas".
Além da Grã-Bretanha, há evidências de que uma série de países ocidentais, incluindo os EUA, estão representados nesta população feminina. Tudo graças a uma variação do já sofisticado uso das mídias sociais pelo EI em seu recrutamento.
Além de informações sobre a viagem, o grupo radical estaria até financiando os custos logísticos para que as jovens cheguem até a Síria. Acima de tudo, porém, ferramentas como o Twitter são usadas para a propaganda religiosa, incluindo noções idealizadas da vida nas regiões ocupadas pelos militantes, que nos últimos meses têm sido alvos de bombardeios da coalizão liderada pelos EUA.
"Mas o conceito de 'noiva jihadista' é apenas parte da história. Essas jovens estão viajando também por conta de uma questão de utopia política. Estão participando do jihad e da suposta criação de um estado islâmico", explica Mia Bloom, analista do Centro para Estudos em Terrorismo e Segurança da universidade americana de Massachussets Lowell.
Se anteriormente a propaganda do EI era voltada para a militância armada, desde o final do ano passado o público-alvo mudou mais substancialmente. Paras as mulheres até a promessa da participação em "brigadas femininas", o que inclui fotos promocionais de mulheres com armamento e mesmo em tanques.