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Panamá Papers

'Minha vida corre perigo': a troca de e-mails que desencadeou os Panama Papers

6 abr 2016 - 13h40
(atualizado às 14h08)
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Bastian Obermayer e Frederik Obermaier, do jornal Sueddeutsche Zeitung, explicam como uma fonte anônima compartilhou com eles mais de 11 milhões de documentos do escritório de advocacia Mossack Fonseca
Bastian Obermayer e Frederik Obermaier, do jornal Sueddeutsche Zeitung, explicam como uma fonte anônima compartilhou com eles mais de 11 milhões de documentos do escritório de advocacia Mossack Fonseca
Foto: Suedeutsche Zeitung

A primeira mensagem chegou por e-mail, de forma anônima, há mais de um ano: "Olá, aqui é o fulano. Interessam alguns dados?"

"Estamos muito interessados", respondeu Bastian Obermayer, repórter do jornal alemãoSuddeutsche Zeitung .

"Há algumas precondições. Minha vida corre perigo", alertou a fonte, segundo confirmou à BBC Frederik Obermaier, outro repórter do jornal alemão.

"A única coisa que não podemos revelar é o idioma em que se deu o diálogo original", desculpou-se Obermaier, um dos integrantes da equipe de investigação que recebeu os chamados Panama Papers, o maior vazamento de documentos confidenciais da história.

De fato, o jornal recebeu, ao longo de vários meses, mais de 11 milhões de documentos de uma das empresas mais fechadas do mundo, o escritório de advocacia panamenho Mossack Fonseca.

Os documentos - que envolvem 12 chefes de Estado atuais e passados e mais de 60 de seus parentes, além de personalidades políticas e esportivas - mostram como ricos e poderosos usam paraísos fiscais para ocultar patrimônio.

É importante lembrar que contas offshore não são por si só ilegais, desde que devidamente declaradas ao Fisco: podem ser uma forma de investir-se em bens e ativos no exterior. Muitas vezes, porém, contas em paraísos fiscais são usadas para evadir impostos, lavar dinheiro ou ocultar o real dono da fortuna depositada.

A Mossack Fonseca nega ter cometido qualquer irregularidade em seus 40 anos de atuação.

A identidade da fonte que divulgou os documentos é desconhecida. O que se sabe é como o vazamento ocorreu.

Criptografia

A fonte anônima impôs condições claras. Em primeiro lugar, encontros ao vivo estavam descartados.

"A comunicação será apenas por arquivos criptografados. Nunca nos reuniremos. A decisão sobre o que será publicado é, obviamente, de vocês", disse a fonte ao jornal.

Mas qual era a motivação para fazer algo assim?

"Quero tornar esses crimes públicos", disse, ao ser questionado a respeito.

"De quantos documentos estamos falando?", foi a pergunta seguinte. "Mais do que vocês jamais viram antes."

Efetivamente, nos meses seguintes, os documentos vazados cresceram até superar 2,6 terabytes de dados, em 11,5 milhões de documentos da Mossack Fonseca.

Os dados abrangem um período que vai da década de 1970 a 2016 e envolvem 214 mil entidades.

Ação hacker

Ramon Fonseca, um dos fundadores da Mossack Fonseca, negou que o vazamento tenha partido da empresa e denunciou a ação de hackers.

Fonseca disse à agência Reuters que foi um furto de documentos feito por "hackers externos", e não um vazamento por empregados. Disse ainda que a empresa já apresentou denúncia ao Ministério Público local.

Para se ter uma ideia da dimensão do vazamento, se os documentos divulgados pelo WikiLeaks fossem a população da cidade americana de São Francisco (837 mil pessoas), os Panamá Papers equivaleriam à população da Índia (1,2 bilhão).

"A fonte não queria compensação econômica nem nada em troca, apenas algumas medidas de segurança", afirmaram Obermaier e colegas em artigo no Suddeusche Zeitung .

Para processar a quantidade enorme de informações, o jornal alemão compartilhou os documentos com o Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ, na sigla em inglês). Isso permitiu a análise dos arquivos por uma equipe de cerca de 400 jornalistas de 107 meios de comunicação de 76 países, entre eles a BBC.

Volume

Milhões de e-mails, contratos, transcrições e documentos escaneados compõem a maior parte da informação divulgada.

Jornalistas e a fonte compartilharam arquivos por meio de um programa de cibersegurança chamado Nuix.

Para isso, empregaram um processo tecnológico conhecido como reconhecimento ótico de caracteres (OCR, em inglês), que permitiu organizar os arquivos criptografados e converter imagens em textos digitais.

Trabalho conjunto de jornalistas permitiu análise de volume maciço de dados
Trabalho conjunto de jornalistas permitiu análise de volume maciço de dados
Foto: Divulgação/BBC Brasil / BBC News Brasil

Com isso, o processo ganhou rapidez.

Especialistas do ICIJ criaram um mecanismo de busca com dois fatores de autenticação, e compartilharam o endereço eletrônico com dezenas de órgãos de imprensa, por meio de e-mails criptografados.

A tecnologia também permitia manter conversas em tempo real, e os jornalistas puderam trocar conselhos e informações em diferentes idiomas.

Depois de mais de um ano de trabalho, as primeiras reportagens começaram a ser publicadas no domingo passado. E o resto já é (e está sendo) história.

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