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Por que o Reino Unido vai deixar de vender certas armas para Israel

Governo britânico alegou que a suspensão acontece porque há um 'risco claro' de que o equipamento possa ser usado para cometer violações graves do direito internacional.

3 set 2024 - 08h48
(atualizado às 10h19)
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As forças israelenses durante operação na Faixa de Gaza em junho de 2024
As forças israelenses durante operação na Faixa de Gaza em junho de 2024
Foto: Reuters / BBC News Brasil

O Reino Unido suspendeu a vendas de algumas armas para Israel, segundo anunciou o secretário de Relações Exteriores, David Lammy.

De acordo com Lammy, serão suspensas 30 das 350 licenças de exportação de armas, afetando equipamentos como peças para caças, helicópteros e drones.

As peças fabricadas no Reino Unido para os caças F35, que Israel está usando para atingir alvos em Gaza, não estão incluídas na proibição.

O governo britânico alegou que a suspensão acontece porque há um "risco claro" de que o equipamento possa ser usado para cometer violações graves do direito internacional.

No entanto, segundo Lammy, o Reino Unido continua a apoiar o direito de Israel de se defender. Ele afirmou que a suspensão não equivale a um embargo de armas.

O governo também não anunciou uma data para que a suspensão entre em vigor, dizendo apenas que a decisão será mantida sob revisão.

Em resposta, o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu disse que a decisão do Reino Unido é "vergonhosa".

Em uma série de postagens nas redes sociais, Netanyahu disse que a proibição parcial não afetará a "determinação" de seu país.

"Em vez de ficar ao lado de Israel, uma democracia parceira se defendendo contra a barbárie, a decisão equivocada da Grã-Bretanha apenas encorajará o Hamas", escreveu. "Com ou sem armas britânicas, Israel vencerá esta guerra e garantirá nosso futuro comum."

O ministro das Relações Exteriores de Israel, Israel Katz, disse em resposta à decisão que Israel opera de acordo com a lei internacional.

Já o ministro israelense de Assuntos da Diáspora, Amichai Chikli, disse em entrevista à BBC Radio 4 que a decisão veio "em um momento muito sensível", após as Forças de Defesa de Israel (IDF, na sigla em inglês) anunciarem a morte de seis reféns mantidos pelo Hamas em Gaza.

Eles tinham idades entre 23 e 40 anos e faziam parte das 251 pessoas que os militantes do Hamas tomaram como reféns durante o ataque surpresa que lançaram contra o sul de Israel em 7 de outubro.

"Acho que precisamos combater o terrorismo juntos", disse Chikli ao programa World Tonight. "A luta contra o Isis [o grupo Estado Islâmico], a Al-Qaeda e o Hamas é a mesma guerra entre a civilização ocidental e o islamismo radical."

"A ameaça que vem do Hamas também é uma ameaça interna que vocês estão enfrentando nas ruas do Reino Unido", afirmou.

O presidente-executivo da Anistia Internacional no Reino Unido, Sacha Deshmukh, classificou as restrições anunciadas pelo governo britânico como "muito limitadas e cheias de brechas".

A organização sem fins lucrativos tem continuamente pedido por um cessar-fogo e pela permissão para a entrada de ajuda humanitária em Gaza.

"A decisão de hoje significa que, embora os ministros aparentemente aceitem que Israel pode estar cometendo crimes de guerra em Gaza, [o governo] continua, no entanto, a arriscar cumplicidade em crimes de guerra, apartheid - e possível genocídio - por forças israelenses em Gaza", disse ele.

Revisão das exportações

Governos ocidentais têm sofrido cada vez mais pressão para interromper as vendas de armas a Israel diante da forma como o país está travando a guerra contra o Hamas na Faixa de Gaza.

O ataque de 7 de outubro do ano passado foi o mais mortal da história de Israel. Cerca de 1.200 pessoas foram mortas e cerca de 251 foram feitas reféns, das quais 97 continuam desaparecidas, segundo autoridades israelenses.

O Exército israelense respondeu com uma ofensiva terrestre e aérea em Gaza para destruir o Hamas. Mais de 40.738 pessoas foram mortas desde então, de acordo com o Ministério da Saúde local administrado pelo grupo.

Segundo David Lammy, muitos parlamentares, advogados e organizações internacionais levantaram preocupações sobre o licenciamento de exportação de armas britânicas para Israel.

Por isso, assim que o novo governo trabalhista assumiu o governo do Reino Unido em julho, o secretário de Relações Exteriores diz ter encomendado um estudo para revisar as exportações.

David Lammy ao lado do primeiro-ministro Keir Starmer em foto de setembro de 2023
David Lammy ao lado do primeiro-ministro Keir Starmer em foto de setembro de 2023
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Lammy também teria solicitado uma avaliação do governo sobre as acusações de que a abordagem de Israel na guerra poderia violar o direito internacional.

Segundo o secretário, essa avaliação não arbitra e "não poderia arbitrar se Israel violou ou não o direito internacional humanitário" - e tampouco é "uma determinação de inocência ou culpa".

Mas Lammy disse acreditar que o governo tinha seu próprio dever legal de revisar todas as licenças de exportação.

"A avaliação que recebi me deixa incapaz de concluir qualquer coisa além de que, para certas exportações de armas do Reino Unido para Israel, existe um risco claro de que elas possam ser usadas para cometer ou facilitar uma violação grave do direito internacional humanitário", afirmou.

Ele acrescentou ainda que a proibição parcial cobre itens "que poderiam ser usados no atual conflito em Gaza".

Ajuda humanitária e tratamento de prisioneiros

Em um documento que resume as conclusões obtidas a partir da avaliação oficial, o governo britânico cita a abordagem de Israel em relação à entrada de ajuda humanitária em Gaza e ao tratamento dado a prisioneiros palestinos como fatores-chave para a decisão de suspender a venda de algumas armas.

"A avaliação concluiu que Israel não cumpriu seu dever como Poder Ocupante de garantir - na extensão máxima dos meios disponíveis a ele - os suprimentos essenciais para a sobrevivência da população de Gaza. Concluiu que o nível de ajuda humanitária continua insuficiente", diz o texto.

O documento também cita "alegações credíveis de maus-tratos a detidos".

"Israel iniciou investigações sobre essas alegações. No entanto, a suficiência dessas investigações não é clara, em parte porque Israel continua a negar o acesso a locais de detenção ao Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV)", afirma o texto.

Segundo Chris Mason, editor de política da BBC News, a avaliação encomendada pelo governo trabalhista é semelhante às solicitadas pela administração anterior, comandada pelo Partido Conservador, e foi realizada pelo mesmo grupo de especialistas.

Para Mason, o que mudou foi a conclusão a que os ministros do governo atual chegaram a partir da avaliação oficial.

E segundo a própria administração britânica, a suspensão foi adotada com base em leis que definem os controles que devem ser implementados pelo Reino Unido quando mercadorias são exportadas para uso militar ou potencial uso militar.

Um dos itens desse conjunto de leis estabelece que não devem ser concedidas licenças para exportação se for determinado que existe um risco claro "de que os itens possam ser usados para cometer ou facilitar uma violação grave do direito internacional humanitário."

Mas Chris Mason afirma que é importante dar a proporção certa à decisão.

Menos de 10% das licenças de exportação estão sendo suspensas. "E o Reino Unido não é um exportador de armas muito significativo para Israel de qualquer maneira", diz.

Enquanto os Estados Unidos são os maiores fornecedores de armamentos para Israel, respondendo por 69% das importações do país, as vendas de armas do Reino Unido representam apenas 1%.

Mason acrescenta, porém, que mensagens e sinais são importantes na política nacional e internacional. E nesse caso não apenas o governo israelense respondeu com decepção, mas também a própria oposição dentro do Reino Unido.

Andrew Mitchell, que foi vice-secretário no último governo Conservador, afirmou que a suspensão tem "toda a aparência de algo projetado para, ao mesmo tempo, satisfazer os bancos de trás do Partido Trabalhista e sem ofender Israel, um aliado no Oriente Médio".

"Temo que fracasse em ambos", disse.

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