Posse de Biden: como a Casa Branca se prepara para a chegada de um novo presidente
Remover retratos e limpar mesas de escritório é parte de uma tradição que remonta a séculos e que faz parte de uma operação gigantesca para deixar a sede do governo dos EUA pronta para a nova administração.
Os últimos vestígios da Presidência de Donald Trump serão varridos na quarta-feira (20/1), com a mudança dos Bidens para a Casa Branca.
As escrivaninhas serão esvaziadas, as salas serão limpas e os assessores do presidente serão substituídos por uma nova equipe de indicados políticos. É parte da transformação que uma nova Presidência traz ao coração do governo.
Em uma noite da semana passada, Stephen Miller, conselheiro político e figura central na Casa Branca de Trump, estava descansando na ala oeste (West Wing).
Miller, que elaborou discursos e políticas para o presidente desde seus primeiros dias no cargo, também é um dos poucos membros da equipe inicial de Trump que ainda está com ele no final.
Encostado em uma parede e conversando com colegas sobre uma reunião marcada para mais tarde naquele dia, ele parecia não ter pressa em deixar a Casa Branca.
A ala oeste geralmente agitada parecia estar deserta. Os telefones estavam mudos. As mesas em escritórios vazios estavam entulhadas de papéis e cartas fechadas, como se as pessoas tivessem saído com pressa e não fossem voltar.
Dezenas de altos funcionários e assessores renunciaram após a invasão do Capitólio em 6 de janeiro. Um punhado dos mais leais, como Miller, permaneceu.
Quando a conversa acabou e ele se afastou dos colegas, perguntei aonde iria. Miller sorriu: "De volta ao meu escritório", disse e saiu caminhando pelo corredor.
Tradição e logística
No dia da posse, o escritório de Miller estará vazio, sem sinais de que ele e seus colegas já estiveram por lá, prontos para a mudança da equipe de Biden.
A limpeza dos escritórios da ala oeste e a transição entre presidentes fazem parte de uma tradição de séculos. É um processo que nem sempre foi imbuído de cordialidade.
Outro presidente que sofreu um impeachment, o democrata Andrew Johnson, esnobou o republicano Ulysses S. Grant em 1869 e não compareceu à posse. Grant, que apoiou a destituição de Johnson, não ficou surpreso.
Neste ano, a transição também se destaca pela aspereza. O processo geralmente começa logo após a eleição, mas começou semanas depois, porque Trump se recusou a aceitar o resultado.
E o presidente disse que não comparecerá à posse. Muito provavelmente, ele viajará para seu clube Mar-a-Lago, na Flórida.
Ainda assim, a transição está ocorrendo, como no passado. "O sistema está sendo mantido", diz Sean Wilentz, professor de História Americana na Universidade de Princeton. "O caminho percorrido é muito rochoso, muito acidentado, mas mesmo assim a transição vai ocorrer."
Mesmo nos melhores momentos, a logística de uma transição é assustadora, envolvendo a transferência de conhecimento e de funcionários em grande escala.
Stephen Miller é apenas um dos quase 4.000 indicados políticos contratados pela administração Trump que perderão seus empregos e serão substituídos por contratados por Biden.
Durante uma transição comum, entre 150 mil e 300 mil pessoas se candidatam a esses empregos, de acordo com o Centro para Transição Presidencial, uma organização apartidária com sede em Washington.
Cerca de 1,1 mil dos cargos requerem confirmação do Senado. Preencher todas essas posições leva meses, até anos.
Quatro anos de documentos de política, livros de informes e artefatos relacionados ao trabalho do presidente serão enviados aos Arquivos Nacionais, onde serão mantidos em segredo por 12 anos, a menos que o próprio presidente decida que partes podem ser liberadas mais cedo.
Dia de mudança
Em uma noite da última semana de Trump no cargo, a porta do escritório de Kayleigh McEnany, a secretária de imprensa do presidente, estava parcialmente aberta.
McEnany foi uma dos principais defensores do presidente. Impecavelmente arrumada, ela é uma oradora precisa que mantém sua compostura em meio ao caos.
Seu escritório também estava organizado de maneira meticulosa, mesmo quando ela se preparava para sair. Um espelho estava em sua mesa, e várias toras de madeira da lareira foram embrulhadas em plástico e embaladas.
Geralmente, os últimos dias são um "caos controlado", diz Kate Andersen Brower, que escreveu um livro sobre a Casa Branca, The Residence (A Residência, em tradução livre).
Móveis da Casa Branca, como a mesa do Salão Oval, grande parte das obras de arte, louças e outros objetos pertencem ao governo e permanecerão no local.
Mas outros itens, como fotos do presidente penduradas no corredor, são retirados enquanto a Casa Branca é transformada para seus novos ocupantes.
Os funcionários já estão retirando alguns itens do prédio. Uma funcionária da Casa Branca estava arrastando várias imagens da primeira-dama, Melania Trump, para fora da ala leste. As fotos são conhecidas como "jumbos" por causa de seu tamanho extragrande, diz ela, e serão levadas para o Arquivo Nacional.
Os pertences pessoais dos Trump, como roupas, joias e outros itens serão transferidos para sua nova residência, provavelmente em Mar-a-Lago, na Flórida.
E, neste ano, o local será bem limpo.
O presidente, assim como Miller e dezenas de outros na Casa Branca, foram infectados com o novo coronavírus nos últimos meses, e o prédio de seis andares, com seus 132 quartos, será totalmente higienizado.
Tudo, de corrimãos a botões de elevadores e instalações sanitárias, será desinfectado, de acordo com uma porta-voz da Administração de Serviços Gerais, a agência federal que supervisiona os esforços de limpeza.
As famílias presidenciais geralmente fazem alguma redecoração quando chegam. Poucos dias depois de se instalar na Casa Branca, Trump escolheu um retrato do presidente populista Andrew Jackson para o Salão Oval. Ele também substituiu as cortinas, sofás e um tapete do escritório por itens dourados.
No dia da possa, o vice-presidente, Mike Pence, e sua esposa também darão lugar a Kamala Harris e seu marido, Doug Emhoff. Eles se estabelecerão em sua residência oficial, uma construção do século 19 a alguns quilômetros da Casa Branca.
Encerrando um capítulo
Stephen Miller pode ter permanecido na ala oeste, mas outros estavam prontos para ir. Na Casa Branca, as pessoas carregavam grossos envelopes de papel manilha, fotos emolduradas e bolsas de uma loja de presentes.
"É meu último dia", disse um homem sorrindo enquanto tirava uma foto de seus filhos no gramado ao norte. Uma mochila volumosa estava pendurada em seu ombro.
Um grupo de oficiais de Segurança Nacional posou em frente à ala oeste e me pediu para tirar uma foto deles.
"Certifique-se de pegar ao guarda da Marinha", diz um dos oficiais, referindo-se a um fuzileiro que fica em frente à porta quando o presidente está no Salão Oval. Os oficiais estavam animados, brincando e fazendo pose para a câmera.
Os indicados políticos na Casa Branca estavam de bom humor por um motivo. Por semanas, eles viveram um cenário de indefinição. Seu chefe negava a validade da eleição, mas eles sabiam que seus dias estavam contados. Agora eles podiam planejar abertamente seu futuro e pareciam quase tontos.
Um indicado político, um homem vestindo um terno escuro, já estava fazendo planos. Ele encontrou um colega do lado de fora da área de recepção no andar térreo. "Vejo você do outro lado", disse ele, animado.
Ele estava se referindo ao período após a posse, quando os dois estarão fora de seus empregos na Casa Branca. Ele refletiu sobre onde eles poderiam se encontrar novamente. "Espero que nas ilhas gregas ou em algum outro lugar."
"Ah, sim. Com certeza", disse seu colega, rindo. Eles se cumprimentaram batendo suas mãos no ar e então foram embora.