Tsunami 10 anos: brasileiro fala sobre crianças se afogando
A praia de Patong, onde Volnei passava férias, foi fortemente atingida pelo tsunami de 2004
A sensação de impotência é uma das lembranças mais fortes que o paulista Volnei Llamazalez guarda de 26 de dezembro de 2004, quando viu a praia onde passava férias, na Tailândia, ser arrasada pelo tsunami que deixou mais de 200 mil mortos.
"Quando as imagens vêm à minha cabeça, penso principalmente nas crianças que eu vi perderem a vida, que eu vi irem para dentro da água e não saírem mais, e isso me comove demais até hoje - ver as pessoas e não conseguir ajudar", disse ele à BBC Brasil por telefone da Austrália, onde mora.
Naquela manhã, Volnei, então com 33 anos, passeava em Patong, praia na ilha de Phuket, quando viu a água do mar avançar em ondas gigantes sobre a areia.
Em sua primeira entrevista à BBC Brasil, dois dias depois, ele contou que as águas o jogaram para dentro de uma loja à beira-mar, junto com outras oito pessoas, entre elas três ou quatro crianças, que tentavam nadar contra a força da correnteza.
Ele perdeu muitas delas de vista quando o fundo da loja se rompeu com a força da água, mas Volnei conseguiu subir ao telhado da construção. E de lá viu a destruição: "Eu olhava casas sendo destruídas como se fossem de papel. Havia corpos por todos os lados", contou.
Recordações
Volnei diz que ainda sente angústia ao lembrar da imagem de crianças sendo levadas pelas águas O tsunami de 2004, que começou com um terremoto de magnitude 9,1 no Oceano Índico, atingiu 14 países e deixou estimados 228 mil mortos, com ondas de até 20 metros de altura que avançaram sobre cidades inteiras.
Foi uma das maiores tragédias da história. A Tailândia foi um dos países mais afetados, junto com Indonésia, Sri Lanka e Índia.
Volnei voltou a conversar com a BBC Brasil nesta semana, quando o aniversário da tragédia traz à tona as recordações de dez anos atrás.
Quando conseguiu pisar novamente em terra firme, algumas horas após a passagem das ondas gigantes, Volnei conta que voltou ao hotel onde estava hospedado caminhando com água ainda na altura dos joelhos, em meio aos corpos de vítimas pelo caminho.
Em seguida, foi levado de caminhão com outros desabrigados a uma universidade em Phuket, onde passou a primeira noite pós-tragédia. "Nessa viagem, vi tudo destruído. Passamos pela avenida da praia e havia muita gente morta", diz.
"Eu só queria sair de lá. Na manhã seguinte fui a Bangcoc (capital da Tailândia), na embaixada brasileira, pegar o passaporte que perdi no tsunami e ir embora", conta.
"Nos primeiros meses, foi muito difícil. Eu ia dormir e via as imagens na minha cabeça. Como tudo na vida, você vai se acostumando. Lembrei muito quando aconteceu (o tsunami de 2011) no Japão: vendo ao vivo pela TV, eu dizia para minha mulher: 'É exatamente assim. Um monte de lixo vindo na sua direção junto com a água, coisas que te impedem de nadar, de flutuar. Destroços, pedaços de madeira'."
O brasileiro, que trabalha no departamento de informática de uma empresa de engenharia na Austrália, diz que aprendeu a conviver com as lembranças daquele dia.
"Quando alguém me pergunta ou toca no assunto, vejo aquelas imagens de novo na minha cabeça, e ainda me dá um pouco de angústia ao lembrar das crianças que vi na praia. Não tive a oportunidade que eu gostaria de ter tido de salvar as pessoas que estavam ao meu redor", conta.
"Mas tirei um aprendizado, de dar mais valor à vida e aproveitar o momento e as pessoas ao meu redor, já que você não sabe o que vai acontecer amanhã. Veja: eu estava no hotel, no dia anterior fui dormir com tudo normal e no dia seguinte quando acordei tudo aquilo estava acontecendo. Isso me mudou bastante."