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Usinas flutuantes são a solução para a crise energética na África?

Em meio a uma crise energética que afeta várias regiões do continente, alguns países africanos estão recorrendo aos navios turcos para suprir suas necessidades de eletricidade

2 jul 2024 - 19h39
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Uma empresa sediada em Istambul fornece mais de 6.000 megawatts para 14 países africanos
Uma empresa sediada em Istambul fornece mais de 6.000 megawatts para 14 países africanos
Foto: Karpowership / BBC News Brasil

Cerca de 600 milhões de pessoas na África não têm acesso à eletricidade, em meio a uma crise energética que ameaça o continente com grandes repercussões sociopolíticas e econômicas.

À medida que a demanda por energia aumenta, alguns países estão recorrendo a fontes não convencionais, como a empresa turca Karpowership - uma frota de usinas elétricas flutuantes que navegam para os países para fornecer eletricidade.

Os 40 "navios elétricos" desta empresa baseada em Istambul fornecem mais de 6.000 megawatts para 14 países, incluindo Gâmbia, Gana, Guiné-Bissau, Costa do Marfim, Moçambique, Senegal e Serra Leoa.

Esses navios autônomos utilizam motores multicom­bustíveis, o que lhes permite operar com óleo pesado, gás natural liquefeito ou biocombustível.

Eles podem ser instalados em locais costeiros onde há uma subestação elétrica.

Estas são "junções" onde os circuitos se conectam entre si, criando assim a rede através da qual a eletricidade circula em alta tensão.

A eletricidade é injetada diretamente na rede de transmissão a partir da subestação de alta tensão embarcada.

O consumo em Gana

A Karpowership tem sido responsável por cerca de um quarto da energia consumida no Gana há quase uma década.

O país enfrentou uma série de cortes de energia persistentes, conhecidos localmente como "dumsor".

A Electricity Company of Ghana (ECG) deve mais de 1,7 bilhão de dólares americanos (cerca de 1.037 bilhões de francos CFA) aos fornecedores de eletricidade. Sua incapacidade de pagar essas dívidas contribuiu para uma crise nacional de eletricidade.

William Boateng, diretor de comunicação da ECG, afirmou que a empresa implementou cortes de energia porque o parlamento do Gana se recusou a "honrar os avisos de pagamento".

"Os cortes afetam a todos; qualquer pessoa que não pagar e não conseguir fazer acordos será desconectada", disse Boateng à Reuters.

A Karpowership afirma estar ajudando o Gana a resolver seus problemas energéticos.

Há quase uma década, a Karpowership tem sido responsável por cerca de um quarto da energia produzida no Gana
Há quase uma década, a Karpowership tem sido responsável por cerca de um quarto da energia produzida no Gana
Foto: Getty / BBC News Brasil

"A nossa rede no Gana fez uma diferença tangível na frequência dos cortes de eletricidade, o que teve um impacto positivo significativo nas condições socioeconômicas das comunidades locais", disse Zeynep Harezi, diretora comercial da Karpowership, à BBC.

"Para dar um exemplo, a indústria local de pesca, que era extremamente vulnerável aos cortes de eletricidade que impediam o armazenamento seguro das capturas, beneficiou-se enormemente. No entanto, os cortes de energia continuam sendo uma realidade diária que o governo está trabalhando para evitar", explicou ela.

O Gana possui importantes fontes de energia natural, incluindo três barragens hidrelétricas, que contribuem com cerca de um terço de sua produção de eletricidade. Além disso, o país possui reservas de petróleo e gás no mar, mas que ainda não foram totalmente exploradas.

A Karpowership informou que colaborou com a companhia nacional de eletricidade do Gana para acessar o gás natural do país. Espera-se que isso forneça uma fonte de produção de eletricidade mais sustentável e econômica a longo prazo.

A empresa também utiliza um gasoduto de 11 km de extensão para transportar o gás natural do ponto de extração até a central elétrica, o que, segundo ela, permitirá ao Gana economizar cerca de 20 milhões de dólares por mês.

"O gasoduto de 11 km vai de Aboadze à base naval de Sekondi, onde nosso navio-gerador está atracado", afirmou a Harezi.

"O desenvolvimento da infraestrutura do gasoduto pelo Gana foi crucial para permitir que nosso navio fornecesse gás natural ao país. Reconhecemos a necessidade de desenvolver infraestruturas terrestres a longo prazo e sempre apoiaremos nossos parceiros nesse empreendimento", acrescentou ela.

A Karpowership afirma que o uso de gás natural liquefeito em suas usinas elétricas representa uma alternativa mais limpa aos combustíveis fósseis, ajudando a reduzir as emissões de carbono, estabilizar redes elétricas e suprir déficits de abastecimento.

"Nossas usinas são deliberadamente projetadas para minimizar o impacto ambiental da geração de eletricidade. São compactas, eficientes, bem isoladas e equipadas com amortecedores de vibração para lidar com potenciais fatores ambientais", disse Harezi.

Durabilidade

No entanto, alguns especialistas em energia alertam que a eletricidade fornecida pelo Karpowership pode não ser uma solução sustentável a longo prazo, já que alugar um navio para geração de energia pode ser mais caro do que construir uma usina elétrica permanente em terra.

"Os países africanos estão recorrendo a essa solução simplesmente porque ela é rápida e flexível diante das escassezes de eletricidade", disse à BBC Tony Tiyou, CEO da empresa de energia verde Renewables in Africa.

"Mas não devemos considerá-la uma solução definitiva para os problemas energéticos da África. Em cinco anos, resolver os cortes de eletricidade dessa maneira será mais caro do que uma solução permanente. O que precisamos é que os países africanos invistam em uma mistura diversificada de energias, incluindo renováveis (solar, eólica, hidrelétrica)", explicou Tiyou.

No entanto, a Karpowership argumenta que suas soluções são mais econômicas do que outras.

"É mais econômico construir usinas elétricas flutuantes em um ambiente totalmente controlado, em um estaleiro naval com capacidades de guindaste de alta qualidade, do que construir uma usina desse tipo em muitos países em desenvolvimento", afirmou Zeynep Harezi.

Faturas de eletricidade não pagas

Apesar do impacto positivo que a Karpowership afirma ter tido no Gana e em outros países africanos, a empresa foi obrigada a cortar o fornecimento de energia para alguns países devido a faturas não pagas.

No ano passado, a Guiné-Bissau ficou às escuras por quase dois dias porque a Karpowership cortou a eletricidade, devido a faturas não pagas no valor de 15 milhões de dólares (cerca de 9,1 bilhões de francos CFA).

O corte de energia afetou o abastecimento de água, hospitais e meios de comunicação, com a rádio pública Rádio Nacional tendo que suspender suas transmissões.

No entanto, a Karpowership conseguiu restabelecer o fornecimento de energia para a Guiné-Bissau após o governo efetuar um pagamento de 6 milhões de dólares (cerca de 3,6 bilhões de francos CFA).

A Serra Leoa também enfrentou cortes de eletricidade, especialmente em sua capital, Freetown, no ano passado. A Karpowership havia cortado o fornecimento de energia devido a uma dívida não paga de aproximadamente 40 milhões de dólares (cerca de 24,4 bilhões de francos CFA).

O Ministro da Energia, Isuf Baldé, afirmou que o contrato do país com a Karpowership precisava ser renegociado, pois os custos haviam quase dobrado desde a sua implementação.

A Karpowership reafirma seu compromisso em fornecer energia aos países africanos, sendo o continente um de seus principais mercados.

"Acabamos de assinar acordos com as autoridades do Gabão para fornecer 150 megawatts à rede nacional deles. Acreditamos que podemos ajudar a África em sua transição energética e ampliar o acesso à eletricidade para suas populações", disse Harezi.

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