"Na Faixa de Gaza falta tudo", alerta ONU
O porta-voz da Agência da ONU de Assistência aos Refugiados da Palestina (UNRWA) descreve uma situação que já era grave antes da atual ofensiva de Israel
Em entrevista, Adnan Abu Hasna, porta-voz da UNRWA, traça um quadro catastrófico do território palestino. Escassez de água e medicamentos, propensão à violência e estresse psíquico ditam o dia a dia da população.
No contexto da escalada de violência no Oriente Médio, a Deutsche Welle entrevistou Adnan Abu Hasna. O porta-voz da Agência da ONU de Assistência aos Refugiados da Palestina (UNRWA) vive na Faixa de Gaza, principal foco dos conflitos entre israelenses e o grupo radical islâmico Hamas.
Abu Hasna descreve uma situação que já era grave antes da atual ofensiva de Israel, e agora é ainda mais alarmante, tanto do ponto de vista humanitário quanto psíquico. Faltam remédios, médicos e água. E os habitantes seguem esperando por uma ajuda decisiva do Ocidente.
Como são as condições na Faixa de Gaza, do ponto de vista humanitário?
Adnan Abu Hasna: A situação é muito difícil. Antes mesmo dos bombardeios, as condições já eram ruins. O desemprego está em 40%. Há escassez de água, quase não há água potável. Segundo um relatório da ONU, já em 2016 não vai haver nem uma gota d'água, sem contar que a disponível está geralmente cheia de germes.
Há também a sobrecarga psíquica a que a gente está exposta aqui. Depois de cada operação militar israelense em Gaza, cresce a propensão à violência entre a juventude, há casos de violência nas famílias. E muitos jovens não conseguem mais se concentrar.
Quer dizer que o abastecimento de água piorou com a guerra?
As novas ofensivas atingiram as bombas d'água. Para se ter água é preciso, naturalmente, ter eletricidade, mas aqui só temos energia durante cinco horas por dia. Além disso, a água daqui não serve para beber.
Instalações da UNRWA também foram atingidas por mísseis israelenses. Como a organização lida com isso?
Desde o início da ofensiva, umas 22 dependências da UNRWA foram danificadas, em graus diversos. Em 2008, também foi bombardeado o prédio da nossa central. Ainda não dá para prever como vamos proceder em relação a isso.
As instalações da UNRWA não estão também sendo utilizadas como abrigos ou locais de proteção para a população refugiada do norte de Gaza?
Sim. Cerca de 19 mil cidadãos se refugiaram conosco. Ao todo, organizamos abrigos em 24 escolas da UNRWA.
Na sua opinião, o que mais faz falta na Faixa de Gaza no momento?
Aqui falta tudo. Temos escassez de água, de medicamentos, não temos médicos suficientes.
Como os habitantes lidam com a situação?
Todos, sejam jovens ou velhos, estão em pânico. Eles se encontram sob tensão psíquica, e não há como prever que efeitos de longo prazo isso vai ter.
O que os cidadãos esperam do Ocidente?
Elas desejam apoio para que se rompa essa espiral de violência. As pessoas não vivem bem aqui – já era assim antes da ofensiva israelense. Ninguém aguentaria viver sob tais condições. Tantas crianças e civis foram mortos. Não importa onde se more: qualquer um pode ser atingido, especialmente nos campos de refugiados. Eles estão tão lotados, que se uma pedra fosse jogada às cegas [no meio dos refugiados], alguém já sairia ferido.
Para onde a população deve fugir, diante dos alertas de novos ataques?
É uma pergunta que também nos fazemos sempre: aqui não há lugar. Para onde as pessoas devem ir, nós não sabemos.
Como a UNRWA procura chamar a atenção para o sofrimento dos palestinos?
Enviamos sempre relatórios sobre as ocorrências, com as estatísticas atuais, às Nações Unidas e também à União Europeia. Não temos uma agenda política. Mas nossos relatórios falam por si e mostram que a situação em Gaza é realmente perigosa.
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