"Não sabia que sua vida estava ameaçada", diz viúva sobre Marielle Franco
Élcio de Queiroz confidenciou que vereadora era monitorada; Mônica afirmou que Marielle não imaginava que sua segurança estava em risco
A vereadora do Rio de Janeiro Mônica Benício (PSOL), viúva de Marielle Franco, afirmou em entrevista à GloboNews nesta terça-feira, 25, que Marielle não imaginava que poderia estar correndo risco de morte. O relato da parlamentar ocorre após o ex-PM Élcio de Queiroz confidenciar, em um acordo de delação premiada, que a primeira tentativa de matar a vereadora ocorreu ainda em 2017, um ano antes dela ser assassinada a tiros.
"Essa informação foi na verdade a que mais me chocou, e que mais me mobilizou emocionalmente na delação do Élcio. Isso porque se aproxima da data do aniversário da Marielle, então tem muitas emoções nesse momento, mas também entender que ela já corria risco de vida há muito tempo. Segundo o relato [de Élcio], ela estava sendo acompanhada desde agosto de 2017", disse ela.
Em seguida, Mônica acrescentou: "Marielle foi assassinada com um ano e três meses de um mandato de vereadora que poderia ter durado quatro anos. E poderia ter sido ainda mais breve, segundo o relato do Élcio Queiroz".
A parlamentar ainda afirmou que Marielle nunca teve um trabalho de atuação efetiva de combate às milícias, para que estivesse com a segurança em risco. "Marielle não se entendia em risco, ela não tinha nenhum tipo de ameaça, nem em redes sociais, nem pessoalmente. Na verdade, o indíce de rejeição da Marielle nas ruas era muito baixo, ela era muito parada para demonstração de afeto e agradecimento do trabalho dela", relembrou.
De acordo com a vereadora, é muito triste relembrar dos últimos momentos de Marielle e saber que ela não fazia ideia que poderia estar sendo monitorada pelos suspeitos. "Então, saber que ela já estava sendo monitorada desde agosto de 2017 realçou a tristeza em algum aspecto. Foi lembrar, também, de cada momento que Marielle estava ali vivendo e não sabia que sua vida estava ameaçada, estava correndo risco", disse a viúva. "Se qualquer pessoa que trabalhasse com ela, ou da família, ou ela mesma, tivesse imaginado isso, teríamos tomado medidas de segurança. Infelizmente, estamos falando de um crime muito bem planejado e que não resta dúvidas que foi político", acrescentou.
Por fim, a vereadora parabenizou a ação da Polícia Federal e do Ministério Público, que acarretou em novos desdobramentos da investigação, mas destacou que ainda é preciso ser esclarecido quem foi o mandante da morte de Marielle.
"O Ronnie Lessa é um assassino de aluguel, ele não trabalha por motivação pessoal, de ódio. A gente tem mais que certeza que há um mando nesse assassinato e é nessa busca que a gente quer chegar. A gente quer saber quem contratou o Ronie Lessa. A ação de ontem foi um passo importante, mas queremos saber quem mandou matar Marielle e por quê", disse ela.
Próximos passos da investigação
A prisão do ex-bombeiro militar Maxwell Simões Correa, o "Suel", nesta segunda-feira, 24, e a delação premiada de Élcio de Queiroz abriram novos caminhos para a investigação do assassinato da vereadora carioca Marielle Franco (PSOL) e do motorista Anderson Gomes, mortos a tiros de submetralhadora na noite do dia 14 de março de 2018.
Como confirmou o ministro da Justiça, Flávio Dino, a mecânica do dia do crime já foi esclarecida, mas as investigações ainda precisam responder várias perguntas — principalmente, quem foram os mandantes e quem financiou o crime.
Queiroz fez um acordo de delação premiada na Justiça no dia 14 de junho e revelou informações que podem ajudar as investigações a avançarem nesse quesito. Além de confirmar o atirador foi Ronnie Lessa — um ex-policial militar do Rio de Janeiro que está preso preventivamente desde março de 2019, suspeito pelo assassinato —, o delator ainda apontou o enriquecimento rápido do acusado.
O delator disse que não acreditava na versão do comparsa de que não teria recebido "um centavo" pelo assassinato de Marielle. Na delação, ele disse às autoridades que Lessa subiu o padrão de vida depois do crime. O ex-policial militar teria comprado uma Dodge Ram blindada - veículo que custa pelo menos R$ 350 mil -, uma lancha e estava planejando construir uma casa de praia em Angra dos Reis.
Para os investigadores da Polícia Federal, as revelações do delator sobre as aquisições de bens de Lessa reforçam a suspeita de que ele foi financiado por mandantes para cometer o crime. Esta é a próxima etapa da apuração. Nesta segunda-feira, 24, o ministro da Justiça indicou o avanço do inquérito nessa direção.
Queiroz ainda disse que Edimilson Oliveira da Silva, conhecido como "Macalé", teria sido o contratante da dupla, abrindo a cadeia de mandantes.
"Macalé" era policial militar e morreu assassinado em 2021, em circunstâncias suspeitas. Relatos de testemunhas mostram que ele caminhava por Bangu, zona oeste do Rio, quando foi alvejado por homens em um automóvel. Ele estava com uma pistola, mas os responsáveis pelo crime não levaram a arma nem seus documentos.
Na delação de Queiroz, o ex-militar foi apontado como um dos mentores do crime, por ter supostamente auxiliado no monitoramento da rotina das vítimas. Ele também teria fornecido o veículo usado no dia do crime. A morte extingue a punibilidade penal — por isso, não há mais nada que possa ser feito em relação a "Macalé" —, mas a confirmação da sua participação no caso abre linhas da investigação.
A delação de Queiroz também esclareceu detalhes sobre o papel dos acusados. Ele e Lessa estão presos preventivamente desde março de 2019 em um presídio em Rondônia. "Suel" já havia sido preso preventivamente em março de 2020 sob a acusação de interferir nas investigações. De acordo com a Justiça do Rio, ele teria sido um dos mentores do crime: ajudou a mapear a rotina de Marielle, seguir a vereadora e organizar o passo a passo do assassinato.