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Neve fora de época no Hemisfério Norte

Novembro nem terminou e já nevou no Japão e na Suécia. Mas se o Pólo Norte está "quente", por que está nevando tanto e tão mais cedo?

28 nov 2016 - 01h19
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Nas últimas semanas dois grupos de notícias aparentemente contraditórias circularam amplamente: de um lado, cientistas preocupados com as temperaturas relativamente elevadas para o Oceano Ártico e a retração da calota de gelo polar; de outro, notícias de nevascas fora de época no Japão, Suécia, Bélgica, Irã, etc, e de frio intenso no Canadá, nordeste da China e na Rússia. Aparentemente, há algo errado com as notícias, não!? Como pode estar mais quente do que o habitual no Pólo Norte e, ainda assim, ocorrerem nevascas antes do esperado e ondas de frio no Hemisfério Norte? 

Ainda era 10/11 quando Estocolmo, na Suécia, amanheceu sob 39cm de neve, algo que jamais havia sido registrado com tamanha intensidade em novembro, desde o início do monitoramento meteorológico na região, em 1905. Há mais de 50 anos não nevava durante novembro em Tóquio, até o dia 25/11, quando a cidade amanheceu coberta por uma fina camada de 2cm de neve: e permaneceu nevando ao longo do dia. Concomitantemente, a NASA e a NOAA emitiram notificações alertando para temperaturas até 20°C acima da normal climatológica no Oceano Ártico, havendo degelo e retração da calota polar quando ela deveria aumentar conforme o inverno se aproxima. Ainda de forma alarmante, desta fez a calota de gelo oceânico ao redor da Antártica está se retraindo mais rapidamente do que o esperado.

Foto: Climatempo

Neve em Tóquio na última sexta-feira, 25/11/2016.

Para ilustrar o que ocorre com as calotas de gelo polar e o quão grave é a situação presente, serão apresentados dois gráficos obtidos com dados da NSIDC (National Snow and Ice Data Center). O primeiro deles, abaixo, mostra a cobertura total de gelo oceânico no planeta, somando o gelo Ártico e Antártico. Cada linha colorida apresenta um ano entre 1978 e 2015 e a extensão do gelo oceânico total, mês-a-mês, naquele dado ano. A área cinza representa dois desvios-padrão em relação à média de extensão do gelo em todos estes anos: ela mostra que qualquer valor dentro da área sombreada pode ser entendido como "típico", "normal". A linha vermelha solitária é a extensão das calotas de gelo ao longo do ano de 2016.

Foto: Climatempo

Em 2016 há muito menos gelo no mar ao redor dos pólos do que o habitual.

Então, o que se observa é uma retração global das calotas de gelo oceânicas sem precedentes na história recente. Para entendermos as nevascas recentes e as ondas de frio na Ásia, Europa e América do Norte, é preciso investigar a respeito da extensão das calotas de gelo do Ártico. O gráfico a seguir apresenta a extensão do gelo Ártico, mês-a-mês, mostrando a climatologia entre 1989 e 2010 como a linha grossa preta, enquanto a área cinza representa dois desvios-padrão desta climatologia. As linha coloridas se referem a anos individuais entre 1978 e 1989, anteriores à média climatológica mais recente (que, em geral, já mostra menor extensão de gelo do que nos anos anteriores). A linha vermelha solitária representa a extensão de gelo Ártico no ano de 2016.

Foto: Climatempo

Durante todo o ano de 2016 o gelo no Ártico esteve muito abaixo da média climatológica.

O que estes gráficos mostram é que a sistemática elevação da temperatura terrestre tende a causar diminuições consideráveis das calotas de gelo sobre o mar ao redor dos pólos. Isso, em conjunto com as medições de temperatura no Ártico, que indicam temperaturas até 20°C acima da normal climatológica, mostra claramente que há menos ar frio sobre o Pólo Norte do que o que costuma haver. Num inverno típico, há uma grande região mais ou menos circular de ar muito denso e frio ao redor do Pólo Norte. Este ar se mantém naquela área, entre outros motivos, porque há muito gelo na região. Quando a cobertura de gelo ao redor do Pólo Norte diminui, indicando ar mais quente sobre a região, este ar frio e denso escoa para as "bordas" da área aproximadamente circular, formando "círculos" menores de ar denso e frio longe do Pólo Norte, enquanto o ar mais quente do sul escoa para a região polar, onde esfria lentamente. 

Chamamos esta região de ar denso e frio ao redor dos pólos de Vórtice Polar. Num inverno típico ele é bem determinado e intenso. Conforme a calota polar do Ártico se retai e a temperatura próximo ao Pólo Norte aumenta, o Vórtice Polar perde intensidade e o ar frio escapa para sul, geralmente estacionando sobre a Sibéria Central, norte da Europa e leste da América do Norte, deixando o inverno nestas regiões mais frio e mais duradouro, com neve abundante no final de março e início de abril. 

A imagem a seguir mostra a posição típica do Vórtice Polar durante um inverno comum (a área mais escura no globo da esquerda) e o que ocorre quando o Vórtice Polar enfraquece e o ar denso e frio, mais escuro na imagem, se concentra em pontos da Ásia, Europa e América do Norte. 

 

Foto: Climatempo

Inverno normal, à esquerda. Inverno atípico, à direita.

Nevascas abundantes e antecipadas e baixa extensão da calota polar no Ártico indicam que provavelmente este será um inverno mais longo e rigoroso no Hemisfério Norte. E chega a ser irônico notar que isso ocorre justamente como consequência da elevação das temperaturas do planeta, que levam à retração das calotas polares. 

Climatempo
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