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Novos estudos desafiam antigas teorias sobre onde e como nossos ancestrais viveram na era glacial

A maioria dos animais se refugiou em pequenas áreas mais quentes. Mas alguns, como os humanos, parecem ter ficado onde estavam. Isso é surpreendente, pois nossos ancestrais se originaram na África e pode parecer improvável que eles fossem resistentes a climas frios.

15 out 2024 - 11h59
(atualizado em 16/10/2024 às 17h11)
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O novo estudo analisou a história genética de 23 mamíferos comuns na Europa. Não se sabe ao certo por que os humanos antigos e outros animais desse grupo viveram nesse clima severo em vez de explorar lugares mais hospitaleiros. Mas eles pareciam capazes de tolerar as condições da era glacial enquanto outras raças se retiravam para refúgios. Gorodenkoff/Shutterstock
O novo estudo analisou a história genética de 23 mamíferos comuns na Europa. Não se sabe ao certo por que os humanos antigos e outros animais desse grupo viveram nesse clima severo em vez de explorar lugares mais hospitaleiros. Mas eles pareciam capazes de tolerar as condições da era glacial enquanto outras raças se retiravam para refúgios. Gorodenkoff/Shutterstock
Foto: The Conversation

Os seres humanos parecem ter se adaptado à última era glacial de forma semelhante aos lobos e ursos, de acordo com nosso estudo recente, desafiando teorias de longa data sobre como e onde nossos ancestrais viveram durante o período de resfriamento da Terra.

Pesquisas anteriores apoiam a visão da maioria dos arqueólogos de que os humanos se retiraram para o sul da Europa quando espessas camadas de gelo cobriam os territórios, e se expandiram durante o aumento posterior das temperaturas globais. Mas, nosso estudo é o primeiro a usar dados genéticos para mostrar que alguns humanos permaneceram na Europa central - ao contrário de muitos outros animais e apesar de nossa espécie ter evoluído no clima muito mais quente da África.

Desde o século XIX, os cientistas sabem que a distribuição de animais e plantas em todo o mundo pode variar de acordo com o clima. A crise climática tornou mais importante do que nunca entender essas flutuações.

As populações que vivem em lugares diferentes geralmente têm genética diferente uma da outra. Mais recentemente, os cientistas estudaram como a mudança do clima alterou a distribuição dessas espécies geneticamente distintas.

A maioria das pesquisas nesse campo se concentra em espécies individuais de animais ou plantas. Elas mostraram que muitos agrupamentos, inclusive os seres humanos, expandiram suas áreas geográficas desde o auge do resfriamento global, há aproximadamente 20 mil anos.

Nessa época, as camadas de gelo europeias chegavam à Dinamarca e ao sul do País de Gales. A Europa era fria mas, em sua maior parte, não glaciada, provavelmente muito parecida com o Alasca ou a Sibéria de hoje.

O novo estudo da nossa equipe, liderado por Oxala García-Rodríguez, da Universidade de Bournemouth (Reino Unido), adotou uma abordagem diferente e analisou a história genética de 23 mamíferos comuns na Europa. Além de humanos, eles incluíram roedores, como ratazanas e esquilos vermelhos, insetívoros, como musaranhos e ouriços, ungulados, como veados e javalis, e carnívoros, como ursos marrons e doninhas.

Uma métrica importante em nosso levantamento foi onde a maior diversidade está, hoje, na Europa. As áreas de alta variação genética, provavelmente, são os espaços de ocupação mais longa pelas espécies.

Esses locais, conhecidos como refúgios, são terras para onde elas buscaram sobrevivência durante períodos em que as condições ambientais eram desfavoráveis em outros lugares. Para os mamíferos que estudamos, os refúgios teriam sido ocupados desde o ápice da última glaciação, pelo menos. Eram, provavelmente, mais quentes ou onde era mais fácil para os animais encontrarem alimentos.

Os padrões genéticos que encontramos incluem casos em que alguns mamíferos (como raposas vermelhas e veados) estavam restritos a localidades glaciais em áreas do sul, como a Ibéria e a Itália, e que se expandiram à medida que as temperaturas globais se aqueceram. Outros mamíferos (como castores e linces) se alastram no leste da Europa para, depois, se espalharem para o oeste.

Grupos como o musaranho-pigmeu e a ratazana comum estavam restritos a áreas abrigadas, como vales profundos no norte da Europa, pequenos enclaves em paisagens glaciais inóspitas. Esses padrões foram documentados anteriormente por outros cientistas.

Mas nós encontramos um quarto padrão. Nosso estudo indicou que algumas espécies (como ursos marrons e lobos) já estavam amplamente distribuídas pela Europa durante a última glaciação, sem esconderijos perceptíveis ou em refúgios ao norte e ao sul.

Os seres humanos parecem ter seguido o mesmo padrão de distribuição dos ursos marrons na última era glacial. Volodymyr Burdiak/Shutterstock
Os seres humanos parecem ter seguido o mesmo padrão de distribuição dos ursos marrons na última era glacial. Volodymyr Burdiak/Shutterstock
Foto: The Conversation

Esse padrão também inclui o Homo sapiens. Nessa época, os neandertais já haviam sido extintos há cerca de 20 mil anos.

Não se sabe ao certo por que os humanos antigos e outros animais desse grupo viveram nesse clima aparentemente severo em vez de explorar lugares mais hospitaleiros. Mas eles pareciam capazes de tolerar as condições da era glacial enquanto outras raças se retiravam para refúgios.

Talvez, o mais importante de tudo seja o fato de que entre as espécies que parecem estar em conformidade com esse padrão - em que houve pouca ou nenhuma contração geográfica da população no ápice da última era glacial -, estão os seres humanos modernos. É particularmente surpreendente que estejam nesse grupo, pois nossos ancestrais se originaram na África e pode parecer improvável que eles fossem resistentes a climas frios.

Não está claro se esses humanos dependiam de adaptação ecológica - por exemplo, o fato de serem onívoros significava que podiam comer muitas coisas diferentes - ou se sobreviveram devido à tecnologia. Por exemplo, está bem estabelecido que eles tinham roupas, construíam moradias e controlavam o fogo durante as condições de frio extremo.

Esse novo padrão, e a inclusão dos seres humanos nele, podem fazer com que os cientistas repensem a mudança climática e a biogeografia, especialmente para aqueles que estudam as alterações na distribuição humana. Isso pode significar que algumas áreas podem ser habitáveis por mais tempo do que o esperado à medida que o clima muda.

The Conversation
The Conversation
Foto: The Conversation

Os autores não prestam consultoria, trabalham, possuem ações ou recebem financiamento de qualquer empresa ou organização que se beneficiaria deste artigo e não revelaram qualquer vínculo relevante além de seus cargos acadêmicos.

The Conversation Este artigo foi publicado no The Conversation Brasil e reproduzido aqui sob a licença Creative Commons
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