Script = https://s1.trrsf.com/update-1731009289/fe/zaz-ui-t360/_js/transition.min.js
PUBLICIDADE

O urso que se tornou 'soldado' do Exército polonês na Segunda Guerra Mundial

Batizado de Wojtek, o urso-pardo-sírio foi 'adotado' por soldados poloneses e foi visto carregando projéteis de artilharia durante batalhas na Itália.

30 out 2024 - 18h03
(atualizado em 12/11/2024 às 07h37)
Compartilhar
Exibir comentários

Um urso — famoso por gostar de cerveja, cigarro e boxe — lutou ao lado das tropas aliadas na Segunda Guerra Mundial.

Wojtek foi "adotado" pelo 2º Corpo do Exército polonês em 1943, depois que sua mãe foi morta por caçadores.

O urso-pardo-sírio, viajou com os soldados quando eles foram enviados do Oriente Médio para a Itália. Ali ele foi visto por membros das forças aliadas carregando projéteis de artilharia durante a Batalha de Monte Cassino.

Esta história de amizade e coragem foi adaptada agora para uma produção teatral em Coventry, na Inglaterra, pelo escritor Alan Pollock, autor do livro infantil The Bear Who Went To War ("O urso que foi para a guerra", em tradução livre).

Sue Butler é filha de um dos soldados que lutaram na guerra ao lado de Wojtek.

"Meu pai disse que ele era um símbolo que unia os soldados. Ele era muito mais do que um urso, e pensava que era um deles", conta Butler, que mora em Solihull, no arredores de Birmingham, na Inglaterra.

O cabo Andrzej Gasior se juntou ao Exército polonês após ser mantido em um campo de trabalho forçado na Sibéria
O cabo Andrzej Gasior se juntou ao Exército polonês após ser mantido em um campo de trabalho forçado na Sibéria
Foto: Sue Butler / BBC News Brasil

Assim como muitos veteranos, o pai e Sue, o cabo Andrzej Gasior, falava pouco sobre suas experiências de guerra.

"Quando ele começou a me contar histórias sobre esse soldado que, na verdade, era um urso, eu não acreditei nele no começo. Pensei que ele estava brincando comigo."

"Mas eu estava em um clube polonês local, quando um amigo dele trouxe uma foto de Wojtek para me mostrar", relata.

O pai de Butler havia sido enviado para um campo de trabalho forçado na Sibéria aos 16 anos, depois de ser flagrado cruzando a fronteira polonesa para contrabandear calçados e alimentos.

Ele ficou doente e disse que a guerra salvou sua vida, uma vez que a invasão da Polônia pela Alemanha em 1939 fez com que a União Soviética libertasse os poloneses.

Foi então que ele se juntou ao Exército Livre Polonês - como se chamavam as forças militares polonesas que se juntaram aos aliados para lutar contra os nazistas na Segunda Guerra - e conheceu Wojtek enquanto estava no Oriente Médio.

O urso recebeu uma patente e um número de registro para poder viajar com o Exército polonês para a Itália
O urso recebeu uma patente e um número de registro para poder viajar com o Exército polonês para a Itália
Foto: The Polish Institute and Sikorski Museum / BBC News Brasil

Wojtek ficou conhecido como um urso que gostava de cerveja e cigarros, mas a verdade pode ser um pouco mais prosaica.

Ele gostava especialmente de tâmaras — que o pai de Butler costumava carregar no bolso como um agrado para ele.

"Ele me disse que outros soldados gostavam de lutar com o urso. E, embora às vezes ele [Wojtek] fosse visto [em fotos] tomando garrafas de cerveja, meu pai disse que, com frequência, o que havia na garrafa era apenas água."

O urso também pedia cigarros, que ele comia.

Andrzej Gasior participou das cerimônias do chamado Remembrance Day, em homenagem aos mortos na guerra, até sua morte em 2014
Andrzej Gasior participou das cerimônias do chamado Remembrance Day, em homenagem aos mortos na guerra, até sua morte em 2014
Foto: Sue Butler / BBC News Brasil

Butler afirma que os soldados eram muito protetores em relação a seu companheiro urso, que era uma espécie de mascote da tropa.

"Ele era um urso desalojado, e eles eram pessoas desalojadas. Ambos estavam sem suas famílias", ela observa.

O animal era "muito engraçado e bastante travesso", ela acrescenta, mas no fim das contas, o urso "achava que era um deles [dos homens]".

"Todos eles saíram debilitados [da Sibéria], pois foram oprimidos pelo Estado russo por muito tempo. Esse urso, órfão, de repente entrou em suas vidas", explica.

Andrzej Gasior, fotografado na motocicleta, serviu no Oriente Médio e na Europa durante a Segunda Guerra Mundial
Andrzej Gasior, fotografado na motocicleta, serviu no Oriente Médio e na Europa durante a Segunda Guerra Mundial
Foto: Sue Butler / BBC News Brasil

Quando as forças polonesas foram enviadas para lutar em outros países europeus, a única maneira de levar o urso com elas era "alistá-lo".

Ele recebeu então um nome, uma patente e um número de registro — e participou da campanha italiana.

Em uma entrevista, um veterano britânico contou que ficou surpreso ao ver o urso de 1,82 metro carregando projéteis durante a Batalha de Monte Cassino.

O emblema do batalhão se tornou uma imagem de Wojtek carregando um projétil.

Butler contou que seu pai disse a ela: "Tenho certeza de que ele nos manteve firmes" durante a batalha.

"O urso demonstrou claramente que estava assustado com as explosões, mas se acostumou, e carregava caixas enormes com artilharia pelo local", ela relata.

A peça que conta a história do urso entrou em cartaz no Albany Theatre de Coventry, na Inglaterra
A peça que conta a história do urso entrou em cartaz no Albany Theatre de Coventry, na Inglaterra
Foto: Aaron Law / BBC News Brasil

'Chorou como um bebê'

Quando os soldados poloneses foram desmobilizados, Wojtek foi viver em Berwickshire, na Escócia, antes de ser levado para o Zoológico de Edimburgo, onde acabou morrendo em 1963.

Andrzej Gasior foi para a Inglaterra, primeiro para trabalhar em uma mina de carvão em Preston. Depois entrou para um circo e acabou na região de West Midlands.

Ele se casou com Johanna O'Connel, funcionária de uma cantina que conheceu na base aérea de Gaydon, em Warwickshire. O casal se estabeleceu posteriormente em Birmingham.

Butler contou que seu pai visitou Wojtek em Edimburgo, antes de se mudar para o sul.

"Os homens poloneses da época dele eram ensinados a não chorar, porque isso era visto como um sinal de fraqueza", diz ela.

"Mas ele me falou que quando viu Wojtek no zoológico, chorou como um bebê."

Uma estátua de Wojtek, em Edimburgo, em memória do urso e de seus companheiros soldados
Uma estátua de Wojtek, em Edimburgo, em memória do urso e de seus companheiros soldados
Foto: Aaron Law / BBC News Brasil

O dramaturgo Alan Pollock conta que ficou sabendo da história do urso por meio de uma mulher de 90 anos, enquanto fazia uma pesquisa no Clube Polonês de Coventry.

"Eu tive que interrompê-la e dizer: 'Desculpa, você pode repetir isso? Um urso era um soldado raso no Exército polonês?'", ele relembra.

"Ela me contou a história e, a partir daquele momento, fiquei fascinado. Acho que nunca ouvi uma história que eu soubesse tão imediatamente que queria contar."

Segundo ele, muitos dos soldados acabaram se estabelecendo no Reino Unido.

"Eles achavam que, uma vez a batalha sendo vencida, poderiam voltar para casa. Mas a Polônia está ocupada pela União Soviética, e eles não podiam voltar", diz o dramaturgo.

"A maioria deles saiu de casa em 1939 ou 1940, e muitos deles nunca mais viram suas casas ou suas famílias novamente."

Dizia-se que Wojtek era gentil, apesar do seu tamanho
Dizia-se que Wojtek era gentil, apesar do seu tamanho
Foto: The Polish Institute and Sikorski Museum / BBC News Brasil

Sue Butler contou que só recentemente ouviu falar da produção teatral por meio de sua nora, que trabalha com teatro.

"Acho que a Julia comentou com meu filho, Tom, e ele disse: 'Tenho certeza absoluta de que meu avô conheceu aquele urso'!"

"O mundo é pequeno e, às vezes, as coisas se alinham, não é mesmo?", acrescenta.

O pai dela viveu até os 92 anos, e morreu em 2014.

"Ele é meu herói, meu pai. Ele era um homem incrível, e eu tenho muito orgulho de ser filha dele."

BBC News Brasil BBC News Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização escrita da BBC News Brasil.
Compartilhar
TAGS
Publicidade
Seu Terra












Publicidade