“E tem gente que acha o doutor Olavo de Carvalho um delirado!”, disse a dona Gena, em frente ao computador, apontando a foto de Jesus Cristo, na capa do Popular, aqui no Terra. “Ninguém me tira da cabeça que isso não é coisa dos comunistas fazendo propaganda do Saddam Hussein... Primeiro foi o cancro cítrico... a febre aftosa, depois a vaca louca e o mosquito da dengue nos condomínios de luxo da Barra da Tijuca. Agora esse Cristo com cara de turco!”Foi nesse momento que o Barrosinho entrou na sala. Entrou e se atirou no primeiro sofá que viu pela frente. Olhou para a Mariley, sua mulher, depois para a sogra e botou para fora o assunto que o atormentava naquele momento:
“Alguém me clonou!!!”
O Barrosinho, a bem da verdade, trazia nas faces um ar de sincero de abatimento e tensão. Continuou, olhando para a sogra:
“Tem um clone meu solto por aí. Alguém precisa fazer alguma coisa antes que o caldo engrosse de vez, gente!”
A sogra, que se preparava para clicar na foto de Jesus, largou o mouse e se virou para o genro, lentamente, encarando-o de frente.
“O que que você andou aprontando dessa vez, Barrosinho? Eu te conheço! E não é de hoje!
Foi o que bastou para ele escancarar a boca e desandar num choro de dar pena, de coração partido em zilhões de pedaços. Berrava e soluçava como se tivesse havido uma grande desgraça em sua vida. Mas a sogra não arredou o pé e ainda acrescentou, fulminante e sem piedade:
“Lágrima de homem e o xixi do cavalo do bandido pra mim não têm diferença. Por que alguém haveria de clonar logo você, Barrosinho!? Me diga, se não for medir demais! Se ainda fosse um Thiago Lacerda, um Olavo de Carvalho...”
“Mãe!”, interveio a Mariley, tentando acalmar os ânimos. “Pelo menos deixa ele explicar! Hoje em dia, a gente nunca sabe...”
O Barrosinho, então, se levantou do sofá, ergueu a cabeça, os olhos marejados e tristes, e encarou a sogra, olho no olho:
“Dona Gena, acredite em mim, por favor! Fui clorado, sim! Esse andróide que anda solto por aí ainda vai fazer bobagem e não faltará alguém pra dizer que fui eu, dona Gena! Vai queimar o meu filme, vou ficar mal na foto, a senhora me entende?
“Sim, entendo! Entendo Perfeitamente, Barrosinho!”, reiterou a sogra, sem tirar os olhos dele um segundo sequer.
No momento em que ele abria a boca novamente para continuar a explanação sobre a história do clone, bateram na porta, com força. Eram dois policiais e uma moça fantasiada de Feiticeira. Assim que deram com o Barrosinho no meio da sala, a moça apontou o dedo e gritou:
“Foi ele, sim! Tenho certeza!”
“Tás vendo só!”, berrou ele, cheio de razão. “E a senhora aqui duvidando de mim!”
A dona Gena botou as mãos na cintura, desanimada, e ainda olhou uma última vez para a cara deslavada do Barrosinho, que se sentava novamente no sofá. Depois fez um sinal com o queixo para o policial que estava mais à frente, já quase dentro do apartamento, e disse, com ar de cansaço:
“Leva!”
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