A Mari simplesmente desmoronou quando leu, aqui no Popular, a história do Sri Lanka, onde uma mulher pediu o divórcio porque descobriu ter se casado com outra mulher. Tudo porque vinha cismada com o marido desde antes do casamento, quando o conheceu e, num arroubo de paixão, decidiu se entregar a ele logo na segunda vez em que se encontraram.É justo que se explique, desde muito jovem a Mari nunca entendeu bem esse negócio de religião, de castidade, de preservar o corpo para ser entregue a uma única pessoa, de transar apenas depois do casamento. Tudo balela, dizia para as amigas, um tanto perplexas com esse seu espírito despojado
A Mari, portanto, sempre viveu cismada com o Gugu. Cismada, em especial e principalmente, porque era o Gugu e não ela, a mulher na história, quem se prendia a esse tipo de moral babaca. Cada vez que os ânimos esquentavam um pouco, o Gugu vinha com aquele papo de virgindade, de se preservar intacto, de guardar sua pureza para poder ofertá-la em grande estilo mais adiante, depois da sagrada cerimônia do matrimônio.
Nhenhenhém que, justiça seja feita, a Mari só agüentou porque era realmente apaixonada por ele. Enfim, ela chegou ao casamento tão apaixonada quanto curiosa para conhecer Gugu, saber como ele era na intimidade, sob a luz difusa de um abajur lilás. Mas foi aí, justamente aí, que aumentou a estranheza dela com o marido.
Na primeira vez e nas raras, para não dizer raríssimas, que se seguiram o Gugu só tirava parcialmente a roupa e jamais permitiu que ela o tocasse com as mãos, principalmente nas partes mais secretas do corpo. Era só ele quem podia - digamos - manusear aquilo na hora indissimulável da penetração. E só à noite, de preferência noite sem lua, e com luz apagada. Ela até desconfiava de que o Gugu, no fundo, fosse mesmo um talibã que não deu certo. Vai daí que a Mari já andava de saco meio cheio com aquilo e até pensava em chutar o pau da barraca e dar uma prensa no marido.
Foi nesse dia, então, que ela entrou no Popular, para espairecer um pouco, e deu com os olhos na notícia da mulher que se casara com outra mulher, sem saber, e acabava de pedir o divórcio.
Seria mesmo Gustavo Rogério o nome daquele cretino?, foi a primeira pergunta que Mari se fez sobre o Gugu, entre perplexa e irada, as pernas moles e os cabelos em pé. Ligou imediatamente para a mãe e leu a notícia.
"Coisa para inglês ver!", sentenciou ela, mal-humorada, no outro lado da linha.
A Mari argumentou que não, a notícia era verdadeira, tinha saído no The Mirror, um jornal sério, de primeiro mundo, que não ia se prestar para esse tipo de coisa. E aproveitou para despejar uma torrente de ressentimento e mágoa do marido sobre os ouvidos da mãe.
Contou tudo, desde o início, tim-tim por tim-tim.
A mãe fez silêncio, depois perguntou, do alto de sua sabedoria:
"Ele levanta a tabuinha do vaso?"
"O assento, a senhora quer dizer!?"
"Sim! O assento, ele levanta antes de...!?"
A Mari desandou a chorar. Um choro machucado, triste, de mágoa mesmo.
"Eu nunca pude vê-lo na intimidade, mamãe! Mas acho que não levanta, não!"
"Então fica fria que o Gugu é macho! Homem nenhum levanta o assento! E ainda respinga em volta!"
"Não, você não entendeu! Ele não respinga em volta, mamãe!" A Mari falava aos soluços. "Nosso banheiro é limpinho e cheiroso! Sempre me orgulhei disso, mamãe!"
"Então volta pra casa, filha! Eu não conheço homem que não respingue em volta! E que mije sentado menos ainda!!!"
Tailor Diniz escreve no Popular às sextas-feiras
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