O céu resplandecia um azul profundo. Demétrio beijou sua mulher e saiu para mais um dia de trabalho. Ao dar a partida no carro, acendeu um cigarro, pensativo, Lembrava das sandálias azuis que ela usava quando jovem. Aquilo é que era mulher: os dedos pequeninos esmagados pela tira de couro, o andar malemolente e maroto. Na porta do prédio, o colega o aguardava. Os dois entraram com porte de homens da lei.O quarto era o inferno, cenário de briga, cacos pelo chão. A moça aparentava uns vinte e poucos anos. "Bonita, até...", os dois comentaram. Do fundo de uma gaveta aberta, o colega lhe alcançou uma folha amassada, escrita em caligrafia nervosa. Antes de começar a ler, Demétrio levou um susto ao vislumbrar, perto da cama, um pé solitário da sandália azul de tiras. "Uma coincidência infeliz", pensou, acendendo um cigarro.
Se isso tudo parece muito abstrato é porque as catarses foram omitidas. As pessoas só pensam em seus rabos. Agiotas deviam dar dinheiro. Pagos para dar dinheiro. Quero começar pelo fim e terminar começando de novo. Será uma chance em mil... coincidência? Perguntem à polícia, eu não sou paga pra isso. Carrossel, serragem de papoulas, tritura, mói corações. Músculo besta, pára! de meter-te em minha vida, me sufocar.
Sonho com não desejar o desejo mais do que o objeto que o justifica. Mas quero melhorar, vou melhorar. Ser como um daqueles finais de filme bem bestas, enquanto os créditos sobem, eu abro a última porta do labirinto e sumo. No velório, belas moças de luto com flores roxas nas mãos depositam seus verdes olhos sobre este ex-mim estendido no esquife. Pisco. Vens sempre aqui? No fim, dissolvo-me ao sol. E os vermes me brindam sua carícia faminta. Um fantasma no mundo material. Me abrace forte, vamos fingir que alguma coisa mudou. Somos todos iguais. Vocês. Guilhotinada a beleza, enforcaram a paixão. Querem-me parte disso tudo que não sou. Posso tentar. Ao calor do sol abraços de mousse. Macios ósculos de marshmallow. Você quer?
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