Cacilda estava cansada. Deitou-se para dormir como há anos não fazia e sonhou. E Cacilda jamais fora uma grande sonhadora: dormia, acordava, executava suas tarefas, satisfazia o marido, dormia. Ela permaneceu indefinidamente ali, imóvel, em êxtase. A respiração cada vez mais calma e vagarosa, Cacilda tornou-se um casulo sem sopro. Não tinha a consciência restritiva de estar sonhando, e no fundo não estava.
Mas desta vez Cacilda sonhou. Constrita, ela aspirava flores de perfumes raros. Uma agradável melodia de órgão lhe enchia os ouvidos. Cacilda vestia uma leve túnica de crepe muito fino, os mamilos entumescidos ao toque da seda. Via rostos como que flutuando em procissão sobre seu corpo: o viúvo, a filha mais velha, o caçula e a cachorrinha Lili. Ela se revolveu lentamente, uma onda de calor invadindo-a, as pontas dos dedos enrijecidas de prazer. Sentia-se desejada ― os olhos pesando sobre seu corpo, a pele nervosa e arfante.
Horas depois ela continuava anestesiada por aquele doce torpor.
E súbito seus olhos estalaram: abertos. Tudo o que viram foi o breu total. De um sobressalto, ela inspirou sôfrega o ar, que lhe faltava. Apenas sugou o perfume sufocante das flores, condenadas a murchar ali, sobre o toque macio do veludo. Cacilda forçou a tampa do caixão com um golpe violento, mas seus músculos não responderam. A garganta seca não gritou.
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