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    DANIEL GALERA
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Caiu da cadeira e acabou empalado

Terça, 23 de abril de 2002, 11h54



Como todo médico plantonista do Pronto Socorro, o Dr. Eugênio tinha um monte de boas história para contar. Ainda na madrugada anterior, atendera um suicida frustrado que correra em direção à parede segurando um espeto de churrasco apontado para o peito. Na semana anterior, foi bastante comentado entre seus colegas o caso de uma adolescente que chegou em casa depois de um fim-de-semana na praia e, para aliviar-se do mormaço porto-alegrense, saiu correndo do carro e atirou-se na piscina. Que estava vazia. Mas nada era mais clássico do que os casos diários de pessoas com objetos entalados no reto. O próprio Dr. Eugênio já tivera a chance de devolver ao mundo garrafas, tubos de desodorante, cabos de ferramentas, saleiros, pepinos, cenouras e outras variedades de embalagens, leguminosas e objetos fálicos. A parte engraçada é que ninguém admitia ter introduzido nada em lugar nenhum propositalmente, e a desculpa era sempre uma variação da mesmíssima história: o sujeito tinha tropeçado ou caído de uma escada, sentando sobre o corpo estranho e engolfando-o acidentalmente.

Era nisso que o Dr. Eugênio pensava neste momento, constatando que uma embalagem de inseticida SBP fora abduzida pelo seu traseiro. Estava sozinho em casa, a esposa estava passando alguns dias em um spa. Dr. Eugênio tinha acabado de sair do banho e, pelado, subiu na cama para ligar o ventilador de teto. Escorregou e caiu sentado no chão. Durante a queda, ele antecipara a dor do choque com o chão, mas o que sentiu foi algo muito mais intenso e ambíguo. Depois de entender o que tinha acontecido, ainda tentou extrair o tubo de inseticida com as mãos, aplicando um pouco de lubrificante ao perímetro do esfíncter anal e realizando movimentos pélvicos, mas o objeto era demasiado grande e sua musculatura estava tensa em excesso. Sentindo fortes dores e com dificuldade para se movimentar, não viu opção: telefonou para o hospital e solicitou uma ambulância.

Os enfermeiros que o atenderam em casa eram conhecidos do hospital. Dr. Eugênio prontamente explicou como procedera seu terrível acidente, mas os risos escarninhos dos enfermeiros demonstraram que não estavam acreditando em uma palavra. Ainda mais quando notaram o tubo de lubrificante ao lado do corpo agonizante do médico, que o utilizara na sua primeira tentativa de livrar-se do intruso.

No hospital, Dr. Eugênio foi atendido por um de seus colegas mais próximos, o Dr. Aníbal. Chocado, o colega evitou fazer comentários. Eugênio insistia:

- Foi acidente. É a mesma história de todo mundo, né? Haha. Mas no meu caso é verdade. Pô, Aníbal, tu me conhece, cara.

Aníbal não ria. Dr. Eugênio sabia que estava soando exatamente como os demais pacientes que chegavam toda semana ao Pronto Socorro com o mesmo problema. Ninguém acreditaria nele. Enquanto era anestesiado por Aníbal, outros plantonistas chegavam ao ambulatório para checar a veracidade dos rumores.

Quando acordou no leito hospitalar, a esposa estava a seu lado.

- Foi um acidente, amor. Eu juro!

- Eu sei, Eugênio. Eu sei.

Não falaram mais no assunto. Era evidente para o Dr. Eugênio que a própria mulher duvidava dele. No jornal de terça, o caderno de saúde do jornal trazia uma reportagem sobre os riscos enfrentados pelas pessoas que praticam a masturbação introduzindo objetos diversos na vagina e no ânus. Um de seus colegas do hospital revelava em seu depoimento que havia até mesmo casos de médicos atendidos por este problema.

Dr. Eugênio suspirou, resignado. Seu acervo de boas histórias sofreria alguns cortes.

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