A idéia me veio por acaso, encontrei em um site uma foto do diretor do grande portal de Internet onde eu trabalhava, o véio todo bonitinho, com um sorriso confiante. Baixei a foto e passei a tarde toda fazendo uma montagem perfeita, do diretor sendo enrabado por um sujeito com máscara de couro (outra foto que achei na rede, se acha tudo ali). No fim do expediente, acessei o sistema de publicação do portal, coloquei minha senha e publiquei a fotomontagem na capa, bem no meio. Coloquei meu casaco e fui pra casa. Ligaram pra minha casa na noite do mesmo dia, é claro que o sistema de publicação registra cada ação de cada funcionário, descobriram que eu era o autor da malandragem e me demitiram. Na madrugada, todos os outros sites de notícia já publicavam cópias da capa do portal com a minha fotomontagem do diretor. No dia seguinte as ações da empresa caíram lá embaixo, estava em todos os jornais, foi um auê.Um mês depois eu consegui um emprego numa grande agência de publicidade, sou fudido no Photoshop, os caras me respeitaram. Fiquei uns dias lá finalizando os anúncios que o pessoal da Criação me passava, regulando as cores, coisa e tal. Um dia me passaram um anúncio asqueroso de uma empresa de telecomunicações, que exibia uma cifra de valor em dinheiro, mas ao invés dos algarismos havia pessoas, uns modelos jovens sorrindo como se fosse legal uma pessoa ser tratada como um produto, uma coisa a ser convertida em dinheiro. Bah, aquilo me deixou puto. A saída do anúncio tava atrasada, iam imprimir os outdoors sem fazer prova antes, e como eu era o cara que revisava os arquivos antes de mandar pra gráfica, aproveitei pra mudar um pouquinho o anúncio, tirei todos aquele modelos e coloquei uma imagem de um cu em close-up bem no meio do outdoor, com o logotipo da empresa de telecomunicações no canto inferior esquerdo. Ficou uma jóia. Quando os outdoors foram colocados na rua, a comoção foi grande. O meu chefe na agência tentou me agredir, foi bem chato, nem preciso dizer que fui pra rua, mas alguns colegas meus gostaram do que eu fiz, alguns deles eram bem bacanas.
Descobri que nenhuma empresa do setor de comunicação me queria como empregado depois disso, mas tudo bem, não me desesperei. Procurei trampo em tudo que é lugar e acabei virando motorista de táxi, nem precisava ter o carro, eles têm um monte lá, tu só dirige. Meu ponto era no aeroporto, a maioria dos clientes era pessoal que chegava de viagem e só queria ir logo pra casa descansar ou ir direto para suas empresas para voltar ao trabalho o mais rápido possível. Tinha uns clientes que reapareciam direto, toda semana, e vou te dizer uma coisa, esse pessoal gasta uma grana federal em táxi, puta merda. Comecei a ficar com pena, qualquer corridinha do aeroporto dava vinte, trinta reais, os coitados catando moedinha na carteira pra conseguir pagar. Comecei a largar alguns clientes sem cobrar nada, e eles ficavam tão felizes que eu ficava feliz junto e comecei a fazer isso sempre, até que a empresa de táxi descobriu e me mandaram pra rua na hora, quiseram me processar, foi um saco. A agência de publicidade, a empresa de telecomunicações e o diretor do portal de internet já tavam me processando, e a coisa ficou meio foda. Resolvi fugir, peguei um ônibus e fui pra casa da minha vó no interior, sem avisar ninguém.
A cidade era pequena, tinha pouca coisa pra fazer, até que um dia eu descobri uma máquina de escrever antiga num quartinho dos fundos da casa. Tava funcionando, a danada. Comprei pilhas de papel e decidi ser escritor, pô, tem uns que ganham uma nota, esse Paulo Coelho aí, entre outros. Tentei fazer uns livros que nem o dele, depois tentei fazer um tipo aqueles do Machado de Assis, uns romances, contos, mas era chato demais, meio difícil também. Não curto essa literatura metida a besta. Resolvi que ia fazer um livro diferente, bem do jeito que eu queria, e a idéia veio meio por acaso, como veio aquela vez a idéia de publicar a fotomontagem do diretor na capa do portal. Escrevi um livro chamado "A CAVALGADA", e era assim: "Pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré, pangaré..." e assim prosseguia até a página 587, e terminava com uma palavra que eu inventei, "WHOOOOOOOOAAAAA!!". Mandei para a maior editora do país, eles publicaram, vendeu 2 milhões de cópias, foi traduzido para 13 idiomas e hoje eu tou tribem na foto.
Leia a crônica anterior
Veja as notícias »