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    ALEXANDRE RODRIGUES
alex.rod@terra.com.br

Como diz o ditado – Parte 2

Quinta, 29 de agosto de 2002, 21h59



Anos antes, José pôs o quadro na parede porque achou na frase a sua filosofia de vida. A frase de Murphy, Se algo puder dar errado, dará.

Escreveu um cartaz, emoldurou e pendurou bem alto. Criou o hábito de levantar os olhos para a frase, dar uma risada e voltar ao trabalho. Os outros empregados acharam graça da piada, mas ninguém foi falar com José, o gerente de compras. Embaixo do mesmo quadro, o patrão um dia o chamou. O patrão falou da situação da economia, da globalização, da produtividade e adequação aos novos padrões. Falou da crise mundial e de desafios. Falou outras coisas que José não entendeu, mas entendeu quando ele disse: temos uma vaga na gerência-geral e queremos alguém ousado, você foi promovido.

Do escritório, ligou para Cátia, que trabalhava em outra empresa. Os dois fizeram planos e promessas. Planejaram um segundo filho e juntar dinheiro para conhecer a Europa. No dia seguinte, foram juntos ao banco. Apartamento, dois quartos em Copacabana, financiamento da Caixa, trinta anos para pagar, juros, correção, atualização. Para comemorar, José bebeu duas garrafas de vinho em um restaurante italiano e voltou desmaiado para casa. No dia seguinte, teve que acordar de ressaca e ajudar a organizar a mudança. Com dor de cabeça, só esqueceu o mau humor quando viu a frase no caminhão de mudanças: Quem espera, sempre alcança.

José já tinha trinta e cinco e pouco cabelos no alto da cabeça quando chegou o e-mail. Só uma frase no corpo do texto: Abre o olho. Comentou com Cátia, esquisito, né? Não só isso, me disseram que tem jeito de esconder o nome de quem tá mandando. A mulher fez duas perguntas e depois mudou de assunto. Ele tentou falar de novo sobre o e-mail, mas Cátia dormiu mais cedo do que de costume.

Uma semana e recebeu outro. A mesma mensagem, abre o olho. Outra semana, mais um e a mesma mensagem.

Quando os e-mails passaram de dez, José chamou o funcionário do suporte.

Não dá mesmo para descobrir quem tá mandando?

É quase impossível, mas dá.

Combinaram que o serviço ia entrar na conta da empresa. O funcionário prometeu pedir ajuda a um professor da faculdade e sumiu por uma semana. O cara, ele disse quando voltou, trabalha aqui mesmo.

José reconheceu um vizinho com quem fazia cooper de vez em quando. Um tipo que morava com a mãe, duas quadras depois da sua. Os dois ficaram frente a frente, mas o vizinho, de cabeça baixa, não o olhou. José voltou furioso para a sala. Não perguntou o motivo daquilo tudo. Na mesma tarde, mandou demitir o vizinho.

Só entendeu duas semanas depois, quando Cátia e o dono do caminhão de mudanças fugiram com os móveis, o dinheiro e tudo mais. José não a procurou e nem deu queixa na polícia. Também não comprou móveis novos. Se acostumou a andar pelos cômodos vazios com uma calma estranha e entorpecedora. Tudo mais eram pensamentos soltos e ilógicos. Também sentiu vontade de chorar, mas mordeu os lábios e sufocou as lágrimas porque homem não chora.

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