"Tô escrevendo pra dizer que tô querendo ler crônica nova. (...) Nem que seja alguma outra história como a do teu amigo que fez xixi na cama de baixo do beliche. (...) " Marília Pinheiro Olson, 06.nov.02
Eu devia ter uns seis anos. Era uma tarde abafada, uns 98% de umidade do ar. Eu estava na casa da Vila Lisboa, parada 50 de Viamão (Grande Porto Alegre, pros de fora) - o que significa que devia ser fim-de-semana ou férias, já que nos dias de semana eu passava as manhãs em um jardim de infância na capital e as tardes na casa da minha vó materna. Eu assistia a TVS, que era como se chamava o SBT, e estava dando um desenho que reunia os personagens da Warner, não sei se era Turma do Gaguinho ou Turma do Pernalonga. Alguma coisa estranha devia ter na mamadeira (vício que mantive até os 8 anos), pois naquele instante me dei conta que ia morrer.Assim, do nada. Alguma sinapse o meu cérebro fez que de uma hora para outra eu estava lá, com meus shorts pretos, minha camisa do Mickey e minhas sandálias, na cama dos meus pais, chorando porque ia morrer. A Marlene, empregada da família até hoje, veio ver o que era aquele berreiro, e tudo o que eu dizia entre soluços era: "Eu... não... que... que... ro... mo... morrer." Meu irmão, se estava em casa, deve ter rido muito, mas não lembro dele. Não, capaz, se eu tinha 6 ele tinha 3, nem sabia o que estava acontecendo.
Sem ter muito como me ajudar, a Marlene disse que eu ligasse para a Vó. Talvez porque a Vó, então com 60 anos, fosse a pessoa das minhas relações mais próxima de morrer _o que seria até mórbido. Mas mais provavelmente para não atrapalhar meus pais no trabalho com ânsias existenciais precoces.
"Vóóóóó?"
"Oi, Emi. Tu estás chorando? Te acalma."
"Vó, eu não quero morrer."
A Vó riu. "Por que tu estás dizendo isso, meu neto?"
"Vóóóóó, eu não queeeeeeero morrer!"
"Mas Emiliano, todos nós vamos morrer um dia."
"Vó, Vó: e se eu virar um cientista e descobrir uma fórmula de transformar gente em bicho. Aí eu me transformava em bicho e não morria."
"Bicho também morre, Emiliano."
E não havia santo _nunca houve_ que me fizesse parar de chorar.
Chegou a chuva, chegou a noite e passou a angústia. Nem lembro como. Que nem soluço.
"(...) Se quiser, seguir no assunto 'filmes'. " de novo a Marília
Vi "O filho da noiva", argentino, comédia _forçando, comédia romântica. Bom. Muito bom. Lá pelo meio o cara diz pra ex-mulher que quer ir pro México e levar a filha. A ex logo responde: "Como assim? Onde ela vai estudar? Quem vai dar aula para ela? O Professor Girafales?"
Chavez deve ser a maior contribuição do México para o imaginário universal no final do século XX.
"(...) Ou então, olha que idéia legal, escreve uma crônica inspirada na amiga A. Algo entre o fofo e o cômico." ainda a Marília
A A. me ligou domingo de noite. Eu leio o jornal jogando fora os cadernos que termino, ela não consegue se livrar de nada. Ela sempre quis usar óculos, eu desisti dos meus. Queremos ir pra praia - Matinhos, no Paraná, para nada. "Parabólica", já cantava o poeta.
"A aparição do ET em Passo Fundo retratada no filme Sinais realmente aconteceu ?" Jocelito Santos, 8.nov.02
Não! Gravaram na Filadélfia, na casa de alguém, metade dos atores são portugueses e o personagem que filma a cena tem um nome de mariachi. Bom, porque o cara escolheu Passo Fundo entre milhares de cidades do mundo? Pesquisando na "Internet, a rede mundial de computadores" - não dá vontade de catarrear na orelha de quem fala assim? - achei várias referências à uma foto que teria sido tirada na cidade em 1976, que mostra um disco voador sobre uma coxilha (colina, pros de fora).
Tá, mas porque Passo Fundo? Minha teoria é de que ele foi pelo inusitado. Nos EUA, onde os ETs sempre aparecem em lugarejos como Shavemyass Bridge, Missouri ou Pussyheaven, Massachussets. No Brasil eles são mais cosmopolitas (cosmo, hein? hein?): surgem na Baía de Guanabara e distraem os banhistas, ou assustam a Tiazinha na Marginal Tietê. E no meio disso tudo, Passo Fundo, que alguém teve ter traduzido para o diretor ("Deep Step? Amazing!"). Aliás, como resistir ao charme da capital do Planalto Médio, terra de aumentativos como Felipão e diminutivos como Camilinha? O que, ainda não conhecem a Camlinha? Vão se informar, não posso dar tudo de mão beijada pra vocês.
"Caro Emiliano, desistiu de sua coluna?! Hehe brincadeira, as coisas devem estar complicadas pra vc, né?! Falta de tempo, ou sei lá..." Heloísa Hoon, 08.nov.02
Quase desisti de minha coluna. Nã, brincadeira, as coisas estão complicadas para mim, é. Falta de tempo, ou sei lá... Nada de original, como você pode ver.
"Se vc tá sem saco pra escrever, arruma uma mulher e conta na tua coluna como foi." Rogério Martins, 11.nov.02
Foi assim: eu estava atravessando a Ipiranga com a São João (é sério, é meu caminho pro trabalho) e no canteiro central pechei (bati, pros de fora) em um mulher que vinha em desabalada corrida, frenética ("eu sei que eu sou/bonita e gostosa", isso mesmo). Paramos os dois. Ela, linda, loira e japonesa, havia deixado cair a bolsa. Gentilmente juntei a bolsa da mulher e alcancei para ela. Ela ainda estava nervosa e colocou a bolsa meio atravesada, amassando a blusa. Estiquei os braços e corrigi a posição da alça em relação aos ombros. Ela sorriu e agradeceu. O sinal abriu, cada um foi para seu lado: eu havia arrumado uma mulher.
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