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Por que o salário mínimo na Alemanha não é tão bom quanto parece

8 jan 2019 - 12h23
(atualizado às 15h05)
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Quem trabalha em tempo integral e recebe salário mínimo está livre da pobreza. Mas muitos governos europeus não conseguem realizar esse objetivo, inclusive a Alemanha. Com filhos, por exemplo, a conta não fecha no país.A Alemanha tem um dos maiores salários mínimos da Europa. Quem trabalha em tempo integral com um salário mínimo, ganha cerca de 1.500 euros (valor bruto) por mês no país, o equivalente a cerca de R$ 6.300. E o índice só aumenta: a partir desse início de ano, empregadores têm que pagar pelo menos 9,19 euros por hora a seus funcionários, 35 centavos a mais do que antes.

Apesar de oferecer um dos mais altos salários da Europa, Alemanha se sai mal quanto o assunto é salário mínimo
Apesar de oferecer um dos mais altos salários da Europa, Alemanha se sai mal quanto o assunto é salário mínimo
Foto: DW / Deutsche Welle

Comparados aos de outros países europeus, os empregados alemães parecem estar se saindo bem de um ponto de vista meramente matemático. O país não chega a superar a liderança de Luxemburgo, que oferece salários mínimos de quase 2 mil euros (valor bruto) por mês. Mas, ainda assim, a Alemanha está bem longe do pé da lista.

Para entender como de fato se vive com um salário mínimo, contudo, tais rankings não são suficientes. Por isso, a fim de medir a renda mínima que se ganha quando se trabalha em período integral, a DW analisou os 22 países europeus onde vigoram políticas de salário mínimo, com base em dados de 2017. Apesar de os números serem complicados, a questão que se colocou foi relativamente simples: em que países corre-se risco de pobreza, mesmo quando se trabalha 100%?

Na Alemanha, com o antigo salário mínimo de 8,84 euros por hora e descontados impostos e contribuições sociais, um adulto solteiro sem filhos ainda poderia levar 1.110,50 euros para casa (cerca de R$ 4.700), segundo os cálculos da DW. O que não é muito: apenas 14,50 euros separam essa renda do limiar oficial da pobreza.

Pelos critérios da União Europeia, considera-se que um adulto é vulnerável à pobreza se ganhar menos de 60% da renda média de seu país. A renda média é o nível de renda superado pela metade da população e, ao mesmo tempo, não alcançado pela outra metade.

Assim, o limiar da pobreza mede a pobreza relativa: quem é pobre na Alemanha só é pobre em comparação com o alemão típico. Já em comparação com um romeno típico, pode ser que ele ou ela tenha, por mês, consideravelmente mais.

Ao mesmo tempo, porém, a linha da pobreza diz algo sobre a posição que os trabalhadores com salário mínimo ocupam na sociedade: com que facilidade eles podem participar da vida cotidiana e manter o padrão de vida considerado normal em seu país? Essa é a razão pela qual a linha da pobreza, apesar de seus inconvenientes, ainda é amplamente usada para elaborar políticas e estudos sobre desigualdades.

Ameaça de cair na pobreza

Os 35 centavos adicionais por hora não elevarão os assalariados na Alemanha muito acima da linha da pobreza: com um emprego em tempo integral, isso equivale a cerca de 35 euros líquidos por mês, segundo estimativas da DW. Os funcionários com renda mínima, assim, estão bem longe de uma renda média.

Para fins de análise, usa-se como base a situação mais favorável em que um beneficiário de salário mínimo pode se encontrar: solteiro, sem filhos, trabalhando em tempo integral. Supõe-se também que ele receba todos os benefícios aos quais tem direito. O que sobra então, mensalmente, depois que os impostos e as contribuições sociais são pagos, chama-se rendimento disponível, critério também usado como base para o cálculo da linha da pobreza pela UE.

Por essa métrica, a Alemanha fica para trás na lista: apenas Estônia e Letônia estão em situação pior. Lá, até mesmo pessoas solteiras em empregos de tempo integral e com salários mínimos são consideradas em risco de pobreza. Mas mesmo em Luxemburgo, o país com o salário mínimo mais alto da Europa, os trabalhadores superam por pouco o limiar da pobreza.

No topo da nova lista está a Romênia. A linha da pobreza do país é de apenas 137 euros por mês por família. Com um emprego em tempo integral, o salário mínimo romeno garante quase o dobro disso.

Mas uma das razões pelas quais a Romênia tem uma colocação tão alta é que os salários, em geral, já são bastante baixos no país, explica Thorsten Schulten, especialista em política trabalhista na Europa pela Fundação Hans Böckler: "Em países com baixos salários, o salário mínimo, quando visto de forma relativa, é melhor do que nos países com salários mais altos", afirma.

Uma situação semelhante, embora não tão extrema, pode ser encontrada em países economicamente mais fracos, como a Grécia ou Portugal, onde os salários são menores que a média europeia. A pobreza absoluta, contudo, é generalizada na Romênia: de acordo com dados da UE, quase um terço da população não pode se dar o luxo de substituir roupas velhas por novas.

Reino Unido e Holanda se saem melhor

Mas mesmo alguns países onde os salários médios são significativamente mais altos apresentam um desempenho melhor do que a Alemanha: no Reino Unido, por exemplo, o salário mínimo fica 650 euros por mês acima da linha da pobreza. Na verdade, fica até próximo da renda de nível médio.

Em grande parte, isso se deve à assistência social à qual muitos assalariados com pagamento mínimo podem ter acesso: com o auxílio de subsídios habitacionais e benefícios salariais por parte dos empregadores e baixas taxas de impostos, quem ganha o salário mínimo pode contar com até 300 euros a mais por mês além do salário bruto. Na Holanda, a situação é semelhante.

Na Alemanha, por outro lado, quem vive sozinho recebendo salário mínimo não só não recebe nada, como paga contribuições sociais relativamente altas: só essas já consomem até 300 euros por mês do salário bruto.

Este é um problema para muitos trabalhadores alemães com baixos salários, diz Barbara Binder, que pesquisa a desigualdade de renda no Instituto de Tecnologia de Karlsruhe (KIT). "As contribuições sociais na Alemanha já são muito altas desde a base salarial, e é interessante ver como diferentes países europeus avaliam a quantidade de apoio à qual recebedores do salário mínimo deveriam ter acesso", pondera.

Mas, mesmo sem o apoio do Estado, assalariados do Reino Unido e da Holanda ainda dispõem de cerca de 30% a mais por mês do que alguém com remuneração próxima da linha da pobreza. Uma razão para isso pode ser a chamada "Living Wage Campaign" ("Campanha pelo Salário de Subsistência", em tradução livre) no Reino Unido, que há anos vem influenciando a discussão sobre salários mínimos.

A Fundação Living Wage, por exemplo, defende um salário mínimo para empresas e políticos com base no custo real de vida no Reino Unido. Atualmente, como em muitos países europeus, o sistema funciona com base na relação do salário mínimo com salários médios no país.

O patamar de cerca de 10 euros que, segundo a fundação, representaria um mínimo adequado, ainda não foi alcançado. Ainda assim, a campanha tem influenciado a política: após aumentar o salário mínimo em 2016, o governo britânico agora fala oficialmente no "National Living Wage", ou "salário nacional de subsistência".

Com filhos, a conta não fecha

Surpreendentemente, há pouca informação sobre quem recebe o salário mínimo e que padrão de vida ele garante. "Mesmo nas pesquisas, especula-se muito sobre isso", diz Barbara Binder, do KIT. Em geral, sabe-se que as mulheres, os mais jovens, as pessoas com deficiências, as minorias étnicas e aqueles de menor educação têm tendência a receber menos.

Na Alemanha, 60% dos habitantes que recebem salário mínimo são mulheres.

Para quem não trabalha em período integral, é ainda mais difícil fechar as contas no final do mês com um salário mínimo. Na Alemanha, quase metade dos que recebem salário mínimo são "mini-empregados" ("Mini-Jobber"), ou seja, que trabalham algumas horas semanais por um máximo de 450 euros por mês.

Outros 30% trabalham meio expediente. Para essas pessoas, e especialmente para famílias com crianças, a situação é muito mais difícil: cálculos do governo alemão mostraram, por exemplo, que mesmo salários mínimos não são suficientes para cobrir o custo de vida de pais solteiros que trabalham em tempo integral na Alemanha.

E a Alemanha não está sozinha: uma família com dois filhos na Romênia precisaria de pelo menos 710 euros por mês para cobrir todas as despesas necessárias, de acordo com uma pesquisa da Clean Clothes Campaign entre trabalhadores da indústria do vestuário.

A Romênia aumentou muito seu salário mínimo nos últimos anos. Desde 2010, ele quase triplicou: trabalhadores romenos têm hoje direito a pelo menos 2.080 leus romenos por mês, o que corresponde a cerca de 447 euros (ou R$ 1.907). Tais aumentos fizeram subir a renda de muitas pessoas para atender ao novo mínimo.

No momento, a Romênia tem, de longe, a maior porcentagem de recebedores de salário mínimo na Europa: de acordo com o relatório Eurofound da UE, 40% dos contratados no país receberam o salário mínimo em 2017. Em comparação, na Alemanha, o mesmo foi observado em apenas 3,6% de todos os empregos, ou 1,4 milhões de cargos no período.

Embora isso pareça preocupante à primeira vista, uma alta proporção de trabalhadores com salário mínimo não é necessariamente ruim. Na Romênia, pelo menos, indica que a situação de muitos funcionários melhorou nos últimos anos.

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