R. Kelly: quem é o músico que foi condenado por abuso e tráfico sexual de mulheres e menores
O artista americano foi considerado culpado de organizar um esquema que durou décadas e no qual ele se aproveitava de sua fama para atrair suas vítimas.
Reportagem atualizada em 27 de setembro de 2021.
John Legend o descreveu como um abusador "em série", Lady Gaga se desculpou por ter trabalhado com ele e o cantor Neyo diz que não há "desculpa" para não boicotá-lo.
Há 20 anos, o músico americano R. Kelly enfrenta diversas acusações de assédio e abuso sexual — sendo muitas denúncias envolvendo adolescentes.
Agora, o cantor de 52 anos foi condenado pela Justiça americana, embora negue ter cometido qualquer crime.
Kelly foi considerado culpado de organizar um esquema para se aproveitar de sua fama para abusar sexualmente de mulheres e menores de idade ao longo de duas décadas.Onze vítimas, nove mulheres e dois homens, depuseram durante o julgamento de seis semanas e descreveram a humilhação e a violência que sofreram em suas mãos.Após dois dias de deliberação, o júri considerou Kelly culpado de todas as acusações que enfrentava. Ele deve receber sua sentença em 4 de maio e pode passar décadas atrás das grades.
Os promotores acusaram Kelly, cujo nome completo é Robert Sylvester Kelly, de usar sua fama e fortuna para atrair vítimas com promessas de ajudar em suas carreiras musicais.
Várias de suas vítimas testemunharam que eram menores de idade quando ele as abusou sexualmente.
O veredicto veio 13 anos depois de Kelly ser absolvido das acusações de pornografia infantil, após um julgamento no Estado de Illinois.Ao contrário das condenações de outras celebridades como o comediante Bill Cosby e o produtor de cinema Harvey Weinstein, a maioria das vítimas que ajudaram a condenar Kelly eram negras.Ele também foi considerado culpado de tráfico sexual interestadual e extorsão, uma acusação normalmente usada contra organizações criminosas.
Kelly está sendo julgado separadamente em Chicago por pornografia infantil e acusações de obstrução da Justiça. Ele também deve enfrentar acusações de abuso sexual em Illinois e Minnesota.
'Silencie R. Kelly'
Apesar de tudo isso, os grandes sucessos de Kelly ainda são tocados por DJs de todo o mundo, ele tem um enorme fã clube e é considerado uma das maiores estrelas do gênero R&B (de rhythm & blues, a corrente mais comercial da música negra com influências de soul, funk e jazz).
No entanto, várias celebridades se posicionaram agora contra ele após o lançamento na série documental Sobrevivendo a R. Kelly, de 2019, sobre os crimes cometidos por ele.
Muitas das acusações pelas quais ele foi condenado agora foram apresentadas pela primeira vez no programa de TV.
Dividida em seis episódios, a série expõe detalhes de denúncias de abuso físico e emocional de mulheres, inclusive menores de idade, durante várias décadas.
Alega ainda que o cantor de R&B conduzia uma espécie de "culto" em que mantinha mulheres sob seu domínio, contra a vontade delas.
Assim como Lady Gaga, outros artistas como Chance the Rapper e a banda francesa Phoenix também pediram desculpas por terem trabalhado com ele.
Já Omarion, vocalista do grupo B2K que teve alguns de seus maiores sucessos produzidos por R. Kelly, disse que a banda não vai mais tocar suas músicas.
A campanha "Silencie R. Kelly" — que prega o boicote de suas músicas e shows — ganhou, assim, fôlego novo.
Ela foi lançada em 2017 depois que outras denúncias contra o músico vieram à tona e ganhou força no ano seguinte, quando rostos famosos como a cineasta Ava DuVernay e a cantora Janelle Monae apoiaram o movimento.
O documentário inclui diversas entrevistas. Uma delas é com o cantor John Legend, que disse acreditar nas mulheres, descrevendo Kelly como um abusador "em série".
O diretor, Dream Hampton, disse que o filme mostra como Kelly "construiu um ecossistema ao redor de sua predação" de quase três décadas, "predando jovens e vulneráveis mulheres".
'Monstro'
Diante do documentário, a filha de R. Kelly rompeu com o silêncio sobre as denúncias de abuso sexual contra o pai. Em um post no Instagram, Joann Kelly, ou Buku Abi (seu nome verdadeiro), disse na época estar "arrasada".
Buku, de 20 anos, diz que não vê ou fala com o pai há anos. Chama ele de "monstro" e de pai "terrível".
Ela disse apoiar as supostas vítimas do pai. Ela também explicou por que esperou para falar sobre as alegações, dizendo que demorou para ficar bem em relação a isso.
"Tem sido muito difícil lidar com tudo isso", escreveu em um "story" no Instagram. "Fora reunir as palavras certas para expressar tudo o que eu sinto."
Buku disse a seus seguidores no Instagram que ela reza para todas as mulheres que dizem ter sido afetadas pelas supostas ações do pai.
Ela disse que não queria falar sobre sua vida pessoal nas redes sociais, mas por causa do escrutínio intenso sob o qual estavam seu pai e sua família, ela achava que era o momento certo.
"O mesmo monstro com quem vocês estão me confrontando agora é o meu pai. Eu sei muito bem quem e como ele é. Eu cresci naquela casa", disse. "Minha escolha de não falar sobre ele e o que ele fala é para minha paz de espírito. Meu estado emocional. E minha cura."
Já a cantora Lady Gaga, que também é ativista pelas vítimas de abuso sexual, foi pressionada a comentar sobre as alegações contra Kelly desde que colaborou com ele na canção Do What U Want (With My Body), de 2013.
A colaboração foi controversa desde o início. Naquela época, histórias sobre a vida pessoal de Kelly já tinham sido noticiadas e, em 2008, ele fora acusado de fazer uma sex tape com uma menor de idade - mas inocentado pela Justiça.
Em uma coletiva de imprensa no Japão em 2013, Gaga defendeu a colaboração. "R. Kelly e eu temos coisas que não são verdadeiras escritas sobre nós, então, de alguma forma, temos uma conexão."
Na semana passada, a cantora se desculpou por ter trabalhado com R. Kelly e disse que removeria o dueto Do What U Want de serviços de streaming — o que acabou ocorrendo.
Gaga disse que as histórias eram "horríveis" e "indefensáveis". "Eu apoio 1000% essas mulheres."
Carreira de sucesso
Robert Sylvester Kelly nasceu em Chicago, nos Estados Unidos, em 1967. É produtor musical, compositor, cantor e multi-instrumentista.
Entre suas obras, estão vários hits, como a música I Believe I can Fly, do filme Space Jam: O jogo do século (1996). Ele escreveu ainda You Are Not Alone (1995) para Michael Jackson e Gotham City do filme Batman & Robin (1997).
Trabalhou em parceria com artistas como Céline Dion, Janet Jackson e Jennifer Lopez, entre outros.
Kelly negou todas as alegações contra ele, e até divulgou uma música em que canta: "Sou tão falsamente acusado".