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Racismo em ascensão na Alemanha

9 jun 2020 - 13h17
(atualizado às 13h23)
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Relatório afirma que registros de discriminação racial mais que dobraram nos últimos cinco anos. Segundo entidade, casos de violência e ódio são apenas "ponta do iceberg" de atitudes comuns no cotidiano do país.Desde a morte violenta de George Floyd há duas semanas, uma onda de protestos varreu os Estados Unidos. Os quase nove minutos de agonia do afro-americano, vítima de brutal violência policial, também chocou muitos alemães. Apesar da pandemia, dezenas de milhares protestaram contra o racismo em cidades como Berlim, Munique e Colônia no final de semana passado.

Cidades alemãs como Berlim, Munique e Colônia vêm sendo palco de manifestações antirracismo
Cidades alemãs como Berlim, Munique e Colônia vêm sendo palco de manifestações antirracismo
Foto: DW / Deutsche Welle

Também denunciaram, com grande atenção da mídia, a discriminação que sofrem pessoas na Alemanha por causa de sua origem étnica. O racismo cotidiano, os tumultos xenófobos e os ataques extremistas de extrema direita, como os causados pela célula terrorista Clandestinidade Nacional-Socialista (NSU, na sigla em alemão), costumam marcar a imagem da sociedade também na Alemanha.

Novos números apoiam essas críticas e confirmam uma tendência sombria: a discriminação racial aumentou no país - e significativamente. De acordo com a edição de 2019 do relatório anual da Agência Federal Antidiscriminação (ADS) alemã, apresentado nesta terça-feira (09/06), o número de casos registrados na Alemanha aumentou quase 10%, chegando a 1.176.

As ocorrências de discriminação racial correspondem à maior parcela (33%) do total de pedidos de consultas feitos à autoridade, relacionados a vários casos de discriminação. Em 2016, essa parcela era de apenas 25%. Desde 2015 (545 casos relatados), a cifra mais que dobrou.

Fundada em 2006, a ADS aconselha pessoas discriminadas em consequência da origem étnica, religião, crença, identidade sexual, idade, deficiência ou sexo.

"A Alemanha tem um problema persistente com a discriminação racial e não apoia os afetados de forma consequente na aplicação da lei", disse o chefe provisório da entidade, Bernhard Franke, durante a apresentação do relatório. Franke alertou que o sentimento das vítimas após sofrerem uma injustiça "tem consequências fatais a longo prazo, que também colocam em risco a coesão social".

Traços de ódio na sociedade

No prefácio do relatório, Franke afirma que 2019 foi um ano em que "o ódio e a misantropia em relação a grupos deixaram traços profundos e dolorosos", lembrando desde o assassinato com fundo extremista de direita do político da União Democrata Cristã (CDU) Walter Lübcke, que se engajava em favor de refugiados, até o ataque terrorista a uma sinagoga em Halle. Mas ele lembrou também de "muitos pequenos incidentes, de discriminação cotidiana".

O significado disso em termos concretos é descrito pelos afetados, que são citados anonimamente no relatório. Eles sofreram discriminação em todas as áreas da vida cotidiana.

"Uma cliente recentemente gritou dentro da loja: 'Onde está meu negro? Eu gosto mesmo é quando ele massageia minha cabeça!'", afirma um deles. "Uma criança insultou meu irmão na escola porque ele tem pele escura. E então bateu nele. O professor viu tudo, mas não fez nada", relata outro.

"Dois colegas de um outro departamento me abordaram rindo e perguntaram se eu atuava na empresa fazendo café. Sou engenheira civil da Síria e disse ter sido contratada como engenheira. Então, eles riram ainda mais alto e perguntaram se eu trabalho de acordo com os padrões alemães ou sírios", conta uma terceira vítima.

"Ponta do iceberg"

O relatório anual afirma que muitos dos afetados têm a sensação de que a situação geral não melhora há anos, que ataques e assassinatos chocam a sociedade, mas que, "em última análise, as preocupações, medos e experiências de exclusão de pessoas de origem estrangeira não são levados a sério".

O texto ressalta que violência, ódio e incitações são apenas a ponta do iceberg de atitudes e ressentimentos racistas e xenófobos, que se manifestam muito mais frequentemente em ocorrências cotidianas.

"Desde o anúncio do apartamento, no qual 'estrangeiros não são desejados', na casa noturna, na qual 'pessoas como você' supostamente sempre causam problemas, ou com superiores no trabalho, que dizem que a piada racista do colega 'foi mal interpretada'."

Em 2019, uma em cada três pessoas de origem migratória que procurou um apartamento para morar nos últimos dez anos relatou ter sofrido discriminação. Ao mesmo tempo, 41% de todos os entrevistados em uma sondagem indicaram ter preocupação moderada ou grande em alugar um imóvel a um imigrante.

Embora a lei proíba a princípio tais desigualdades de tratamento, a proteção legal contra a discriminação racial no mercado imobiliário é, segundo a ADS, "caracterizada por algumas exceções". Um parecer jurídico encomendado pela agência afirma que a diretriz antirracismo da UE foi implementada de maneira insuficiente na Alemanha.

A ADS apela para que governos federal e estadual melhorem significativamente o status legal e as possibilidades de auxílio para as pessoas afetadas. A proteção contra ações governamentais também deve ser, na visão da agência, melhor definida e incluir claras consequências legais.

A presidente da CDU, Annegret Kramp-Karrenbauer, disse à DW que todos os aspectos de xenofobia e racismo seriam debatidos por uma comissão especial do governo. Entre as questões abordadas, estarão, segundo ela, a possibilidade da candidatura anônima a apartamentos ou empregos.

A ADS vê um passo importante na primeira lei estadual contra a discriminação aprovada recentemente por Berlim. A lei permite que as pessoas afetadas apresentem queixa, entre outras coisas, em casos de discriminação por policiais ou no campo da educação, e reivindiquem indenizações por perdas e danos morais.

Outros tipos de discriminação

No geral, a agência atuou em 3.580 casos de discriminação no ano passado. O número total de solicitações de consulta aumentou 3,6% em relação ao ano anterior. Além da discriminação com base na origem étnica, 29% de todas as queixas diziam respeito à discriminação de gênero.

Seguiram-se discriminações por deficiência (26%), idade (12%), religião (7%), identidade sexual (4%) e crença (2%).

De acordo com o relatório anual da ADS, a maior proporção de discriminação relatada ocorre no trabalho ou na procura de emprego. O segundo problema mais comum é a discriminação nos negócios do dia a dia, como procura de moradia, nas compras, em restaurantes, em apólices de seguros e serviços bancários.

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