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Relator da anistia no STF: Temo pela estabilidade política

Eros Grau disse que não deu sua opinião pessoal ao votar a favor da lei; segundo ele, anistia estabilizou as relações políticas

28 ago 2019 - 05h32
(atualizado às 08h36)
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Decidir sobre a constitucionalidade da Lei da Anistia foi o voto mais importante do jurista Eros Grau, de 79 anos, nos sete anos em que permaneceu como ministro do Supremo Tribunal Federal.

Relator da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental proposta pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) que questionava a legalidade da extensão da anistia para os agentes do regime militar que haviam sido responsáveis por violações dos direitos humanos, Eros Grau disse que não deu sua opinião pessoal ao votar a favor da lei aprovada em 1979.

"O que o tribunal fez quando julgou a ADPF (Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental)? Ele não fez justiça, ele aplicou a lei e a Constituição." Leia a seguir, a entrevista do ex-ministro.

O ex-ministro do STF Eros Grau, quando ainda integrava a Corte
O ex-ministro do STF Eros Grau, quando ainda integrava a Corte
Foto: André Dusek / Estadão

Como o senhor construiu o seu voto no julgamento sobre a anistia?

Seguramente, foi o meu voto mais importante no tribunal. Eu havia vivido momentos históricos importantes e sido preso duas vezes. Sabia que a anistia tinha de ser ampla, geral e irrestrita. Era isso que estava por detrás de todas as movimentações antes do surgimento da Lei da Anistia. Além disso, é importante ver o que está escrito na lei e o que está escrito é muito claro. O juiz, seja de 1.ª instância ou ministro de um tribunal superior, é responsável pela correta aplicação da Constituição e das leis. Não vai lá dar sua opinião pessoal e não pode ser vítima de seus sentimentos. Ele deve interpretar a lei ainda que não goste do que diz a lei. Ele terá o dever de proceder prudentemente. Quando falamos de jurisprudência estamos falando de prudência, e não de ciência, de paixão, de arte. É a prudência aristotélica. Ganhei alguns inimigos em razão do voto que dei. Aí entra outro ponto, que é profundamente importante em torno do qual tenho me batido: há uma distinção entre lei e justiça. Um juiz deve aplicar a lei. Ainda que não goste dela eu tenho de aplicá-la. E a justiça não tem nada que ver com a lei. E a justiça, como diz o profeta Isaías (32:15-17): 'O direito habitará no deserto e a justiça no vergel. O fruto da justiça será a paz. E o efeito da justiça será sossego e segurança para sempre'. Ainda bem que a leis existem, pois, mesmo quando os mais fortes dominam, eles precisam fazer leis que garantam a sobrevivência dos mais pobres. Essa diferença entre lex (lei) e jus (justiça) é fundamental. O que o tribunal fez quando julgou a ADPF (Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental)? Ele não fez justiça, ele aplicou a lei e a Constituição com serenidade e prudência.

Qual a importância da consolidação da anistia para o nosso ordenamento jurídico atual? 

Acho que ela foi fundamental na medida em que, a partir daí, estabilizaram-se as relações políticas. Atualmente, eu rogo a Deus nas alturas que isso permaneça, mas, hoje em dia, eu temo que isso não ocorra. 

Durante o seu voto no Supremo, o senhor recupera a historicidade do movimento pela anistia. Qual a razão disso?

É muito importante, quando um juiz ou um tribunal toma uma decisão, para se obter a correta compreensão - não a exata, pois o direito não é ciência nem arte, é uma prudência -, é importante para chegar a uma compreensão correta buscar as raízes daquele texto normativo que você vai interpretar e compreendê-lo como uma norma formada pela realidade.

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