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STJ tem decisões ambíguas sobre quebra de sigilo, diz professor

Professor de direito e advogado diz que Constituição foi cumprida, mas lembra que corte aceita situações semelhantes em casos de roubo e tráfico

24 fev 2021 - 17h45
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RIO - A decisão de anular a quebra dos sigilos fiscal e bancário do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), da 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), gerou um debate sobre a validade dessa ferramenta em investigações criminais. O professor de direito penal na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e advogado Salo de Carvalho considera a decisão "correta do ponto de vista constitucional, mas seletiva" pois contraria outros julgamentos da Corte.

Em entrevista ao Estadão, Carvalho afirmou que os sigilos fiscal e bancário são direitos fundamentais dos cidadãos e sua quebra deve ser muito bem fundamentada pela Justiça - e não apenas autorizada após pedido do Ministério Público. O problema, disse, é que o próprio STJ tem aceitado decisões "adesivas", com poucos fundamentos, como a do juiz Flávio Itabaiana, da 27ª Vara Criminal, sobretudo em casos de roubo, furto ou tráfico.

"O que chama a atenção, e pra mim é a grande reflexão, é que do ponto de vista constitucional, legal e doutrinário, a decisão está correta. O problema é que se pode notar certa seletividade na aplicação da Constituição, porque numa grande parte dos casos que chegam ao STJ essas decisões são admitidas", pontuou.

  • Como o senhor avalia a decisão do STJ?

Se a gente for analisar o histórico das decisões do STJ em casos similares - e estou falando sobretudo dos casos mais usuais que a corte julga, como furto, roubo, tráfico de drogas, o que chamamos criminalidade de rua - normalmente o STJ é mais condescendente com esse tipo de decisão, que a gente chama de adesiva, que é quando o juiz simplesmente remete o conteúdo de sua decisão a pedido do Ministério Público. É uma luta da academia, da doutrina do direito penal, de que uma decisão, pra quebrar um direito fundamental, tem que ser bem fundamentada. O juiz não pode simplesmente dizer 'tem razão o Ministério Público'. Ele tem que apresentar dados concretos que justifiquem que violar esses direitos fundamentais tem base sólida e indícios de delitos graves, e que só a partir daquela prova que se pode comprovar. Essa decisão de ontem, do ponto de vista da Constituição, do que se espera do ponto de vista judicial, está correta. A decisão do doutor Itabaiana aqui no Rio, própria forma, a própria estética de ser em cinco linhas, indica que não há uma fundamentação consistente. Na mensagem, posteriormente ele dá outra decisão, aí mais fundamentada, validando aquela decisão. Pra mim (a primeira) nem é uma decisão, é um despacho do doutor Itabaiana. É usual na jurisprudência do STJ considerar essa prova válida, embora do ponto de vista constitucional, a doutrina entenda que não. O que chama a atenção, e pra mim é a grande reflexão de ontem, é que do ponto de vista constitucional, legal e doutrinário, a decisão está correta. Não se pode admitir a quebra de um direito fundamental sem justificativa, sem fundamentação judicial. O problema é que se pode notar uma certa seletividade na aplicação da Constituição, porque numa grande parte dos casos que chegam ao STJ essas decisões são admitidas.

  • Essa decisão é válida somente na investigação envolvendo o deputado, ou os demais envolvidos no suposto esquema de rachadinha também se beneficiam dela?

Essa decisão atingiu um pedido do Ministério Público, que é um pedido de quebra de sigilo fiscal e bancário de 95 pessoas, entre pessoas físicas e jurídicas. Independente de qual pessoa dessas 95 ingressou com pedido de anulação, ela é aplicável a todos os demais, porque se atinge a decisão. Ela tem efeito geral em relação a todos.

  • O Ministério Público ainda pode recorrer?

Pode recorrer, tem os recursos cabíveis. Tem recursos internos ao STJ, e pode levar para análise do STF.

  • Essa decisão tem potencial para anular todo o processo?

O que vai acontecer - e aí estou trabalhando em hipótese, porque não tive acesso a todo o volume do processo e provavelmente ele está sob sigilo -, é que se o processo estiver fundamentado nessa quebra de sigilo, tudo que se sucede deve ser anulado. Agora, se além dessas provas de sigilo existir outras provas que apontam indícios de delitos, se exclui esse material dos autos e o restante é aproveitado. É lógico que isso enfraquece a acusação, mas é possível por outras vias se produzir provas. Nós temos, por exemplo, a prova testemunhal. Foram ouvidas testemunhas nesse caso. Essa prova, da testemunha que foi lá, da funcionária que admitiu que tinha rachadinha, isso não tem nada a ver com essa prova (quebra do sigilo) e segue valendo.

  • Mas se alguma prova se originou dessa quebra dos sigilos, ela é excluída?

Sim, atingida a prova fonte, a prova derivada também deve ser excluída.

  • Os eventuais crimes que foram imputados ao senador - peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa - têm chance maior de prescrever, a partir do momento da anulação da quebra dos sigilos?

Vai depender da extensão da anulação. Tem que ver se tirando essa prova dos autos, se resiste uma prova que dê sustentação ao processo. Se houver outras provas, o processo segue o percurso normal. Mas se for a prova central, se não existe outro material que possa dar sustentação, logicamente que esse processo é anulado. Pode-se recomeçar, mas o prazo de prescrição está correndo. Agora, no crime de peculato, a pena máxima prevista é de 12 anos (de prisão). E na pena de 12 anos, a prescrição é de 16 anos segundo o Código Penal. Quando o crime é grave, com penas altas, o prazo de prescrição também é alto.

Estadão
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