Quais são os impactos do Pix para o setor financeiro?
Para especialistas, o novo sistema de pagamentos trará maior concorrência ao mercado e fará o e-commerce crescer em receita e produtividade
Os brasileiros poderão, a partir do dia 16 de novembro deste ano, realizar transferências e pagamentos por meio do Pix, um novo sistema de movimentações financeiras desenvolvido pelo Banco Central do Brasil (BC). Aqueles que realizarem a inscrição na plataforma poderão enviar e receber dinheiro em qualquer dia e horário com um tempo de até 10 segundos, 24 horas por dia, sete dias por semana, incluindo feriados.
O ingresso é opcional e cabe a cada correntista decidir se vincular ou não ao Pix. O cadastro, que foi aberto ao público na última segunda-feira (05/10), ocorre por meio dos bancos e aplicativos de carteira digital. Instituições financeiras que possuem mais de 500 mil contas foram obrigadas a oferecer o Pix e tiveram de passar por um processo de homologação do novo sistema de pagamentos do BC desde junho deste ano.
Para especialistas ouvidos pelo Terra, os impactos do Pix se concentrarão em duas vertentes: a criação de um ambiente mais favorável para a concorrência dentro do mercado financeiro, possibilitando a criação de novas fintechs dispostas a inovar o setor; e um aumento de produtividade do comércio eletrônico . O novo sistema, que foi criado sob pretexto de tornar os meios de pagamentos e transferências mais acessíveis, no entanto, não atinge os desbancarizados e os que não possuem acesso à internet móvel ou de banda.
Maior concorrência
A possibilidade de poder enviar e receber dinheiro, de maneira quase que instantânea, é um grande atrativo para empreendedores que desejam se inserir no mercado e oferecer soluções inovadoras. Isso porque, ao utilizar o Pix em vez de cartões de crédito e boletos, o custo para desenvolver um serviço financeiro cai, possibilitando a entrada de novos atores no setor.
"Criar fintechs vai ser mais fácil", diz o líder da vertical de meios de pagamentos da Associação Brasileira de Fintechs (ABFintechs), Marcelo Martins. "Por exemplo: hoje, para oferecer um cartão, você precisa de uma bandeira e também de toda uma operação de emissão, e isso é bem caro." Com o Pix, os serviços financeiros poderão ser desenvolvidos e oferecidos apenas via aplicativo e, segundo Martins, isso diminuirá o custo para conquistar clientes e estimulará a concorrência dentro do setor.
O diretor-executivo da Associação Brasileira de Bancos (ABBC), Cláudio Guimarães Júnior, assim como Martins, também crê que o novo sistema do BC estimulará uma maior concorrência no setor financeiro. "Após a implementação do Pix, haverá um aumento na oferta de soluções de transferência bancária", diz. "Com isso, os preços da TED e do DOC ficarão mais baratos, darão poder de escolha ao cliente, o que estimula novos entrantes."
Com o Pix, a perspectiva é de o acesso à internet ser cada vez mais relevante para a utilização de serviços financeiros. A chegada do novo meio de pagamento, inclusive, ocorre em um momento de crescente adesão aos meios digitais por parte dos correntistas brasileiros. Conforme dados extraídos pelo Terra no banco de dados do BC, entre 2010 e 2018, o número de transações financeiras por canais remotos, como, por exemplo, o internet banking e aplicativos, saiu de 10,5 bilhões para 21,8 bilhões, um aumento de 107%.
E-commerce será o maior beneficiado
Enquanto as lojas físicas oferecerão o novo meio de pagamentos do BC por meio de suas máquinas de cartão de débito e crédito, o comércio eletrônico o incluirá como uma alternativa aos boletos no carrinho virtual dos consumidores. A perspectiva com essa mudança é de que o varejo digital ganhe em produtividade e receita. "O e-commerce vai entrar bem forte no Pix porque é o setor que mais tem problema com os boletos", afirma o CEO e cofundador da Matera, Carlos Netto. "O consumidor muitas vezes não finaliza a compra porque esquece de pagar após a emissão."
O Pix, por conta de sua praticidade e instantaneidade, deve ter uma grande adesão do público e ser uma via mais interessante do que meios de pagamentos mais complicadas, conforme avaliação do secretário-executivo da Câmara Brasileira de Comércio Eletrônico (camara-e.net), Felipe Brandão. "Isso deve estimular o desenvolvimento do e-commerce, facilitando a vida de pagadores e recebedores, além de viabilizar novos modelos de negócios e reduzir custos operacionais."
Democratização dos meios de pagamento?
Em seu site, o BC elenca uma série de objetivos da instituição com a inserção de seu novo meio de pagamento para o público. Um deles é "promover a inclusão financeira e preencher uma série de lacunas existentes na cesta de instrumentos de pagamentos disponíveis atualmente à população."
Embora apresente benefícios como a praticidade e rapidez para movimentações financeiras, o Pix não deve atingir 26% da população, já que, de acordo com a pesquisa TIC Domicílios 2019, realizada pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), 47 milhões de brasileiros não possuem acesso à internet, seja móvel via redes 3G e 4G, ou de banda, um requisito básico para a utilização do novo sistema.
A coordenadora do Centro de Estudos em Finanças da Faculdade Getúlio Vargas (FGVcef), Claudia Yoshinaga, ressalta o ganho de agilidade que o Pix oferecerá para os usuários em novembro deste ano. "O Brasil tem um histórico muito positivo de tecnologia bancária", diz. "O Pix vem nessa linha de ser algo rápido e, em um mundo com pressa, ele será um ponto muito positivo."
No entanto, a professora de economia chama a atenção para uma possível baixa adoção do novo sistema do BC, principalmente em classes com menor poder aquisitivo. "As pessoas vão precisar de um smartphone para usar o Pix", afirma. "Embora em uma cidade grande ter um celular possa ser normal, isso não é a realidade de muitos brasileiros." Como exemplo dessa realidade e barreira de equipamento, Claudia cita as longas filas para o saque do auxílio emergencial na Caixa Econômica Federal durante o período da pandemia.